ESA - 18/03/2009
A Agência Espacial Europeia (ESA) lançou ontem a sonda espacial GOCE (Gravity field and steady-state Ocean Circulation Explorer), que inaugura um novo capítulo na história da observação da Terra.
Além de ser uma das mais belas sondas espaciais já lançadas, a GOCE é o primeiro de uma nova família de satélites da ESA concebidos para estudar o nosso planeta e o seu ambiente, a fim de melhorar o conhecimento e a compreensão da formação e da evolução do nosso planeta.
Lançada por um foguete russo Rockot, depois de uma série de atrasos por motivos técnicos, a sonda foi colocada numa órbita baixa da Terra, quase heliossíncrona. Pesando 1052 kg, ela foi colocada com sucesso numa órbita polar circular, a 280 km de altitude com uma inclinação de 96,7º para o Equador.
Gravidade e geóide
Durante 24 meses, a sonda irá recolher dados tridimensionais da gravidade terrestre ao longo da superfície de todo o planeta. Os dados serão processados para produzir o mapa mais preciso já feito do campo gravitacional da Terra, permitindo aperfeiçoar o formato do geóide: a verdadeira forma de referência do nosso planeta.
O conhecimento preciso do geóide, que pode ser considerado como a superfície de um oceano global ideal em repouso, terá um papel muito importante em estudos futuros do nosso planeta, dos oceanos e da atmosfera. Ele servirá ainda de modelo de referência para medir e modelar as alterações do nível do mar, a circulação dos oceanos e a dinâmica das calotas de gelo polares.
Equipamentos únicos em uma espaçonave única
O principal instrumento científico da sonda GOCE é um Gradiômetro de Gravidade Eletrostática de última geração que incorpora seis acelerômetros altamente sensíveis, montados aos pares ao longo de três eixos perpendiculares numa estrutura carbono-carbono ultra-estável. A missão irá medir não a gravidade propriamente dita mas as pequenas diferenças de gravidade entre os pares de acelerômetros que estão a 50 cm de distância uns dos outros.
Os dados recolhidos pela GOCE irão fornecer uma precisão de 1 a 2 cm na altitude do geóide e 1 mGal para a detecção de anomalias do campo de gravidade (as montanhas, por exemplo, costumam provocar variações gravitacionais locais que vão desde dezenas de miligal a aproximadamente uma centena). A resolução espacial será melhorada de várias centenas ou milhares de quilômetros em missões anteriores para 100 km com a GOCE.
Sonda em formato de flecha
Para obter o máximo desempenho do Gradiômetro, a GOCE foi concebida para proporcionar um ambiente altamente estável e sem distúrbios, apesar da sua órbita de baixa altitude que força a nave espacial a suportar um atrito suave mas significativo das camadas superiores da atmosfera. Esta é a principal razão para o seu design aerodinâmico e esguio em forma de flecha com 5 metros de comprimento.
A nave espacial incorpora igualmente dois motores de iões de xénon de baixa potência, um principal e um de reserva, cada um capaz de debitar 1 a 20 mili-Newtons de impulso (a força equivalente à nossa exalação). Estes propulsores serão usados para compensar em tempo real o arrastamento atmosférico, com base na aceleração média detectada pelos dois acelerómetros montados ao longo do eixo de velocidade.
O design e a estrutura da nave espacial foram também otimizados para filtrar todo o tipo de distúrbios, utilizando materiais ultraestáveis para limitar os efeitos térmicos cíclicos, sem quaisquer peças desdobráveis ou móveis.
Comissionamento
Durante as próximas seis semanas, a sonda GOCE passará por um período chamado "comissionamento", quando os engenheiros verificarão o funcionamento de todos os seus circuitos.
Se tudo der certo nessa etapa, a nave espacial será transferida para a sua órbita operacional a 263 km de altitude e a sua carga útil passará por mais seis semanas de comissionamento e calibragem.
O início das operações da missão científica propriamente ditaestá previsto para o final de Junho deste ano.
Cartografia do campo gravitacional da Terra
A cartografia do campo de gravidade da Terra com esta precisão será útil para todas as áreas das ciências da Terra.
Para a geodesia, irá proporcionar um modelo de referência unificado para medições de altura em todo o mundo, eliminando as descontinuidades entre os sistemas de altura para as diversas massas terrestres, países e continentes. Isto irá permitir um melhor levantamento das alterações do nível do mar, dando margem a uma revisão dos dados históricos de mais de 200 anos de medição dos níveis do mar registrados em todo o mundo.
Para a oceanografia, um melhor conhecimento do campo de gravidade irá reduzir significativamente as incertezas atuais no que dizrespeito à transferência de massa e calor dos oceanos, o que se traduzirá em enormes melhorias nos modelos globais de circulação dos oceanos e de previsão climática.
A sonda GOCE irá ainda melhorar o nosso conhecimento acerca do substrato rochoso das calotas polares na Groenlândia e na Antártida. O mapa geóide preciso permitirá uma melhor determinação orbital para satélites que monitoram o manto de gelo e, assim, uma maior precisão das medições.
Para a geofísica, combinando os resultados da GOCE com os dados do magnetismo, da topografia e da sismologia, a missão irá ajudar a produzir mapas detalhados em 3D das variações de densidade na crosta terrestre e no manto superior. Esta será uma importante contribuição para a melhoria de toda a modelagem de bacias sedimentares, fendas, movimentos tectônicos e alterações verticais do mar/terra, melhorando a nossa compreensão dos processos responsáveis pelas catástrofes naturais.
Portas abertas para novas missões
"O sucesso deste lançamento marca o despontar de uma nova geração de satélites de ciências da Terra," afirmou Volker Liebig, Diretor dos Programas de Observação da Terra da ESA. "Trata-se do primeiro de uma nova geração de pequenos satélites científicos específicos e abre caminho para mais missões do programa Earth Explorer. Os cientistas aguardam impacientemente os conjuntos de dados obtidos nestas missões. Temos mais quatro lançamentos previstos para os próximos dois anos; isto significa que estamos numa fase muito ativa."
A GOCE é a primeira missão do projeto Earth Explorer, por sua vez parte do programa Living Planet da ESA, que teve início em 1999 para promover a investigação sobre a atmosfera, biosfera, hidrosfera, criosfera interior da Terra, a sua interacção e o impacto das atividades humanas nestes processos naturais.
Mais duas missões, selecionadas para focarem temas específicos de grande interesse público, estão já em desenvolvimento: A ADM-Aeolus para a dinâmica atmosférica (2011) e a EarthCARE para investigar o equilíbrio radioativo da Terra (2013).
Estão já em preparação três pequenas Missões de Oportunidade Earth Explorer: o Cryosat 2 para medir a espessura do manto de gelo (2009), o SMOS para estudar a umidade do solo e a salinidade dos oceanos (2009) e o Swarm para analisar a evolução do campo magnético (2011).