Redação do Site Inovação Tecnológica - 19/03/2025
Tensão do bóson W
Talvez você nunca tenha ouvido falar do bóson W, mas esta é uma das partículas fundamentais mais importantes do Universo: Como partícula portadora da força que viabiliza a fusão nuclear das estrelas, sem o bóson W o Universo inteiro estaria no escuro, além do que não teria sido formada a maioria dos elementos químicos.
Mas há um problema sério envolvendo nossa compreensão do bóson W: As duas medições mais precisas feitas até hoje de sua massa - essencialmente quanta matéria a partícula contém - não se alinham.
Assim como nas grandes escalas da cosmologia há uma discrepância significativa entre diferentes medições da taxa de expansão do Universo, conhecida como tensão de Hubble, há também uma "tensão do bóson W" no mundo subatômico.
Em 2022, o experimento CDF mediu cerca de 4 milhões de bósons W produzidos por um dos maiores aceleradores de partículas do mundo, o Fermilab, e concluiu que as partículas eram significativamente mais pesadas do que o previsto pela teoria mais importante da física de partículas. Em outras palavras, a medição da massa do bóson W feita pelo CDF contestou as previsões da física.
Em 2024, a calma pareceu retornar ao mundo da física, conforme o maior acelerador de partículas do mundo, o LHC, mediu a massa do bóson W e encontrou exatamente o valor esperado.
Mas agora tudo voltou à estaca zero: Uma auditoria de todos os possíveis erros existentes nas medições acaba de dar razão às medições do CDF, cujos valores da massa do bóson W contestam os valores previstos pela teoria.
Medição da massa do bóson W
A incompatibilidade entre os dois experimentos sugere que uma - ou ambas - as equipes deixaram passar alguma coisa. É possível que haja uma falha potencial escondida em uma das técnicas, ou que uma das equipes tenha ignorado alguma fonte de erro.
O professor Ashutosh Kotwal, da Universidade de Duke, nos EUA, decidiu então procurar pelos eventuais erros, analisando cada aspecto da medição anômala do CDF em busca de uma explicação para o porquê de os dois grupos terem chegado a respostas tão diferentes.
Parte do problema é que pesar o bóson W é uma medição terrivelmente complicada de fazer. A partícula é produzida por colisões que ocorrem quase à velocidade da luz, e tem vida curta, desintegrando-se quase imediatamente após ser formada, aparecendo nos aceleradores de partículas por menos de um trilionésimo de trilionésimo de segundo antes de decair.
Então, os cientistas precisam pesar o bóson W indiretamente, inferindo sua massa estudando as chuvas de partículas produzidas pelos bósons em decomposição. Primeiro é preciso medir cuidadosamente as energias e os momentos desses detritos voadores conforme eles surgem no detector, e então trabalhar de trás para frente, usando as leis de conservação de energia e momento para determinar a massa do bóson W.
Mas é mais difícil do que parece, porque as partículas não se movem em linhas retas: Elas traçam um arco enquanto se curvam em torno do campo magnético do detector. A parte fundamental do detector CDF era uma câmara em forma de lata, com 30.240 fios de alta voltagem que registravam e determinavam a posição 3D de cada partícula de decaimento em 96 pontos diferentes, à medida que a partícula se afastava do ponto de colisão - o acelerador não está mais em funcionamento, mas as equipes continuam trabalhando nos dados que ele coletou ao longo dos anos.
Há muito espaço para erros. "E se os fios não estivessem exatamente onde pensávamos que estavam, e não percebêssemos?" ilustra Kotwal. "Suponha que a câmara de fios fosse comprimida ou dobrada de uma maneira específica, então todas as posições dos fios estariam ligeiramente erradas."
Agir como cientistas
Kotwal se concentrou em encontrar erros no experimento CDF, já que ele é que apontou uma incoerência na teoria, que não apareceu nas medições do LHC. Para isso, ele examinou todos os mais sutis possíveis desalinhamentos dos fios que poderiam colocar o resultado em dúvida.
Mesmo levando em conta mudanças minúsculas possíveis nos fios dentro da câmara, a energia cinética de uma partícula ainda pode ser medida com a precisão citada pelos responsáveis pela medição, de 25 partes por milhão. "Todas as mudanças possíveis foram verificadas e consideradas muito pequenas para fazer diferença," disse Kotwal.
"Dessa perspectiva, a medição do CDF está correta," concluiu Kotwal.
A expectativa agora é que a equipe do LHC faça o mesmo com suas medições, já que construir um novo acelerador de partículas, maior, mais poderoso e com instrumentos mais precisos é um empreendimento de décadas e bilhões de dólares.
"O que todos nós deveríamos fazer não é tirar conclusões precipitadas, mas sim investigar e descobrir quais métodos são certos e quais são errados," disse Kotwal. "É assim que os cientistas devem fazer, certo?"
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