Redação do Site Inovação Tecnológica - 14/03/2025
Sincronicidade
A fabricante de computadores quânticos D-Wave publicou um artigo na revista Science detalhando uma simulação de um problema do mundo real que finalmente comprovaria a tão procurada supremacia quântica, ou vantagem quântica, quando a computação quântica atinge uma capacidade que não poderia ser igualada pelos computadores clássicos.
Tudo parecia ser motivo para festas, com inúmeras declarações de especialistas da área confirmando tratar-se de um feito histórico e, portanto, a ser comemorado.
Mas rapidamente a história está tomando outros contornos.
Acontece que outra equipe, dos EUA e da Itália, divulgou na segunda-feira (10) um trabalho mostrando que o único problema é que os computadores clássicos não estavam rodando o melhor algoritmo. Embora ainda não tenham submetido seu trabalho à revisão dos pares, eles desenvolveram um modo de um supercomputador clássico resolver um subconjunto do mesmo problema em pouco mais de duas horas, o que desqualificaria a reinvindicação de supremacia quântica.
Então, vamos aos fatos.
D-Wave alega supremacia quântica
A D-Wave foi a primeira empresa a lançar um computador realmente quântico no mercado, há mais de uma década.
Em 2023, a D-Wave reivindicou a supremacia quântica em problemas práticos, ao resolver problemas de otimização combinatória, que são comuns no mundo real e usados em vários campos, incluindo logística, roteamento de redes de computadores, aprendizado de máquina e ciência dos materiais.
Agora, a equipe da empresa trabalhou em um problema diferente, simulando a dinâmica quântica em materiais magnéticos de grande interesse científico e tecnológico, conhecidos como vidros de spin, um tipo de sistema desordenado de nanoímãs que interagem aleatoriamente entre si, gerando dois tipos de ordem magnética no material. Esses ímãs apresentam o fenômeno da "frustração", o que significa que não se estabelecem em uma configuração uniformemente ordenada quando a temperatura cai, e possuem características termodinâmicas e dinâmicas distintas, que podem ser aproveitadas para inúmeras aplicações, de exames médicos à computação.
O computador D-Wave dotado do processador quântico Advantage2, o mais avançado da empresa, realizou a simulação mais complexa do vidro de spin em questão de minutos e com um nível de precisão que levaria quase 1.000.000 de anos usando um supercomputador clássico. Além disso, seria necessário mais do que o consumo anual de eletricidade do mundo para resolver esse problema usando o supercomputador, que é construído com unidades de processamento gráfico (GPU).
"Este é um dia extraordinário para a computação quântica. Nossa demonstração da supremacia computacional quântica em um problema útil é uma novidade na indústria. Todas as outras alegações de sistemas quânticos superando computadores clássicos foram contestadas ou envolveram geração aleatória de números sem valor prático," disse Alan Baratz, presidente da D-Wave. "Nossa conquista mostra, sem dúvida, que os computadores quânticos de recozimento da D-Wave agora são capazes de resolver problemas úteis além do alcance dos supercomputadores mais poderosos do mundo. Estamos entusiasmados que os clientes da D-Wave possam usar essa tecnologia hoje para perceber valor tangível dos computadores quânticos de recozimento."
Algoritmo clássico melhor
Porém, antes que as rolhas de champanhe parassem de voar pelos escritórios da D-Wave, Joseph Tindall e colegas do Instituto Flatiron (EUA) e da Escola Internacional de Estudos Avançados (Itália) divulgaram no repositório arXiv um novo algoritmo para resolver a dinâmica dos vidros de spin que permite resolver o mesmo problema em apenas 2 horas em um supercomputador clássico - e não mais em 1.000.000 de anos.
"Tais dinâmicas foram simuladas recentemente usando o sistema Advantage2 da D-Wave e, após extensa comparação com métodos numéricos existentes, alegaram estar além do alcance da computação clássica. Aqui, mostramos que, ao evoluir redes tensoras específicas de grade com propagação de crença simples para acompanhar o entrelaçamento gerado durante a evolução temporal e, em seguida, extrair valores de expectativa com variantes mais sofisticadas de propagação de crença, precisões de última geração podem ser alcançadas com recursos computacionais modestos," escreveram Tindall e seus colegas.
A equipe simulou os mesmos vidros de spin bidimensionais e tridimensionais, mostrando ser possível alcançar o mesmo nível de precisão usando recursos computacionais que escalam apenas linearmente com o tamanho do sistema, de modo que tais simulações estão prontamente disponíveis usando o hardware da computação clássica atual.
"No caso de redes cilíndricas e de diamante, nossas simulações alcançam precisões bem além daquelas do recozimento quântico para tamanhos de sistemas grandes, enquanto no caso da rede cúbica dimerizada as precisões são comparáveis," garante a equipe.
Assim, mesmo mantido e reconhecido todo o mérito do processador quântico da D-Wave, a alegação de supremacia quântica cai por terra.
Recozimento quântico
Computadores quânticos, como os da IBM ou do Google, por exemplo, são máquinas de uso geral, capazes de executar uma ampla variedade de algoritmos quânticos.
Para isso, os qubits são controlados por portas lógicas, de modo semelhante aos computadores eletrônicos, o que permite que eles sejam programados para rodar virtualmente qualquer tipo de algoritmo.
Já a máquina da D-Wave usa um processo muito especial, conhecido como recozimento quântico, no qual o processador realiza uma busca pela melhor solução possível para um problema, representada pelo estado de menor energia de seus qubits - também é possível construir computadores de recozimento usando hardware clássico.
No caso da simulação dos vidros de spin, o processador começa usando todos os seus qubits (cerca de 1.200 no Advantage2) para imitarem as partículas que formam a rede atômica do vidro de spin. Tudo começa quando os qubits são postos em uma superposição de todas as soluções possíveis, o que corresponde a um estado de alta energia. O processo de recozimento consiste em ir ajustando precisamente os parâmetros de cada qubit para que todos atinjam seu estado mínimo, ou de baixa energia. O estado final conjunto corresponde à solução do problema.
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