Redação do Site Inovação Tecnológica - 07/03/2005
Radiologistas e biólogos têm um sonho - cultivado desde a descoberta dos raios laser: construir uma fonte compacta de raios-X capaz de emitir sua radiação de forma totalmente direcional e concentrada, como se fosse um feixe de raios laser.
Um gerador de raios-X assim poderia permitir que as imagens de radiografias fossem gravadas com uma resolução imensamente superior às atuais, e utilizando apenas uma fração da dose de radiação hoje utilizada. O resultado seria, além da diminuição do risco para os pacientes, o dignóstico de doenças como o câncer em estágios muito preliminares da doença.
Microscópios equipados com essa fonte de raios-X concentrada seriam capazes de acompanhar biomoléculas nanométricas em seu ambiente natural, ao vivo e em tempo real, à medida em que reagem ou atuam sobre as células.
Serão necessários ainda vários anos para que esse sonho se torne realidade. Mas o trabalho do Dr. Ferenc Krausz, que liderou uma equipe de pesquisadores austríacos e alemães, mostrou que será possível realizá-lo.
Os cientistas da Universidade de Tecnologia de Viena, Áustria, e das universidades de Würzburg e Munique, e do Instituto Max Planck, todos na Alemanha, apresentaram a primeira fonte de raios-x do tipo laser, operando a um comprimento de onda de um nanômetro. Tudo embutido em um equipamento compacto, que poderia ser colocado em qualquer laboratório.
A cor da luz é determinada pelo comprimento de onda - o tamanho de um ciclo da onda eletromagnética que forma a luz. A luz vermelha tem um comprimento de onda de cerca de 700 nanômetros; o olho humano é capaz de enxergar até a luz violeta, com um comprimento de onda de 400 nanômetros. A luz feita por ondas com comprimentos menores são invisíveis aos nossos olhos - é o que acontece, por exemplo, com a luz ultravioleta. Quando a onda se torna ainda menor, atingindo apenas um nanômetro de comprimento, entra-se então no campo dos conhecidos raios-X.
Em seu novo equipamento, os cientistas focaram uma seqüência de pulsos rápidos e intensos de luz vemelha em átomos de hélio, o que converteu a luz do laser (com comprimento de onda de 700 nanômetros) em raios-X (com comprimento de onda de 1 nanômetro). Os raios-X foram emitidos pelos átomos de hélio excitados pelo laser.
O intenso campo do laser faz com que a nuvem de elétrons negativamente carregada sofra gigantescas oscilações ao redor do núcleo atômico positivamente carregado. É como se os átomos se transformassem em antenas: devido à larga amplitude de suas oscilações, eles irradiam ondas não apenas no comprimento da onda do laser que os excita, mas também em comprimentos de onda muito menores. Embora essas minúsculas ondas atômicas sejam extraordinariamente fracas, como elas oscilam no tempo (estão em fase no tempo), elas geram uma onda de raios-X de intensidade significativa, que sai como um feixe altamente direcional, paralelo ao raio laser incidente.
Na figura, o feixe de raios-X (que não é visível), com um diâmetro de vários micra, sai na mesma direção que o feixe de luz púrpura, que é gerado também pela excitação dos átomos de hélio.
Esse fenômeno em si não é nenhuma novidade. Ele consiste em uma técnica padrão para a produção de radiação EUV ("Extreme UltraViolet") em comprimentos de onda abaixo dos 10 nanômetros. Mas levar adiante a fronteira dessa tecnologia, alcançando comprimentos de onda ainda menores, tem sido um desafio, já que isso exige a exposição dos átomos a feixes de laser de intensidade cada vez mais alta, o que acaba por destruir os átomos. Além disso, os elétrons liberados pela ação do laser impedem a formação de uma onda intensa a partir das diminutas ondas atômicas.
Os cientistas resolveram esse problema irradiando os átomos com pulsos de laser de curtíssima duração, na verdade os menores já conseguidos, durando apenas 5 milionésimos de bilionésimo de segundo, ou 5 femtossegundos.
Esses pulsos atingem os átomos de forma tão abrupta que eles não têm tempo para se desintegrar antes de emitir o raio-X. Graças a esse diminuto tempo de interação, os pesquisadores não apenas conseguiram quebrar a barreira do nanômetro, mas também criaram uma fonte de pulsos de raios-X que, pela primeira vez, são mais breves do que 0,1 femtossegundo (ou 100 attossegundos).
No momento, o feixe de raios-X liberado pelo equipamento é muito fraco para qualquer aplicação prática, mas os cientistas estão confiantes que poderão aperfeiçoar a técnica, ampliando a potência do feixe em várias ordens de grandeza. Quando eles conseguirem, terão criado uma ferramenta que abrirá possibilidades de pesquisas inteiramente novas em áreas como Física, Biologia e Ciência dos Materiais.
O trabalho, intitulado "Source of coherent kiloelectronvolt X-rays", foi publicado na revista Nature (433, 596).