Sandra O. Monteiro - Agência USP - 09/06/2011
Fixação de carbono na terra
Estudo desenvolvido no Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA), da USP, comprova por meio de um modelo matemático denominado Century, que manter a palhada - restos da cana que ficam no solo após a colheita - aumenta significativamente a fixação de carbono na terra.
O trabalho também confirma que a colheita mecanizada da cana-de-açúcar diminui a emissão de gás carbônico para a atmosfera, atenuando o efeito estufa.
Os dados para o estudo foram obtidos pelo pesquisador Marcelo Valadares Galdos, atualmente no Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE), de duas formas distintas.
A primeira, por meio da coleta de amostras de solo em locais de colheita com queimada e de colheita mecanizada a partir da cronossequência, que consiste na retirada de amostras distintas do solo que possam demonstrar as diferenças ocasionadas pelo tempo.
E, a outra, por informações do Instituto de Pesquisa da Cana-de-açúcar da África do Sul sobre solos com até 60 anos consecutivos de colheita sem queima.
A partir disto, utilizando-se o modelo matemático Century, desenvolvido pela Universidade do Estado do Colorado (EUA), adaptado para a análise de dados de solos de plantações de cana-de-açúcar, foi possível prever cenários futuros para estas regiões.
Modelo computacional
Galdos explica que o procedimento dele e de outros pesquisadores foi "calibrar e validar um modelo computacional com dados de plantações da África do Sul e das cidades de Goiana (Pernambuco), Timbaúba (Pernambuco) e Pradópolis (São Paulo), para simular fluxos de carbono e nutrientes entre o solo, a planta e a atmosfera."
Em Pradópolis, por exemplo, a manutenção da palhada no solo aumentou a fixação de carbono em 1.200 quilogramas por hectare por ano.
O professor Carlos Cerri, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (CENA) da USP, em Piracicaba, que também participou da pesquisa, diz que "a quantidade de carbono que será fixada no solo depende do tipo de solo, do clima, do manejo da cultura, da forma da colheita, entre outros fatores. O solo argiloso, por exemplo, consegue fixar muito mais carbono do que o solo arenoso. Assim, como a fixação do carbono em lugares de climas frios é bem melhor do que em locais de climas quentes, onde a decomposição ocorre mais rapidamente."
A colheita mecanizada propicia a manutenção da palhada sobre o solo. Galdos complementa que "durante o processo de decomposição desse material, parte do carbono fica incorporada ao solo. Esse processo é conhecido como 'sequestro de carbono'. Sua importância reside no fato de representar uma diminuição significativa no resultado do cálculo do 'rastro de carbono' do etanol".
Queimadas versus mecanização
A cana-de-açúcar, durante a fotossíntese, processo de obtenção de energia da planta, retira gás carbônico do ar.
O gás carbônico é transformado pela planta em compostos orgânicos que são incorporados pelas raízes, colmo (caule da cana) e folhas.
Quando a colheita é feita por meio da queimada das folhas, o carbono presente nos compostos orgânicos vai direto para a atmosfera em forma de gás carbônico, como produto da combustão.
Em contrapartida, quando a cana é colhida mecanicamente sem queima, parte do carbono não volta para a atmosfera e é fixado no solo.
Etanol ou gasolina
Segundo o pesquisador, a vantagem de colheitas mecanizadas faz com que "plantações de cana-de-açúcar destinadas à produção de etanol tornem este biocombustível duplamente mais benéfico do que a gasolina porque o gás carbônico liberado na combustão do etanol é o mesmo consumido durante a fotossíntese da cana. Na combustão da gasolina esta reciclagem não ocorre."
O estudo foi contemplado com o 2º Prêmio Top Etanol, na categoria Trabalho Acadêmico. O artigo resultante do estudo, publicado na Soil Science Society of America Journal, é parte da tese de doutorado do agrônomo Marcelo Valadares Galdos que foi defendida na Esalq e orientada pelo professor Carlos Cerri do CENA.
Também participaram do estudo, Keith Paustian, da Universidade do Estado do Colorado, Rianto Van Antwerpen, do Instituto de Pesquisa da Cana-de-açúcar da África do Sul, e Carlos Eduardo Cerri, da Esalq.