Agostinho Rosa - 12/01/2005
Como nos antigos laboratórios dos alquimistas, a produção de novos materiais sempre exige a mistura de elementos já conhecidos. Mas, ao contrário dos místicos do passado, os cientistas algumas vezes têm que lidar com quantidades tão pequenas de cada material que a forma de misturá-los transforma-se, por si só, num desafio tão grande quanto a própria descoberta de um material com propriedades novas.
A reação química entre dois materiais depende de vários fatores, um dos principais sendo a área de contato entre esses reagentes. A nanotecnologia tem auxiliado muito os químicos, ao produzir nanopartículas tão diminutas, que a área de contato entre os materiais aumenta de forma quase inimaginável.
Mas misturá-los continua sendo um problema. E, nessa escala, não se pode simplesmente mexer tudo com uma colher.
As minúsculas quantidades de material utilizadas, por exemplo, na fabricação de novas drogas e medicamentos, são manipuladas no interior de microlaboratórios, também conhecidos pela sigla em inglês "lab-on-a-chip". São dispositivos construídos com as mesmas técnicas utilizadas para se fabricar chips de computadores; só que, ao invés de transistores, esses microlaboratórios contêm microcanais, por meio dos quais são bombeados e direcionados os reagentes.
Agora, num artigo publicado na revista Lab on a Chip, a engenheira mecânica Nadine Aubry, do Instituto de Tecnologia de Nova Jersey, Estados Unidos, apresentou um método inovador que aumenta a eficiência da mistura entre os elementos da reação no interior desses microcanais.
"Todo mundo pensa em criar turbulência em três dimensões para misturar líquidos," afirma ela. "Nós substituímos o espaço pelo tempo, o que é uma forma muito mais simples de lidar com esse problema quando o espaço é muito exíguo."
Embora seja possível, a construção de micromisturadores mecânicos no interior dos microlaboratórios é uma tarefa demorada e que elevaria o custo desses dispositivos a níveis que impediriam seu uso corrente. A Dra. Aubry resolveu então colocar os reagentes em contato várias vezes; na verdade, milhares de vezes num segundo.
Ela descobriu que o fluxo de escoamento de cada um dos reagentes no interior dos microcanais pode ser alterado simplesmente variando-se a voltagem aplicada ao eletrodos do chip, que são utilizados para bombear os fluidos.
Variando-se essa voltagem rapidamente, os líquidos têm suas quantidades alteradas constantemente, alterando suas superfícies de contato, o que cria uma pseudo-turbulência. O método é tão eficiente que a Dra. Aubry conseguir misturar completamente dois líquidos num período de um segundo, quando os dois haviam percorrido apenas dois milímetros no interior do microlaboratório.
Em sua experiência, a cientista utilizou uma interseção de microcanais em T, cujos segmentos medem 200 micra de largura por 120 micra de profundidade.
"O processo será útil nas fases preliminares da descoberta de drogas," explica a Dra. Aubry. "onde os reagentes precisam ser bem misturados para produzir amostras puras com poucos sub-produtos indesejáveis."
Mas as possibilidades são bem maiores. Os microlaboratórios são uma das ferramentas mais promissoras para a construção de sensores menores, mais eficientes e mais baratos.
E não são apenas aplicações de ponta em laboratórios de primeiro mundo. Eles poderão permitir, por exemplo, e num futuro próximo, que você tenha em sua geladeira um sensor capaz de avisar quando um alimento está começando a se deteriorar, muito antes que os gases produzidos possam ativar as células olfativas do seu nariz.
A pesquisa da Dra. Aubry com certeza ajudará os engenheiros a tornar essa promessa uma realidade num tempo mais curto do que se esperava.