Agenusp - 07/04/2004
Não estivesse a Natureza na condição de ré, este poderia ser um complicado caso de plágio. A questão é que pesquisadores do Instituto de Geociências (IGc) da USP descobriram a lindbergita, um novo mineral cuja fórmula química e estrutura cristalina são as mesmas de um composto sintético largamente utilizado na indústria fotográfica, o oxalato de manganês diidratado.
O novo mineral foi reconhecido em agosto de 2003 pela International Mineralogical Association (IMA), órgão regulador da mineralogia mundial, e o trabalho de apresentação, conduzido pelo geólogo Daniel Atencio, deve ser publicado numa das próximas edições da revista American Mineralogist.
Ele afirma que não se sabia que a substância podia ser formada na natureza. A diferença entre a natural e a artificial é que o composto sintético não pode ser considerado um mineral: "Você só pode chamar de mineral a substância que foi formada naturalmente. Mesmo que você crie um composto idêntico no laboratório não se pode chamá-lo de mineral", explica.
O oxalato de manganês diidratado já era conhecido e produzido artificialmente. Por ser uma substância com propriedades sensitivas à luz, é utilizado pela indústria de revelação de filmes fotográficos.
Mas a descoberta não significa muito em termos econômicos, uma vez que este tipo de mineral não é muito comum e sua produção em laboratório é mais acessível que a extração e o processamento. "Os minerais com oxalato em sua composição são raros, porque eles só se formam na superfície", explica Atencio. "Para isso é preciso que haja soluções com matéria orgânica correndo pela rocha", complementa.
Acidente Segundo ele, já existiam registros a respeito da lindbergita, mas o mineral nunca havia sido estudado em detalhes, ao ponto de ser catalogado. "Há ocorrências da lindbergita em minas de manganês na Suíça, três na Floresta Negra, na Alemanha, e uma no pegmatito (um tipo de rocha) de Morefield, nos EUA", afirma. Uma destas ocorrências foi constatada pelo suíço Stefan Graeser, que assina o trabalho como co-autor.
No Brasil, a descoberta aconteceu quase que por acidente. Luiz Menezes, um grande comerciante de minerais para colecionadores, encontrou na mina de Boca Rica (na região da Galiléia, MG) uma rocha que continha um mineral que ele não sabia o que era. Como fez tantas vezes, levou a rocha para que Atencio a examinasse. E para surpresa de ambos, descobriu-se que o mineral não constava em nenhum catálogo, carecendo portanto de estudos aprofundados e de um nome adequado.
A lindbergita foi batizada em homenagem à mineralogista Marie Louise Lindberg, que nos anos 40 e 50 descreveu vários minerais novos (cinco, no total) da mesma região em que Atencio trabalhou. Ele conta que a escolha do nome deveu-se justamente à falta de informações disponíveis a respeito da pesquisadora. "Imagine, ela foi uma cientista importante que foi totalmente esquecida. Ninguém sabe se ela está viva. Com muito custo consegui descobrir que ela nasceu em 1918".
Mas esta não é a primeira e, provavelmente, nem a última descoberta mineralógica de Atencio. No ano passado, um grupo liderado por ele descobriu, na mesma região, outro mineral, a coutinhoíta, que está prestes a ser adicionada ao catálogo da IMA.