Com informações da BBC - 17/04/2013
Marte sem volta
Uma organização holandesa, a Mars One, informou que, em breve, abrirá inscrições para voluntários que quiserem colonizar o planeta Marte.
Mas há uma particularidade: a passagem será apenas de ida. Mesmo assim, a empresa já recebeu dados de milhares de possíveis candidatos a colonos.
A ideia de uma viagem só de ida para Marte tem sido sugerida por vários pesquisadores nos últimos anos, com o argumento de que isso reduziria os custos a uma fração do projeto inicial e marcaria o início da colonização humana permanente de Marte.
Bas Lansdorp, fundador da Mars One, quer que a coisa toda fique rendendo frutos aqui na Terra também. Para isso, ele idealizou um reality show, como o Big Brother.
Ou seja, embora nunca mais vejam a Terra, os pioneiros de Marte terão cada segundo seu transmitido ao vivo para quem pagar para ver. Na verdade, o show deve começar já na seleção dos candidatos que, segundo o executivo, devem ser resistentes, flexíveis e engenhosos.
Os astronautas terão de enfrentar uma viagem que deve durar entre sete a oito meses e deverão perder massa óssea e muscular.
Segundo Lansdorp, depois de passar um tempo vivendo no campo gravitacional bem mais fraco de Marte, será quase impossível se reajustar de volta à gravidade mais forte da Terra.
Sinais vermelhos
O projeto envolve apenas tecnologias já existentes.
A energia será gerada por painéis solares e a água será reciclada e extraída do solo - se for encontrada.
Os astronautas vão cultivar os alimentos que vão consumir e também contarão com suprimentos de emergência. A cada dois anos, novos exploradores vão se juntar ao grupo de colonos.
Marte é um planeta varrido pelo vento solar. Na Terra, por outro lado, estamos protegidos do vento solar graças a um forte campo magnético. Sem esse escudo protetor, seria muito mais difícil sobreviver.
Essa será a realidade que os primeiros marcianos vão encontrar.
A superfície do planeta é extremamente hostil para a vida, segundo Veronica Bray, do Laboratório Planetário e Lunar da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos.
Ela encara o projeto holandês com ceticismo.
De acordo com a cientista, não há água líquida, a pressão atmosférica é "praticamente um vácuo", os níveis de radiação são mais altos e as temperaturas variam muito.
"A exposição à radiação é uma preocupação, especialmente durante a viagem. Isto pode levar ao aumento do risco de câncer, um sistema imunológico mais frágil e, possivelmente, infertilidade", afirmou.
"Não tenho dúvidas de que podemos, fisicamente, colocar um humano em Marte. Se ele vai conseguir sobreviver durante um período maior de tempo, é muito mais duvidoso", acrescentou Bray.
Gerard't Hoof, embaixador do projeto e um dos ganhadores do prêmio Nobel em física teórica em 1999, admite que existem riscos para saúde ainda desconhecidos. Ele afirma que a radiação é "de uma natureza muito diferente" do que qualquer coisa que já tenha sido testada na Terra.
"Comunicaremos aos candidatos que há riscos, mas será nossa responsabilidade manter estes riscos em níveis aceitáveis", afirmou.
Café requentado
Stan Love, astronauta da Nasa, já enfrentou dificuldades tecnológicas na Estação Espacial Internacional.
Os aparelhos que reciclam o lixo humano e transformam "o café de ontem no café de amanhã precisam de manutenção constante e provavelmente não sobreviverão a anos de uso contínuo em Marte".
Love voltou recentemente da Antártida e comparou o ambiente gelado com Marte.
"É cheio de água, você pode sair e respirar ar. É um paraíso comparado a Marte e, mesmo assim, ninguém se mudou permanentemente para lá", afirmou.
No entanto, apesar de suas dúvidas em relação ao financiamento, riscos da radiação e tecnologia, Love aprova a iniciativa da Mars One.
Ele acredita que organizações particulares como esta podem ajudar na elaboração de novas tecnologias para ajudar em viagens futuras ao planeta vermelho.
"Sonhamos com isso há 50 anos. A Lua seria apenas um trampolim para Marte. Mas quando você estuda o problema, você percebe que é imensamente difícil", afirmou.
Evento de mídia
Outro problema em relação ao projeto é o dinheiro. O custo para o envio do primeiro grupo é estimado em US$ 6 bilhões.
Chris Lintott, da Universidade de Oxford, afirma que o projeto é tecnologicamente plausível, mas ele não acredita que vai conseguir a verba necessária.
"Está relacionado à vontade política e à solidez financeira para fazer isto acontecer. E (isto) ninguém conseguiu resolver até agora", afirmou.
Mas, o fundador da Mars One acredita que é possível levantar o dinheiro e cita os direitos de transmissão das Olimpíadas de Londres.
"Este será o maior evento da humanidade. Em 15 anos as pessoas ainda estarão assistindo. Explorar nosso mundo e, agora (ir) além, é o que os humanos fazem, está em nosso genoma. O sonho dos colonos de ir para Marte se tornará realidade," afirmou.
Ainda não se sabe se a missão vai alcançar o objetivo, mas a publicidade gerada pelo processo de seleção ao estilo do Big Brother provavelmente vai gerar a audiência esperada.