Com informações da New Scientist - 04/04/2011
Consciência robótica
Ela ainda não é um robô no sentido comum do termo, porque ainda não tem um corpo.
Mas é o que mais aproxima até hoje daquilo que se poderia chamar de uma "mente robótica".
O programa, projetado para ser usado para animar um robô, conseguiu pela primeira vez completar testes padronizados de avaliação do estado de alerta, ou estado de consciência, no mesmo tempo gasto por humanos.
O nome dessa "consciência robótica" é LIDA, uma sigla para Learning Intelligent Distribution Agent, agente de distribuição inteligente do aprendizado, em tradução livre.
LIDA é filha de Stan Franklin, da Universidade de Memphis, com uma "participação especial" de Bernard Baars, do Instituto de Neurociências de San Diego e Tamas Madl, filósofo da Universidade de Viena, na Áustria.
Funcionamento da mente
O programa foi inspirado por uma teoria bem estabelecida sobre a consciência humana, chamada "Teoria do Espaço de Trabalho Global" (TAG) - ou GWT, sigla do inglês Global Workspace Theory.
Segundo a TAG, o processamento inconsciente - a captura e processamento de imagens e sons, por exemplo - é feito por regiões diferentes e autônomas do cérebro, trabalhando paralelamente.
Nós apenas nos tornaríamos conscientes da informação quando ela é considerada importante o suficiente para ser "transmitida" para o ambiente de trabalho global, uma rede de neurônios interconectados que se espalha por todo o cérebro.
Quem decide o que é importante para ser transmitido a teoria não diz, mas ela afirma que aquilo que experimentamos como consciência é justamente essa "transmissão", que permite que as informações sejam compartilhadas por diferentes áreas do cérebro.
Vários experimentos, usando eletrodos para detectar a atividade cerebral, têm dado suporte a essa noção de difusão das informações pelo cérebro como base da consciência, embora como exatamente a teoria se traduziria em cognição e experiência consciente seja algo ainda longe de estar claro.
Mente robótica
O professor Stan Franklin e seus colegas implementaram a teoria em um programa voltado para o controle de um robô, "enriquecendo" as bases da TAG com hipóteses sobre como esses processos de difusão da informação no cérebro se coordenam.
O resultado foi a mente robótica LIDA, que Franklin acredita ser uma reconstrução do processo de cognição do cérebro humano.
LIDA é uma "mente artificial" inteiramente gerada por software, ao contrário de experimentos de inteligência artificial que procuram replicar os próprios neurônios ou até construir um cérebro em um chip.
O funcionamento de LIDA baseia-se na hipótese de que a consciência é composta de uma série de ciclos, com duração de poucos milissegundos, e cada um subdividido em estágios inconscientes e conscientes.
Entretanto, só porque esses ciclos cognitivos são consistentes com algumas características da consciência humana, como os experimentos demonstram, isso não significa que é assim que a mente humana trabalha.
Foi por isso que os cientistas resolveram colocar a mente robótica para competir com mentes humanas.
Robô versus humano
Para melhorar as bases da comparação, os pesquisadores determinaram que as temporizações usadas nos ciclos de LIDA seriam os mesmos observados em dados neurológicos de humanos.
Por exemplo, os detectores de dados sensoriais do programa checam as informações a cada 30 milissegundos, o tempo que o cérebro humano leva para fazer uma associação entre uma imagem e uma categoria textual.
A mente robótica foi submetida a dois "testes de consciência".
O primeiro consiste em uma versão do teste do tempo de reação, em que alguém deve apertar um botão sempre que uma luz verde à sua frente se acender. LIDA levou cerca de 280 milissegundos para apertar seu botão virtual depois que a luz se acendeu, enquanto um humano médio leva cerca de 200 milissegundos.
O segundo teste usa uma barra horizontal piscante que aparece na base de uma tela e então se move para cima ao longo de 12 posições. Quando a velocidade de subida da barra é lenta, as pessoas veem a linha em movimento. Quando a velocidade é alta, as pessoas enxergam 12 linhas piscantes.
Quando os pesquisadores criaram um teste semelhante para LIDA, eles descobriram que, em altas velocidades, ela também falha na percepção de que a linha está se movendo. A velocidade da ilusão de óptica robótica é comparável à dos humanos.
Robô consciente?
Mas isto significa que a mente robótica LIDA seja consciente?
"Eu digo que LIDA é funcionalmente consciente," diz Franklin, porque ela usa a difusão dos inputs para guiar suas ações e seu aprendizado.
O pesquisador estabelece uma demarcação clara entre essa consciência funcional e a chamada "consciência fenomênica", ou "consciência fenomenológica", não atribuindo à sua mente robótica uma capacidade de subjetividade.
Mas ele afirma que não há, em princípio, nenhuma razão que impeça que LIDA se torne totalmente consciente um dia: "A arquitetura poderá servir de base para a consciência fenomênica, apenas precisamos descobrir como trazê-la à tona."
Pode um computador se tornar consciente?
Se o pesquisador estiver correto, e se a teoria tiver um poder explicativo do funcionamento da mente humana suficiente para embasar a criação de uma mente artificial, resta uma questão de largo alcance:
Em que ponto um modelo de consciência pode ele próprio tornar-se consciente? - Se é que pode.
Antonio Chella, um roboticista da Universidade de Palermo, na Itália, afirma que, antes que se possa atribuir consciência a um agente de software como LIDA, ela vai precisar de um corpo.
"A consciência de nós mesmos, e do mundo, é baseada em uma contínua interação entre nosso cérebro, nosso corpo e o mundo," diz ele. "Estou curioso para ver um robô LIDA."
Já Murray Shanahan, também roboticista, da Imperial College London, discorda, e diz que um corpo robótico não é necessário. "Somente faz sentido começar a falar sobre consciência no contexto de algo que interage de forma intencional com um ambiente espaço-temporal," diz ele. "Mas eu fico totalmente satisfeito com uma interação com um ambiente virtual."
Franklin, criador de LIDA, afirma estar planejando construir uma versão da consciência robótica capaz de interagir com humanos, provavelmente de forma virtual - sem um corpo robótico.
"Quando isto acontecer, eu ficarei tentado a atribuir consciência fenomênica ao agente," afirma ele.
Objetividade e subjetividade
O problema é que, mesmo que LIDA consiga um dia ter experiências subjetivas, como poderemos provar isto?
Não existem testes objetivos da subjetividade: não há como provar objetivamente, por exemplo, que cada um de nós não é o único ser consciente de si mesmo em um mundo de zumbis.
"Os filósofos veem lidando com isto por mais de 2.000 anos," diz Franklin. Para ele, talvez só possamos admitir que os computadores tenham subjetividade quando eles se tornarem suficientemente inteligentes e comunicativos.
Além de todo um campo de estudos sobre os direitos dos robôs, quando isto eventualmente acontecer restará também a questão se as inteligências artificiais serão capazes de evoluir.