Eric Brücher Camara - BBC - 29/11/2010
Uma polegada
Sem grandes expectativas sobre um acordo global obrigatório para limitar emissões que provocam o efeito estufa, começa nesta segunda-feira a 16ª Conferência das Partes (COP 16) da Convenção-Quadro das Nações Unidas para Mudança Climática (UNFCCC, na sigla em inglês) em Cancún, no México.
Um ano depois do fracasso da reunião anterior, em Copenhague, representantes de 194 países têm a responsabilidade de retomar o caminho rumo a um acordo, embora a própria secretária-executiva da UNFCCC, Christiana Figueres, já tenha afirmado que o processo deve progredir "apenas uma polegada", baixando expectativas de um acordo legalmente obrigatório.
Para que se tenha uma ideia da diferença de expectativas entre Cancún e Copenhague, basta comparar a previsão de presença de presidentes e chefes de Estado nos dois eventos: à Dinamarca, foram 120 líderes, entre eles o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, o então primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, e a chanceler alemã, Angela Merkel, entre outros; no México, são aguardados apenas 20.
Metas voluntárias
Países desenvolvidos têm como principal reclamação a resistência entre alguns países em desenvolvimento, entre eles a China, a aceitar a aferição de metas voluntárias de redução de emissões. O tema, para muitos, envolveria a delicada questão de soberania nacional.
Por outro lado, um acordo abrangente que envolva metas obrigatórias de emissão para países ricos parece um sonho distante, uma vez que os Estados Unidos, a única grande economia que não ratificou sequer o Protocolo de Quioto, de 1997, devem se recusar a assumir compromissos internacionais, já que ainda não têm uma legislação específica sobre essa questão.
Por isso, no hemisfério norte, os sinais também são de baixas expectativas. O ministro britânico para Energia e Mudança Climática, Chris Huhne, afirmou que seu país "não espera um acordo definitivo em Cancún".
Fundo climático
Diante de impasses como estes, algumas delegações e ambientalistas buscam concentrar esforços em temas com maior possibilidade de sucesso, de forma a pavimentar o caminho para um acordo obrigatório na reunião de 2011, na África do Sul.
Entre as áreas em que se acredita estar mais próximo de um acordo estão a regulamentação de um fundo climático e outras formas de financiamento de ações de combate às consequências da mudança climática em países pobres, redução de emissões por desmatamento e degradação (conhecido pela sigla Redd).
A organização não-governamental CARE, por exemplo, acredita que a COP 16 deve alcançar resultados concretos sobre adaptação em países em desenvolvimento, Redd, bem como o estabelecimento do fundo climático global.
O encontro do ano passado, em Copenhague, produziu uma carta de intenções, o Acordo de Copenhague, que não previa metas específicas de emissões, apenas a manutenção do aquecimento global 2ºC acima dos níveis pré-industriais.
Ao longo do ano, vários países apresentaram propostas de cortes de emissões para o acordo, entre eles o Brasil (36.1% a 38.9% até 2020).
No entanto, um relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) calcula que somadas, elas seriam insuficientes para manter o acréscimo na temperatura global abaixo dos 2ºC.
Buraco de emissões
O Pnuma calcula que as promessas atuais seriam suficientes para chegar a apenas 60% do caminho. Segundo os cientistas, o aumento de temperatura ficará entre 2,5% e 5% até o fim do século.
"Há um vazio entre a ciência e os níveis de ambição atuais", afirmou o diretor-executivo do Pnuma, Achim Steiner.
Organizações ambientais devem pressionar os representantes reunidos em Cancún por metas mais rigorosas para emissões de gases do efeito estufa.
"Líderes políticos do mundo precisam urgentemente encontrar uma forma de tampar o buraco de gigatoneladas nas emissões de carbono", afirmou coordenador de apoio da Care, Poul Eric Lauridseé.
Para muitos, o encontro de Cancún será também um teste para a credibilidade e até da viabilidade do sistema de consenso advogado pelas Nações Unidas. Cada vez mais gente, principalmente na América do Norte, defende acordos bilaterais e legislações nacionais como a solução mais prática para combater as mudanças climáticas.
A própria secretária-executiva da UNFCCC, Christiana Figueres, em outubro, alertou para a urgência dessa necessidade.
"Um avanço concreto em Cancún é uma necessidade crucial para restaurar a fé e a capacidade dos envolvidos de levarem o processo adiante, evitando que o multilateralismo seja visto como uma estrada sem fim", disse Figueres em seu discurso de abertura na reunião preparatória de Tianjin.
A 16ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas começa nesta segunda-feira, 29 de novembro, e termina no dia 10 de dezembro.