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Meio ambiente

O mistério do pequeno número adimensional com um grande efeito

Prof. Andrew Bragg/Universidade Duke - 13/01/2022

O mistério do pequeno número adimensional com um grande efeito
Os cientistas vinham assumindo um pressuposto sobre a "luta" entre gravidade e turbulência atmosférica - e esse pressuposto acaba de ser desbancado.
[Imagem: Duke University]

Ao estudar o número não-dimensional que descreve os efeitos da força da gravidade versus a turbulência dos ventos sobre as partículas na atmosfera, climatologistas tiveram uma surpresa: O número não se comporta como os cientistas vinham considerando até agora.

A descoberta é significativa porque virtualmente todos os estudos que levavam esse número em consideração precisarão ser revisados.

A seguir, neste artigo autoral, o professor Andrew Bragg, coordenador da pesquisa, descreve o problema e as implicações da descoberta.


Números não-dimensionais

Números não-dimensionais podem soar como um termo assustador e incompreensível, reservado para cientistas em um laboratório, mas você tem mais experiência com eles do que imagina.

O número Mach mede a velocidade de um objeto em relação à velocidade do som, de forma que, seja medindo em quilômetros por segundo ou milhas por hora, Mach 2 é sempre o dobro da velocidade do som. Com a pandemia de covid-19 ainda grassando em todo o mundo, R0 é um número importante constantemente nas notícias, medindo quantas pessoas um paciente infectará durante o curso de uma doença, seja esse período de dias, semanas ou meses.

Em física, matemática aplicada e engenharia, os números adimensionais são incrivelmente importantes. Os pesquisadores os usam para quantificar as forças relativas de efeitos concorrentes em um sistema. Por exemplo, em dinâmica dos fluidos, o número de Reynolds é usado para quantificar as intensidades relativas das forças viscosas e inerciais no fluxo de um tubo. Independentemente de quais unidades de densidade e velocidade estiverem sendo usadas, se seu valor for inferior a cerca de 2.300 o fluxo é suave e regular, enquanto, se estiver acima de 4.000, o fluxo é turbulento e caótico.

Recentemente, com colegas da Universidade de Notre Dame e da Universidade Twente, estive examinando o problema do transporte de partículas da camada limite atmosférica. Essa região do ar é a parte mais baixa da atmosfera, e seu contato com a superfície da Terra influencia diretamente seu comportamento. A física que rege como ela se agita é de grande importância devido ao seu papel nos processos atmosféricos, como formação de nuvens e balanços de radiação, e o impacto na qualidade do ar e na saúde humana.

O mistério do pequeno número adimensional com um grande efeito
Sempre houve controvérsias envolvendo a Camada Limite Atmosférica.
[Imagem: A. D. Bragg et al. - 10.1103/PhysRevFluids.6.124301]

Gravidade versus turbulência atmosférica

Dois efeitos concorrentes determinam o movimento vertical e a concentração de partículas nesta região - a gravidade puxando-as para o solo e o ar turbulento que gera forças de arrasto, que podem levantá-las.

Os pesquisadores frequentemente quantificam esses efeitos concorrentes usando um número adimensional de sedimentação, Sv, que é a razão entre a rapidez com que as partículas se assentam na ausência de turbulência e a velocidade característica do fluxo de ar turbulento próximo à superfície. A sabedoria convencional é que, quando Sv é muito grande, os efeitos dos ventos turbulentos no movimento da partícula podem ser ignorados, enquanto, quando Sv é muito pequeno, os efeitos do assentamento induzido gravitacionalmente podem ser ignorados.

Em um artigo recente [veja bibliografia], nossas simulações numéricas revelaram algo muito surpreendente: O assentamento gravitacional afetou fortemente os perfis de concentração de partículas em uma camada limite turbulenta, mesmo quando Sv era muito pequeno. Esse resultado desconcertante vai contra a sabedoria convencional. Como o efeito da gravidade sobre as concentrações das partículas pode ser muito forte quando o número adimensional que quantifica sua força é muito pequeno?

Precisávamos encontrar uma maneira de explicar esse resultado surpreendente.

Para fazer isso, construímos uma equação matemática exata para a concentração de partículas usando os chamados métodos de função densidade de probabilidade do espaço de fase. De acordo com esse resultado exato, a competição entre mecanismos físicos distintos determina a concentração de partículas, e apenas um deles é proporcional a Sv.

Nós então fizemos uma análise assintótica das equações [método para descrever o comportamento dos limites de valores], e a análise mostrou que os outros mecanismos na equação de concentração dependem da altura, de forma que, em certas regiões da camada limite atmosférica, esses outros mecanismos tornam-se pequenos em comparação com Sv. Portanto, mesmo que Sv seja muito pequeno, ele ainda pode ser muito maior do que os outros fatores na equação de concentração em certas regiões do fluxo.

De fato, a análise mostra que, não importa o quanto Sv seja pequeno, desde que ele não seja zero, sempre há uma região na camada limite atmosférica onde seus efeitos não podem ser ignorados. Isso explica os resultados desconcertantes de nossas simulações numéricas.

Estudos precisarão ser revisados

Existem implicações significativas que decorrem deste resultado notável.

Em primeiro lugar, quase todos os estudos anteriores ignoraram o efeito da deposição nas concentrações de partículas ao considerar o regime em que Sv é pequeno, e nossos resultados mostram que isso pode levar a erros muito grandes. Esses estudos e suas conclusões, portanto, precisam ser revisados.

Em segundo lugar, e de forma mais geral, é necessário ter muito cuidado ao interpretar o significado e as implicações dos números adimensionais em sistemas físicos. Nossos resultados mostram que, em alguns casos, o uso de números adimensionais para quantificar a importância de um determinado efeito em um sistema pode ser muito enganoso, por isso é necessário muito cuidado.

Bibliografia:

Artigo: Settling strongly modifies particle concentrations in wall-bounded turbulent flows even when the settling parameter is asymptotically small
Autores: A. D. Bragg, D. H. Richter, G. Wang
Revista: Physical Review Fluids
Vol.: 6, 124301
DOI: 10.1103/PhysRevFluids.6.124301
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