Com informações da APS - 21/06/2022
Supremacia quântica sonora
Os dispositivos quânticos são frequentemente apontados como tendo um desempenho melhor do que os equivalentes clássicos, mas essas diferenças podem parecer distantes das nossas vidas cotidianas.
Mas uma equipe da Alemanha acaba de demonstrar um microfone quântico que, segundo aqueles que ouviram o som que ele capta, produz um som mais claro do que um microfone tradicional.
Já existem microfones quânticos capazes de detectar partículas individuais de som, mas esta nova versão é óptica, ou seja, ela capta o som usando luz.
Muitas medições de alta precisão, como a detecção das ondas gravitacionais, contam com interferômetros, aparelhos que medem efeitos de interferência, como as que surgem quando fótons são enviados por dois caminhos possíveis. O uso de pares de fótons emaranhados - entrelaçados segundo as leis da mecânica quântica - reduz as flutuações aleatórias, conhecidas como ruído de disparo ou ruído de Poisson, aumentando a sensibilidade das medições.
Contudo as técnicas mais comuns para isso envolvem a medição dos dois fótons do par entrelaçado, um processo de seleção lento que limita a taxa de medição a 1 Hz - se você quiser usar fótons entrelaçados, por exemplo, para captar som ou para monitorar moléculas se movendo dentro de uma célula, essa taxa será muito lenta.
Como o microfone óptico foi construído
Raphael Nold e seus colegas descobriram agora uma maneira de aumentar a velocidade de medição para esses experimentos de óptica quântica em 10.000 vezes. Em sua configuração, a luz de um laser de entrada passa primeiro por um cristal que cria um fluxo de pares de fótons entrelaçados, que são então injetados pelos dois caminhos (ou braços) do interferômetro.
Para evitar ter que medir os dois fótons nas saídas do interferômetro, a equipe adicionou um componente óptico chamado placa de onda seletiva por comprimento de onda, que gira a polarização da luz que passa por um dos braços do interferômetro. Acontece que essa simples manipulação codifica a informação de dois fótons (a fase quântica do par) em apenas um dos fótons.
Uma vez que a informação é transferida para fótons únicos, a medição do sinal de interferência se torna fácil: Basta calcular a diferença da intensidade da luz nas duas saídas - o mesmo método da interferometria clássica.
A equipe demonstrou que essa técnica permite obter medições sinal/ruído com taxas de amostragem de até 100 kHz, uma frequência alta o suficiente para que a técnica pudesse ser demonstrada em um experimento de gravação de som.
Para transformar seu interferômetro em um microfone óptico, a equipe prendeu um dos espelhos a uma membrana que vibra em resposta às ondas sonoras. À medida que o espelho se move para frente e para trás, ele altera o comprimento de um dos braços do interferômetro, produzindo uma variação observável na luz que chega aos detectores. Essa variação, por sua vez, codifica a voz, assim como a corrente elétrica faz em um microfone convencional.
Teste do microfone quântico
A equipe usou o microfone em um teste auditivo padronizado. As palavras selecionadas foram gravadas com o microfone e reproduzidas para um conjunto de ouvintes humanos, que deviam identificá-las. Um teste semelhante foi feito com um microfone óptico "clássico", no qual o mesmo interferômetro foi usado, mas sem nenhum entrelaçamento de fótons, ou seja, sem o componente quântico na gravação do som. Os voluntários tiveram um sucesso um pouco melhor em reconhecer as palavras gravadas no microfone quântico.
Mas os pesquisadores reconhecem que o teste foi manipulado. "Nosso microfone tem uma vantagem quântica em uma situação artificial que criamos aqui," admite o professor Florian Kaiser. A manipulação envolveu diminuir o volume durante as sessões de gravação para que o ruído de disparo fosse mais alto em relação a outras contribuições de ruído.
Mas, mesmo que o novo microfone quântico não venha revolucionar a gravação de áudio, ele pode beneficiar outros tipos de medições, como na geração de imagens de amostras biológicas. A maioria das células se comporta de forma anormal ou pode ser danificada sob a iluminação intensa exigida hoje. Um microscópio quântico que use o esquema de entrelaçamento desenvolvido pela equipe pode melhorar essas técnicas de imageamento de alta resolução, permitindo que elas funcionem bem usando menos fótons, ou seja, com uma luz mais fraca.