Redação do Site Inovação Tecnológica - 30/01/2018
Mecânica quântica a olho nu
Este pequeno chip é a encarnação de um experimento que, até poucos anos atrás, os físicos considerariam impossível - ele demonstra em macroescala um fenômeno que só ocorre no reino da mecânica quântica, que opera na escala das moléculas e átomos para baixo.
E o chip foi construído com um objetivo bem prático: criar um sistema de engenharia para projetar metamateriais que interagem com ondas de forma específica.
"Antes do nosso trabalho, não havia uma maneira única e sistemática de projetar metamateriais que controlassem as ondas mecânicas para diferentes aplicações. Em vez disso, as pessoas otimizavam um projeto para que ele cumprisse um propósito específico, ou experimentavam novos projetos com base em algo que viram na natureza, e depois estudavam quais propriedades surgiriam da repetição dos padrões," descreve a pesquisadora Chiara Daraio, do Instituto de Tecnologia da Califórnia.
Ocorre que os metamateriais podem lidar com uma ampla diversidade de ondas, da luz às ondas do mar ou dos terremotos. É por isso que eles servem para fazer mantos da invisibilidade, escudos contra terremotos, barreiras sônicas contra tsunamis, coisas supertransparentes e uma série de outras possibilidades. Isso significa que cada um desses materiais deve ser projetado especificamente para o fim a que se destina - lembre-se que metamateriais são formados por estruturas repetidas responsáveis por manipular as ondas.
Este novo chip promete pela primeira vez disponibilizar um método para a concepção sistemática desses metamateriais utilizando os princípios da mecânica quântica, o que permitirá, por exemplo, lidar com a grande diversidade de comprimentos de onda envolvidos nas diversas aplicações.
A expectativa é que, com uma maior facilidade de projeto, os metamateriais possam alcançar aplicações mais convencionais, como a transferência de energia entre aparelhos sem precisar de fios.
Quadrupolo
O pequeno chip, de 10 x 10 centímetros, comporta-se como um isolante topológico quando estimulado externamente usando ultra-som - sob a ação do ultra-som, dentre as 100 pequenas placas idênticas da pastilha, apenas as dos cantos começam a vibrar.
Isolantes topológicos são materiais cuja superfície tem características eletromagnéticas e ópticas diferentes do seu interior, um fenômeno que tem sua origem e opera ao nível da mecânica quântica. O chip é um sistema macroscópico que opera segundo o mesmo comportamento, com a diferença de que a luz que aciona os isolantes topológicos foi substituída por ondas de som e, em vez de átomos e elétrons, o efeito ocorre em placas visíveis a olho nu.
"Em um isolantes topológico convencional, as vibrações só se espalham pela superfície, mas não dentro. O fenômeno é reduzido por uma dimensão," explica Sebastian Huber, do Instituto ETH de Zurique, coautor do trabalho.
Em um isolante topológico de segunda ordem, no entanto, o fenômeno é reduzido em duas dimensões. Consequentemente, com uma pastilha de silício bidimensional, a vibração não ocorre mais ao longo das bordas, mas apenas nos cantos, em um ponto de dimensão zero. "Somos os primeiros a ter sucesso em criar experimentalmente o isolante topológico de ordem superior previsto [pela teoria]," acrescentou Huber.
Aplicações práticas e teóricas
Para demonstrar o potencial de sua criação, a equipe criou uma lente acústica perfeita, que focaliza o som sem perda de sinal, e um guia de ondas que direciona e retarda a propagação do som.
Eles acreditam que sua plataforma experimental permitirá construir metamateriais para funcionarem como guias de ondas para redes de comunicação, sistemas de colheita de energia do ambiente, sensores de alta sensibilidade, melhores antenas etc.
Mas a demonstração também interessa aos teóricos.
"A descoberta-chave de um ponto de vista teórico é que certos isolantes topológicos de segunda ordem não podem ser descritos matematicamente como um dipolo, como são os isolantes topológicos convencionais, mas como quadrupolos, que são muito mais complexos. O fato de termos sido capazes de implementar isso experimentalmente em uma estrutura macroscópica pela primeira vez é, portanto, também um avanço para os teóricos." explicou Huber.