Redação do Site Inovação Tecnológica - 17/02/2020
Cientistas artificiais
Nas últimas décadas, a inteligência artificial revolucionou muitos setores da sociedade, com o aprendizado de máquinas dirigindo carros, identificando tumores e jogando xadrez - muitas vezes superando os humanos que criaram os programas.
Mas parece que as máquinas também podem aprender a seguir o método científico e resolver problemas muito mais rapidamente do que os cientistas de carne e osso.
Uma equipe do Japão, Alemanha e França demonstrou que programas de computador bem treinados também podem derrotar os físicos teóricos no seu próprio jogo, resolvendo problemas complexos com a mesma precisão que os cientistas - mas consideravelmente mais rápido.
Agora eles querem que os programas resolvam problemas ainda não resolvidos.
Problema do nióbio
Tudo começou com as fases magnéticas muito estranhas detectadas no pirocloro, o principal mineral do qual é extraído o nióbio.
Em todos os ímãs, cada átomo está associado a um pequeno momento magnético, mais conhecido como "spin". Nos ímãs convencionais, como aqueles grudados nas portas das geladeiras, todos os spins são ordenados, apontando na mesma direção, o que resulta em um forte campo magnético - essa ordem magnética é similar ao modo como os átomos se ordenam nos cristais de qualquer material sólido.
Mas, assim como a matéria pode existir em diferentes fases - sólida, líquida e gasosa - as substâncias magnéticas também podem. Tem havido grande interesse em uma fase magnética específica, chamada "líquido de spin", porque ela poder ter usos na computação quântica. Nos líquidos de spin, há interações concorrentes, ou "frustradas", entre os spins; portanto, em vez de se ordenarem, a direção dos spins flutua continuamente, semelhante à desordem observada nas fases líquidas da matéria.
Levou seis anos para que os físicos conseguissem construir um diagrama de fases capaz de mostrar como diferentes fases poderiam ocorrer nos ímãs de pirocloro quando os spins interagiam de maneiras diferentes, conforme a temperatura muda - essa demonstração foi publicada em 2017.
Ciência por computador
Inconformados em terem gasto seis preciosos anos no árduo processo de elaborar o mapa dessas interações entre os spins em cada fase, os físicos resolveram então dar o mesmo problema para um programa de inteligência artificial resolver.
Para isso, Jonas Greitemann e seus colegas desenvolveram um "kernel tensorial", uma maneira de representar configurações de spin em um programa de computador. Esse núcleo tensorial foi usado para alimentar um programa chamado "máquina de vetores de suporte", que é capaz de categorizar dados complexos em diferentes grupos.
"A vantagem desse tipo de máquina é que, diferentemente de outras máquinas de vetores de suporte, ela não requer treinamento prévio e não é uma caixa preta - os resultados podem ser interpretados. Os dados não são apenas classificados em grupos; você pode também interrogar a máquina para saber como ela tomou sua decisão final e aprender sobre as propriedades distintas de cada grupo," explicou Ludovic Jaubert, membro da equipe.
A máquina foi então alimentada com 250 mil configurações de spin, geradas por um supercomputador a partir das simulações de um modelo do pirocloro.
Problemas não resolvidos
Sem qualquer informação sobre quais fases magnéticas estariam presentes no mineral de nióbio, a máquina conseguiu reproduzir uma versão idêntica do diagrama de fases criado pela equipe - a diferença é que o procedimento inteiro levou apenas algumas semanas, e não anos.
"A maior parte desse tempo foi humana, portanto ainda são possíveis novas acelerações. Com base no que sabemos agora, a máquina poderia resolver o problema em um dia," disse o professor Lode Pollet.
E, quando os físicos decifraram a "função de decisão" que a máquina havia construído para classificar os diferentes tipos de líquidos de spin, eles descobriram que o programa de inteligência artificial também havia descoberto independentemente as equações matemáticas exatas que exemplificavam cada fase.
"Ficamos fascinados com o sucesso da máquina, o que pode ter implicações enormes para a física teórica. O próximo passo será dar à máquina um problema ainda mais difícil, que os humanos ainda não conseguiram resolver, e ver se a máquina pode fazer melhor, disse o professor Shannon.