SBPC - 29/07/2010
Aprender com os erros
Depois de décadas em crise, a indústria brasileira de construção naval está passando por um momento de recuperação proporcionada, em grande parte, pelos investimentos que estão sendo realizados no setor de óleo e gás no País.
Mas, para não sofrer um novo revés, os estaleiros nacionais terão que reparar e não repetir os mesmos erros que cometeram no passado, quando também se apoiaram no mercado interno e em um único setor para viabilizarem seus projetos, alerta o professor Floriano Carlos Martins Pires Junior, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
"O Brasil já aprendeu a lição de que não se pode contar somente com a demanda doméstica e de um único setor para consolidar as atividades de uma indústria naval em longo prazo", afirma Pires Junior. "É preciso diversificar a atuação para outros segmentos de transporte marítimo e aproveitar essa nova oportunidade para aumentar a competitividade internacional", indica o especialista que abordará esse assunto em uma conferência que fará na 62ª Reunião Anual da SBPC.
História da indústria naval brasileira
De acordo com Pires Junior, o modelo de desenvolvimento da indústria de construção naval adotado pelo Brasil na década de 80, quando o setor viveu um de seus melhores momentos, provocou efeitos desastrosos e que perduram até hoje. Extremamente protecionista, o plano se baseou em uma política de substituição de importação que previa a construção de navios no País para atenderem à demanda interna da marinha mercante.
Porém, com a desregulamentação do setor de navegação, a abertura do mercado nacional e a entrada de competidores internacionais, a maioria dos estaleiros brasileiros entrou em crise e fechou as portas por falta de encomendas no mercado interno e porque não tinham tecnologia para competir no exterior.
Os poucos estaleiros nacionais que sobreviveram à quebradeira passaram a atender o mercado offshore, de pequenas embarcações. E nos últimos anos, com as encomendas que estão sendo feitas, principalmente pela Petrobras, começaram a vislumbrar a possibilidade de voltarem a fabricar navios de grande porte e de atender uma significativa demanda por embarcações mais sofisticadas, como plataformas e navios sondas, utilizados para perfuração de poços submarinos.
Entretanto, para isso, o professor afirma que eles precisarão recuperar o atraso tecnológico em relação aos concorrentes internacionais.
"Depois de tantos anos sem fabricar grandes embarcações a distância tecnológica entre os estaleiros brasileiros e os principais fabricantes mundiais aumentou muito", diz. "O perfil de profissional que nós temos hoje no Brasil atuando nesse setor é o mesmo das décadas de 70 e 80. Será preciso qualificar e aumentar a quantidade de recursos humanos para atender à demanda do setor nos próximos anos tanto nas áreas de produção e operacional como de engenharia".
Participação das empresas
Segundo o professor, as instituições de pesquisa e formação de recursos humanos para o setor naval no Brasil, como a Coppe/URFJ, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e o Centro de Pesquisa e Desenvolvimento da Petrobras (Cenpes), estão se mobilizando e tomando iniciativas para suprirem as deficiências tecnológicas e de recursos humanos do setor.
Mas ainda falta um maior engajamento das indústrias em participar e se envolver diretamente nesse processo.
De acordo com Pires Junior, os estaleiros brasileiros têm capacitação em processo e planejamento de construção, mas não no controle de produção e na fabricação de grandes embarcações. Para ele, essas deficiências podem ser supridas por intermédio de parcerias como as que a maioria deles está celebrando com fabricantes da Coreia e Japão - os dois países que dominam as tecnologias de produto e processo de fabricação de navios.
Mas ele chama a atenção para a necessidade de as indústrias brasileiras desenvolverem paralelamente sua própria capacitação tecnológica. "Esse tipo de parceria tecnológica entre estaleiros brasileiros e internacionais é muito limitada, porque as tecnologias de processo e de projeto, na realidade, não são transferidas", diz.
O especialista estima que, com atual recuperação, a indústria brasileira de construção naval não disputará com os principais fabricantes de navios, que são os chineses, seguidos dos coreanos e japoneses. Poderão, no entanto, aumentar sua participação para 5% no mercado mundial naval, contra 0% que registra hoje. "Eu não diria que o Brasil pode ambicionar ser um grande fabricante de navios. Mas uma indústria naval com o tamanho do mercado brasileiro precisa tomar alguns cuidados para ser competitiva internacionalmente ou ficar, literalmente, a ver navios", conclui.