Redação do Site Inovação Tecnológica - 03/02/2023
Gelo amorfo
Cientistas descobriram um novo tipo de gelo que se assemelha mais à água líquida do que qualquer outro gelo conhecido, trazendo um novo elemento para a longa lista de anomalias da água.
O gelo recém-descoberto é amorfo, isto é, suas moléculas estão em uma forma desorganizada, como acontece com os vidros e as cerâmicas, e não organizadas como no gelo cristalino comum.
O gelo amorfo, embora raro na Terra, é o principal tipo de gelo encontrado no espaço porque no ambiente mais frio do espaço o gelo não tem energia térmica suficiente para formar cristais.
Ele foi batizado de gelo amorfo de média densidade, ou MDA na sigla em inglês para Medium-Density Amorphous.
"Conhecemos 20 formas cristalinas de gelo, mas apenas dois tipos principais de gelo amorfo foram descobertos anteriormente, conhecidos como gelos amorfos de alta densidade e de baixa densidade. Há uma enorme lacuna de densidade entre eles e a sabedoria aceita é que não existiria gelo dentro dessa lacuna de densidade.
"Nosso estudo mostra que a densidade do gelo de densidade média [que acabamos de descobrir] está precisamente dentro dessa lacuna de densidade e essa descoberta pode ter consequências de longo alcance para nossa compreensão da água líquida e suas muitas anomalias," disse o professor Christoph Salzmann, que descobriu o novo gelo com colegas das universidades de Cambridge e College de Londres, no Reino Unido.
Densidade dos gelos amorfos
Para criar o novo tipo de gelo, a equipe usou um equipamento chamado moinho de bolas, agitando vigorosamente gelo comum junto com bolas de aço em uma jarra resfriada a -200 ºC.
Em vez de acabar em pequenos pedaços de gelo comum, o processo produziu a nova forma amorfa de gelo que, ao contrário de todos os outros gelos conhecidos, tem uma densidade muito similar à da água líquida e cujo estado se assemelha à água na forma sólida. Ele tem a forma de um pó branco fino.
Os gelos amorfos se distinguem por suas densidades, com o gelo amorfo de baixa densidade tendo uma densidade de 0,94 g/cm3 e o gelo amorfo de alta densidade marcando 1,13 g/cm3. No entanto, nem os gelos cristalinos nem os amorfos pareciam ter uma forma com densidade próxima à da água líquida (~1 g/cm3). Essa lacuna de densidade é a pedra angular da nossa compreensão atual da água. Este novo gelo descoberto agora tem uma densidade de 1,06 g/cm3, mas a margem de erro da medição é de exatos 0,06 g/cm3.
A diferença de densidade entre os gelos amorfos conhecidos até agora levou os cientistas a desenvolverem a teoria de que a água existiria como dois líquidos em temperaturas muito frias e que, a uma certa temperatura, ambos os líquidos poderiam coexistir, com um tipo flutuando sobre o outro, como numa mistura de óleo e água.
A descoberta do gelo de média densidade, contudo, contesta essa teoria.
"Os modelos existentes da água devem ser testados novamente. Eles precisam ser capazes de explicar a existência do gelo amorfo de média densidade. Este pode ser o ponto de partida para finalmente explicarmos a água líquida," disse Salzmann.
Gelo espacial
Os pesquisadores propuseram que o gelo recém-descoberto pode ser o verdadeiro estado vítreo da água líquida - ou seja, uma réplica precisa da água líquida na forma sólida, da mesma forma que o vidro das janelas é a forma sólida do dióxido de silício líquido. No entanto, há também a possibilidade de que o MDA não seja vítreo, estando em um estado cristalino fortemente cisalhado.
A equipe sugere que o MDA pode existir naturalmente dentro de luas de gelo do Sistema Solar externo, já que as forças de maré de gigantes gasosos como Júpiter e Saturno podem exercer forças de cisalhamento no gelo comum similares àquelas criadas pela moagem no moinho de bolas.
Além disso, a equipe descobriu que, quando o MDA foi aquecido e recristalizado, ele liberou uma quantidade extraordinária de calor, o que significa que ele poderia desencadear movimentos tectônicos e "terremotos de gelo" na cobertura de gelo de quilômetros de espessura em luas como Ganimedes.