Redação do Site Inovação Tecnológica - 02/07/2024
Tempotrônica
Agora que os cristais do tempo deixaram de ser uma mera curiosidade, já durando tempo suficiente para serem úteis, começaram a surgir as primeiras propostas de uso prático dessas estruturas intrigantes que, ao menos teoricamente, podem até mesmo sobreviver ao fim do Universo.
Um trio de físicos da Austrália e da Polônia está propondo construir placas de circuito impresso temporais, feitas com cristais do tempo, como um caminho para resolver os problemas de erros que ainda atravancam o desenvolvimento dos computadores quânticos.
Mais problemático do que aumentar o número de qubits, o que é necessário para que os computadores quânticos possam resolver problemas práticos, é preciso resolver o problema dos erros nessas computações. Como os fenômenos quânticos são muito sensíveis, os qubits perdem os dados muito facilmente - e, quanto maior o número de qubits, maior será o problema.
Além do mero contato com o ambiente - os computadores quânticos funcionam resfriados até próximo do zero absoluto para tentar evitar isso -, surgem erros quando os qubits interagem entre si durante a execução dos cálculos. Essas interações levam à degradação dos seus estados quânticos, ou seja, das informações que eles contêm. Aí é preciso ficar repetindo os cálculos à exaustão para que a confiança nos resultados possa alta o suficiente.
Krzysztof Giergiel e seus colegas desenvolveram então uma ideia que poderá permitir aos qubits trabalharem em conjunto e trocar dados de uma forma que evita que as suas interações degradem seus dados.
Placa de circuito impresso temporal
A ideia é simples: Usar um cristal do tempo como se ele fosse uma placa de circuito impresso. Seria uma placa de circuito impresso temporal, por assim dizer - assim como os componentes eletrônicos ficam distribuídos no espaço de uma placa de circuito impresso comum, os qubits ficarão distribuídos no tempo, inaugurando o que os pesquisadores batizaram de "tempotrônica".
Primeiro, lembre-se como funciona um cristal do tempo: Enquanto nos cristais comuns os átomos formam arranjos periódicos que se repetem em grandes escalas de comprimento, nos cristais do tempo a estrutura cristalina muda periodicamente no tempo, alterando-se continuamente em um ritmo preciso.
A proposta consiste em construir um cristal do tempo formado por átomos ultrafrios, que também funcionariam como qubits. Desse modo, os qubits permaneceriam espalhados, e sempre em movimento, o que lhes permitirá cruzar os caminhos de outros qubits e interagir com eles de maneiras que não levarão à degradação dos seus estados.
Essa estrutura também permitiria que qubits distantes interagissem de maneiras que não são possíveis nos computadores quânticos atuais, abrindo o caminho para rodar algoritmos mais complexos do que é possível hoje.
O trio de pesquisadores esclarece que ainda não construiu um computador quântico assim, mas já está trabalhando com átomos de potássio ultrafrios para construir o cristal do tempo, ou seja, a placa de circuito impresso temporal no qual o computador quântico à prova de erros poderá ser construído.
O que são cristais do tempo?
Os cristais comuns - poderíamos dizer, "cristais no espaço" - são arranjos periódicos de átomos que se repetem em um arranjo que confere aos cristais uma aparência fascinante. Como na física o espaço e o tempo são tipicamente tratados no mesmo nível, o físico Frank Wilczek postulou em 2012 que, além de cristais no espaço, também deveria haver cristais no tempo.
A ideia de Wilczek é que, para surgir um cristal do tempo, uma das suas propriedades físicas teria que começar espontaneamente a mudar periodicamente no tempo, mesmo que o sistema não experimentasse a interferência periódica correspondente - ou seja, sem que nada externo forçasse o cristal a se modificar.
De 2017 em diante, os cientistas conseguiram demonstrar um potencial cristal do tempo sob algumas condições especiais. No entanto, aqueles eram sistemas que - ao contrário da ideia original de Wilczek - eram submetidos a uma excitação temporal com uma periodicidade específica, e depois reagiam com outro período duas vezes mais longo.
Mas logo a seguir, em 2019, se demonstrou que um cristal do tempo pode existir sem qualquer força externa; em 2021 um cristal do tempo foi filmado pela primeira vez, eles finalmente começaram a sair dos ambientes controlados dos experimentos quânticos e um deles até foi criado dentro de um processador quântico.
O cristal do tempo "definitivo", que se comporta periodicamente no tempo, embora a excitação seja independente do tempo, ou seja, constante, foi finalmente demonstrado em 2022 em um condensado de Bose-Einstein. No entanto, o cristal viveu apenas alguns milissegundos - pela teoria um cristal do tempo pode até mesmo sobreviver ao fim do Universo.
Então, no início deste ano, físicos finalmente criaram um cristal do tempo que dura muito tempo. Assim, é uma questão de tempo para que eles comecem a funcionar como uma placa de circuito impresso quântica.