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Algas cultivadas em Marte podem sustentar colônias humanas

Redação do Site Inovação Tecnológica - 17/02/2021

Algas cultivadas em Marte podem sustentar colônias humanas
Foram usados nove biorreatores para simular todas as condições da Terra e de Marte. À direita, foto do interior de um dos biorreatores, com seu sistema de iluminação controlado.
[Imagem: C. Verseux/ZARM]

Bactérias em Marte

Enquanto alguns astrobiólogos pensam em criar roupas espaciais para bactérias para que elas sobrevivam em outros planetas, Cyprien Verseux e seus colegas da Universidade de Bremen, na Alemanha, acreditam que esses microrganismos tão úteis podem ser mais resilientes do que os astronautas humanos.

Eles demonstraram pela primeira vez que uma atmosfera de baixa pressão, rica em N2/CO2, água e nutrientes da poeira de Marte são suficientes para cultivar as bactérias que servirão como primeiro elo de uma cadeia de sustentação da vida conforme a humanidade tentar colonizar outros planetas.

A proposta é fornecer aos exploradores espaciais um sistema de suporte de vida baseado em cianobactérias, tornando mais fácil para os futuros colonos produzirem alimentos e outros recursos, evitando a necessidade de importar da Terra oxigênio, água, comida e outros consumíveis, o que seria impraticável a longo prazo.

A equipe demonstrou experimentalmente que cianobactérias Anabaena podem ser cultivadas apenas com os gases atmosféricos, os nutrientes do solo, as condições de baixa pressão e o gelo derretido de Marte. Tudo o que seria necessário levar seria as próprias bactérias.

"Nós demonstramos que as cianobactérias podem usar gases disponíveis na atmosfera marciana, a uma pressão total baixa, como sua fonte de carbono e nitrogênio. Nessas condições, as cianobactérias mantiveram sua capacidade de crescer em água contendo apenas poeira semelhante à de Marte e ainda poderiam ser usadas para alimentar outros micróbios. Isso poderia ajudar a tornar sustentáveis as missões de longo prazo a Marte," disse Verseux.

Algas cultivadas em Marte podem sustentar colônias humanas
Esquema de funcionamento de cada biorreator.
[Imagem: C. Verseux/ZARM]

Sustentabilidade em Marte

Como reproduzir em Marte as condições atmosféricas terrestres seria inviável - imagine gigantescas panelas de pressão com sistemas de aquecimento para cultivar as bactérias - Verseux procurou um meio-termo: Uma atmosfera próxima à de Marte que permita que as cianobactérias cresçam bem.

Ele e seus colegas desenvolveram um biorreator, que batizaram de Atmos (sigla em inglês para "Testador de Atmosfera para Sistemas Orgânicos em Marte"), no qual as cianobactérias podem ser cultivadas em atmosferas artificiais a baixa pressão, em diversos recipientes com um litro de capacidade cada um.

As condições estabelecidas foram simples: Qualquer entrada para o reator deve ser obtida no próprio Planeta Vermelho. Além do nitrogênio e do dióxido de carbono, gases abundantes na atmosfera marciana, e água que poderia ser extraída do gelo nos polos do planeta, os nutrientes devem vir do regolito, a poeira que cobre planetas e luas semelhantes à Terra. O regolito marciano é rico em nutrientes como fósforo, enxofre e cálcio.

Os pesquisadores escolheram uma cepa de cianobactéria fixadora de nitrogênio, chamada Anabaena sp. PCC 7938, porque testes preliminares mostraram que ela seria particularmente boa no uso dos recursos marcianos e pode servir de alimentos para cultivar outros microrganismos. Além disso, espécies intimamente relacionadas têm-se mostrado comestíveis, adequadas para engenharia genética e capazes de formar células dormentes, que sobrevivem em condições adversas.

Como o solo marciano nunca foi trazido para a Terra, foi usado um substrato desenvolvido pela Universidade Central da Flórida, chamado "Simulador Global de Marte", fabricado com base nos estudos do solo do planeta feito pelas diversas missões robotizadas. Como controle, as bactérias foram cultivadas em meio padrão terrestre e em variações com atmosferas terrestre e marciana e alimentos terrestres e marcianos.

As cianobactérias cresceram bem em todas as condições, inclusive com o regolito sob a mistura de 96% de nitrogênio e 4% de dióxido de carbono a uma pressão de 100 hPa - dez vezes menor do que na Terra. Como esperado, elas cresceram mais rápido no meio padrão otimizado para cianobactérias do que no solo simulado de Marte, em qualquer atmosfera. Ainda assim, o resultado é um grande sucesso: Enquanto o meio padrão precisaria ser importado da Terra, o regolito está em Marte inteiro. "Queremos usar como nutrientes os recursos disponíveis em Marte, e apenas esses," ressaltou Verseux.

Algas cultivadas em Marte podem sustentar colônias humanas
O objetivo é cultivar bactérias usando apenas materiais que podem ser encontrados em Marte.
[Imagem: Cyprien Verseux et al. - 10.3389/fmicb.2021.611798]

Cadeia de suprimentos marciana

O próximo passo foi demonstrar que as cianobactérias poderiam servir como primeiro elo da cadeira de suprimentos para os colonos marcianos.

A biomassa seca de Anabaena foi então moída, suspensa em água estéril, filtrada e usada como substrato para o cultivo de bactérias E. coli, provando que açúcares, aminoácidos e outros nutrientes podem ser extraídos delas para alimentar outras bactérias, que são menos resistentes, mas já comprovadamente úteis para a biotecnologia. Por exemplo, a E. coli poderia ser projetada mais facilmente do que a Anabaena para gerar produtos alimentícios e medicamentos em Marte, algo que a Anabaena não consegue produzir.

Apesar dos bons resultados, a equipe ressalva que mais estudos são necessários, por exemplo, fazer um ajuste fino da combinação de pressão, dióxido de carbono e nitrogênio ideal para o crescimento, e testar outros gêneros de cianobactérias, talvez geneticamente modificadas para missões espaciais. E é preciso também projetar um sistema de cultivo que possa ser levado para Marte.

"Nosso biorreator Atmos não é o sistema de cultivo que usaríamos em Marte: Ele serve para testar, na Terra, as condições que forneceríamos lá. Mas nossos resultados ajudarão a orientar o projeto de um sistema de cultivo marciano. Por exemplo, a pressão mais baixa significa que podemos desenvolver uma estrutura mais leve e com mais facilidade de transporte, pois não terá que suportar grandes diferenças entre o interior e o exterior," concluiu Verseux.

Bibliografia:

Artigo: A Low-Pressure, N2/CO2 Atmosphere Is Suitable for Cyanobacterium-Based Life-Support Systems on Mars
Autores: Cyprien Verseux, Christiane Heinicke, Tiago P. Ramalho, Jonathan Determann, Malte Duckhorn, Michael Smagin, Marc Avila
Revista: Frontiers in Microbiology
DOI: 10.3389/fmicb.2021.611798
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