Redação do Site Inovação Tecnológica - 21/11/2020
Uma substância, duas fases
Cientistas acreditam ter finalmente comprovado experimentalmente que a água pode ter, simultaneamente, dois estados líquidos diferentes, que não se misturam.
"A possibilidade de a água existir em dois estados líquidos diferentes foi proposta há cerca de 30 anos, com base em resultados obtidos em simulações de computador," explicou Nicolas Giovambattista, da Universidade Cidade de Nova Iorque.
O problema é que a teoria indicava que as duas fases simultâneas da água só devem existir em temperaturas muito frias, muito abaixo do ponto de congelamento da água.
"Esta hipótese contra-intuitiva tem sido uma das questões mais importantes na química e física da água, e um cenário controverso desde o seu início. Isso porque os experimentos que podem acessar os dois estados líquidos na água têm sido muito desafiadores devido à aparentemente inevitável formação de gelo nas condições em que os dois líquidos deveriam coexistir," acrescentou.
O estado líquido "normal" da água é esse que conhecemos bem, que corresponde à água em estado líquido a temperatura e pressão ambientes - 1 atmosfera terrestre e 25 ºC.
Contudo, usando uma combinação de lasers de raios X com pulsos de ultracurtos de luz infravermelhos, a equipe conseguiu aquecer rapidamente camadas de gelo formadas sob pressão a cerca de -73 ºC. O aquecimento rápido criou água líquida de alta densidade em pressões estimadas entre 2,5 e 3,5 quilobares.
À medida que a camada se expandia e descomprimia, a cerca de -63 ºC , apareceram os tão esperados "domínios líquidos de baixa densidade", que duraram entre 20 nanossegundos e 3 microssegundos, o que é mais rápido do que o tempo necessário para a cristalização do gelo, permitindo que equipe detectasse essa segunda fase líquida, que apresentou uma densidade 20% menor do que a água líquida comum.
Efeitos práticos da dupla fase líquida da água
Na prática, isso significa que, nessa temperatura e pressão - 2,5 e 3,5 quilobares e -63 ºC - a água existe como uma combinação de dois líquidos que não se misturam, separados por uma fina interface, similar à que ocorre quando se coloca água e óleo juntos.
Dada a importância da água na Terra, essa coexistência de fases pode ter largas implicações em ambientes onde as duas condições podem coexistir - como nas regiões permanentemente congeladas do planeta - e nos experimentos científicos em campos como a bioquímica, a preservação criogênica de materiais e o clima.
"Permanece em aberto a questão de como a presença de dois líquidos pode afetar o comportamento das soluções aquosas em geral e, em particular, como os dois líquidos podem afetar as biomoléculas em ambientes aquosos," disse Giovambattista. "Isso motivará estudos adicionais na busca de aplicações potenciais."