Felipe Silva - Agecom UFSC - 19/04/2006
Uma pesquisa desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) mostrou que a adulteração de gasolina tipo C, a mais vendida no mercado, pode burlar os testes de qualidade dos combustíveis realizados pela Agência Nacional do Petróleo (ANP). Segundo o estudo, o problema pode estar na flexibilidade dos parâmetros adotados pela ANP.
A pesquisa faz parte da dissertação de mestrado de Elaine Vosniak Takeshita, que realizou ensaios no laboratório da ANP em Brasília. Ela constatou que é possível fazer misturas de gasolina tipo C com até 30% de solvente AB9, 20% de solvente aguarrás ou 2% de óleo diesel, sem que isso seja detectado pelos testes da agência.
A gasolina tipo C tem sua composição regulada por uma resolução do governo federal de fevereiro deste ano: 80% de gasolina pura (ou do tipo A) mais 20% de álcool anidro, com tolerância de 1% para mais ou para menos. Qualquer alteração nesses percentuais ou a presença de substâncias diferentes na fórmula, como os solventes ou o óleo diesel, caracteriza adulteração do combustível. O uso de combustível adulterado pode causar problemas mecânicos no veículo e aumentar a emissão de gases poluentes e substâncias cancerígenas.
De acordo com Elaine, a flexibilidade dos parâmetros utilizados pela ANP ao analisar a gasolina pode ser a principal causa dos erros registrados. No teste de densidade do combustível, por exemplo, não há especificação de qual o valor-padrão para a gasolina ser aprovada. Já no ensaio de pressão de vapor é exigido apenas que o combustível testado não ultrapasse um parâmetro máximo de 69 quilopascais (kPa). Nenhuma combinação estudada na pesquisa, mesmo as com alto percentual de adulterantes na gasolina, excedeu esse limite.
Mas como não há um valor mínimo especificado pela agência. Todas, inclusive aquelas que se aproximam muito do máximo permitido (68 Kpa, por exemplo), seriam aprovadas nesse teste. "Nossa sugestão é que sejam feitos ensaios mais rígidos", afirma o orientador do trabalho, o professor Antônio Augusto Ulson de Souza, do Departamento de Engenharia Química e Engenharia de Alimentos (EQA). Apesar dos equívocos registrados em relação a alguns adulterantes, a pesquisa comprovou que os parâmetros da ANP são eficientes para detectar o excesso de álcool anidro (AEAC) na gasolina. Qualquer valor de AEAC acima dos níveis permitidos por lei foi facilmente flagrado nos testes.
Para a realização do estudo, a pesquisadora utilizou os mesmos métodos de avaliação de combustível adotados pela ANP. Foram feitos cinco tipos de análise: densidade, curva de destilação, pressão de vapor, octanagem (capacidade do combustível de resistir à compressão no interior dos cilindros do motor sem entrar em auto-ignição) e teor de hidrocarbonetos - compostos químicos constituídos por átomos de carbono e hidrogênio. Para que um combustível seja aprovado, ele não pode apresentar irregularidade em nenhum desses testes.
A pesquisadora enviará um relatório à ANP informando os resultados de sua pesquisa e fazendo sugestões para o aperfeiçoamento dos testes. Entre as principais recomendações, está a revisão de alguns parâmetros e a inclusão de outros, para que possam ser detectadas adulterações causadas pelo acréscimo de pequenos volumes de solvente.