Com informações da Agência Fapesp - 18/03/2019
Geologia da vida
Uma das condições que permitiram o surgimento e a manutenção da vida na Terra é o fato de o planeta ser geologicamente ativo, com terremotos e vulcões.
A atividade vulcânica, gerada pela movimentação das placas tectônicas sobre o manto terrestre possibilita reciclar gases, como o dióxido de carbono, através do manto, da crosta, da atmosfera e dos oceanos. Dessa forma, esse tectonismo contribui para tornar a Terra habitável ao manter a temperatura do planeta em condições ideais para a sobrevivência dos seres vivos.
Com base nesse entendimento, pesquisadores do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) saíram em busca de exoplanetas rochosos na nossa galáxia com altas probabilidades de apresentarem tectonismo, o que aumentaria a chance de também serem habitáveis.
Eles encontraram muitos, sugerindo a possibilidade de haver vida espalhada por toda a Via Láctea.
"Verificamos que há condições geológicas favoráveis para o surgimento e a manutenção da vida em exoplanetas rochosos, e que ela [a vida] pode estar espalhada por todo o disco da galáxia e ter-se originado em qualquer época da evolução da Via Láctea," disse o professor Jorge Luis Melendez Moreno.
Exoplanetas geologicamente ativos
Os pesquisadores determinaram os parâmetros superficiais, as massas e as idades de 53 gêmeas solares - estrelas similares ao nosso Sol - situadas em diferentes pontos da Via Láctea. Além disso, analisaram a composição química dessas estrelas gêmeas solares a fim de avaliar a possibilidade de existência de outros planetas rochosos em torno delas.
As análises foram feitas por meio de um espectrógrafo chamado HARPS, instalado no telescópio de 3,6 metros do Observatório de La Silla, do Observatório Europeu do Sul (ESO), no Chile. O equipamento registra o espectro eletromagnético de "cores" dos corpos celestes, dos comprimentos de onda mais curtos (ultravioleta) aos mais longos (infravermelho).
As análises indicaram que as estrelas apresentam grande abundância de tório - elemento radioativo com isótopos instáveis que, ao se romper, em razão da instabilidade atômica, se divide em isótopos menores que emitem energia, processo conhecido como decaimento radioativo.
A energia liberada pelo decaimento de isótopos instáveis, tanto de tório como de outros elementos radioativos, como urânio e potássio, dá origem à movimentação de magma (convecção do manto) e à atividade tectônica da Terra. Parte do calor interno do planeta é resquício do calor primordial da formação da Terra, mas pelo menos a metade da energia é devida ao decaimento radioativo.
Dessa forma, as concentrações iniciais desses elementos radioativos em um planeta rochoso contribuem de modo indireto para a habitabilidade em sua superfície, especialmente devido ao longo tempo de decaimento, em escalas de bilhões de anos, explicam os pesquisadores.
"As concentrações de tório nas estrelas gêmeas indicam que há uma grande quantidade de energia disponível pelo decaimento desse elemento radioativo para manter a convecção do manto e o tectonismo em potenciais planetas rochosos que possam existir em torno de gêmeas solares," afirmou o pesquisador Rafael Botelho.
Vida pela galáxia
A abundância inicial de tório nas gêmeas solares foi comparada com as de ferro, silício - um indicador da espessura e massa do manto convectivo em planetas rochosos - e mais dois elementos pesados: o neodímio e o európio. As medidas indicaram que a razão tório-silício em gêmeas do Sol aumenta com o tempo, e que foi maior ou, no mínimo, igual ao valor solar desde a formação do disco da galáxia.
"Há indícios de que o tório também é abundante em gêmeas solares velhas. Isso significa que o disco da Via Láctea pode estar repleto de vida," disse André Milone, orientador da pesquisa.
Esta conclusão está de acordo com estudos que usaram outras técnicas para mostrar que a Via Láctea pode ter 100 milhões de planetas habitáveis.