Com informações da TU Vienna - 30/12/2013
Transição de fase do espaço-tempo
Um universo em expansão como o nosso pode emergir de uma forma extremamente simples, que mais parece uma receita de sopa instantânea - é só aquecer e mexer.
Quando uma sopa esquenta, ela começa a ferver e fica pronta.
Quando o tempo e o espaço são aquecidos, fica pronta não uma sopa, mas um universo em expansão, sem a necessidade de qualquer outro ingrediente - como um "Big Bang", por exemplo.
Esta transição de fase entre um espaço vazio entediante e um movimentado universo em expansão, pleno de matéria, acaba de ser demonstrado matematicamente por uma equipe das universidades de Tecnologia de Viena (Áustria), Edimburgo (Escócia), Harvard e MIT (EUA).
Mais do que tentar deixar de lado a ideia do Big Bang, a ideia por trás deste resultado estabelece uma conexão notável entre a teoria quântica de campos e a teoria da relatividade de Einstein.
Há poucos dias, outra equipe já havia demonstrado que um buraco de minhoca e o entrelaçamento quântico podem ser diferentes manifestações da mesma realidade física, também alinhavando uma conexão entre mecânica quântica e relatividade geral.
Um livro de receitas para o espaço-tempo
Todo o mundo conhece as transições entre as fases líquida, sólida e gasosa. Mas tempo e espaço também podem sofrer uma transição de fase, como os físicos Steven Hawking e Don Page demonstraram em 1983. Eles calcularam que o espaço vazio pode se transformar em um buraco negro a uma temperatura específica.
O que os físicos estão propondo agora é que um processo similar pode criar um universo em expansão inteiro - como o nosso - com uma temperatura crítica em que o espaço-tempo vazio se transforma em um universo, com toda a sua massa.
"O espaço-tempo vazio começa a ferver, pequenas bolhas se formam, uma das quais se expande, e eventualmente engloba todo o espaço-tempo," explica Daniel Grumiller, da Universidade de Tecnologia de Viena, o mesmo que está por trás da teoria do universo holográfico.
Para que isso seja possível, o universo tem de girar, de forma que a receita para a criação de um universo fica sendo simplesmente "aquecer e mexer". E a rotação necessária pode ser arbitrariamente pequena.
Nessa primeira abordagem da nova teoria, os físicos consideraram apenas um espaço-tempo com duas dimensões espaciais. "Mas não há nenhuma razão pela qual o mesmo não seja verdade para um universo com três dimensões espaciais," disse Grumiller.
Universo holográfico
A nova teoria é o passo lógico seguinte após a chamada "correspondência AdS-CFT", uma conjectura apresentada em 1997, que influenciou fortemente a investigação fundamental em física desde então. Ela descreve uma ligação entre as teorias da gravidade e as teorias de campo quântico, propondo que as afirmações das teorias quânticas de campo podem ser traduzidas em afirmações sobre teorias gravitacionais, e vice-versa.
Nesse tipo de correspondência, a teoria quântica de campos é sempre descrita em uma dimensão a menos do que a teoria gravitacional - esse é o chamado de "princípio holográfico".
De forma semelhante a um holograma bidimensional, que pode representar um objeto tridimensional, uma teoria quântica de campos com duas dimensões espaciais pode descrever uma situação física em três dimensões espaciais.
Para isso, os cálculos gravitacionais geralmente têm de ser feitos em uma espécie exótica de geometria - nos chamados "espaços anti-de Sitter", que são bastante diferentes da geometria plana à qual estamos acostumados.
No entanto, tem-se suspeitado já há algum tempo que possa haver uma versão semelhante do "princípio holográfico" para espaços-tempos planos. Mas, por muito tempo, ninguém conseguiu construir um modelo demonstrando isso.
No ano passado, Daniel Grumiller e seus colegas estabeleceram um modelo de princípio holográfico.
Isto levou ao problema agora abordado e à transição de fase do espaço-tempo.
Transições de fase em teorias quânticas de campo são bem conhecidas. Mas, por razões de simetria, isto significaria que as teorias gravitacionais também deveriam apresentar transições de fase.
"No começo, este era um mistério para nós," disse Grumiller. "Isso significaria uma transição de fase entre um espaço-tempo vazio e um universo em expansão. Para nós, isso soou extremamente improvável."
Mas os cálculos mostraram exatamente isso. "Estamos apenas começando a entender essas notáveis relações de correspondência," acrescenta Grumiller.
Quais novas ideias sobre nosso próprio Universo poderão ser derivadas desses novos conceitos é algo difícil dizer - só o espaço-tempo dirá.