Redação do Site Inovação Tecnológica - 05/11/2013
Inteligência no hardware
Embora fabricar um computador tão poderoso quanto o cérebro humano tenha ficado mais difícil, os pesquisadores não desistem de tentar.
O último esforço rumo aos processadores neuromórficos acaba de ser dado por Jian Shi e seus colegas da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos.
Shi criou um novo tipo de transístor que imita o comportamento de uma sinapse.
Diferentemente dos memristores, o transístor sináptico simultaneamente modula o fluxo de informação em um circuito e se adapta fisicamente à alteração dos sinais nesse fluxo.
Segundo os pesquisadores, o transístor sináptico poderá inaugurar uma nova era no campo da inteligência artificial, quando a inteligência estará incorporada não nos algoritmos codificados nos programas, mas na própria arquitetura do computador.
Transístor sináptico
"Nosso transístor é realmente um análogo das sinapses em nossos cérebros," disse Shi. "Cada vez que um neurônio inicia uma ação e outro neurônio reage, a sinapse entre eles aumenta a força de sua conexão. E quanto mais rápido os neurônios disparam a cada vez, mais forte fica a ligação sináptica. Essencialmente, elas memorizam a ação entre os neurônios."
No cérebro, isso ocorre com uma corrente formada por íons de cálcio.
Shi replicou o mecanismo da corrente iônica usando íons de oxigênio.
Quando uma tensão é aplicada, os íons entram e saem da rede cristalina de um filme de um material chamado niquelato de samário - o filme é muito fino, medindo apenas 80 nanômetros de espessura.
O niquelato de samário funciona como a sinapse entre dois terminais de platina, um deles representando os axônios, e outro os terminais dendríticos.
A variação na quantidade de íons no niquelato aumenta ou diminui sua condutância - ou seja, sua capacidade para transportar informações em uma corrente elétrica - e, assim como na sinapse natural, a força da ligação depende da temporização do sinal elétrico.
Além da lógica binária
Para funcionar, o transístor sináptico ainda depende de um pequeno reservatório de líquido iônico e de um circuito multiplexador que converte o intervalo entre os sinais em uma magnitude de tensão que é aplicada ao líquido iônico, criando um campo elétrico que leva os íons para o niquelato ou os retira de lá.
Isso significa que, enquanto cada transístor eletrônico tradicional mede entre 20 e 30 nanômetros, o transístor sináptico como um todo mede quase 1 milímetro.
Mas a comparação direta entre as duas tecnologias pode não ser justa. Afinal, o transístor sináptico não está restrito ao sistema binário de 0s e 1s.
"Este sistema muda sua condutância de forma analógica, de forma contínua, conforme a composição do material se altera," explica Shi. "Seria bastante difícil usar CMOS, a tecnologia tradicional da eletrônica, para imitar uma sinapse real porque as sinapses biológicas têm um número praticamente ilimitado de estados possíveis, e não apenas ligado ou desligado."
Outra vantagem é que o transístor sináptico é não-volátil, não perdendo a informação quando a energia é desligada.
Além disso, o novo transistor é energeticamente muito eficiente. O niquelato de samário pertence a uma classe incomum de materiais, chamados sistemas de elétrons correlacionados, que podem sofrer uma transição isolante-metal. Isso significa que uma excitação muito pequena, obtida com uma pequena energia de entrada, gera um sinal forte na saída.
Finalmente, tudo funcionou da temperatura ambiente até 160º C, demonstrando uma grande robustez para o projeto do transístor sináptico.
Dificuldades a vencer
No estágio atual, também há inconvenientes quando se pensa em usar o transístor sináptico para construir um processador neuromórfico.
O principal deles é a presença do líquido iônico, o que exigiria um aparato microfluídico e um sistema de contenção difícil de compatibilizar com um chip.
O protótipo também é muito grande para o padrão dos componentes eletrônicos, o que se traduz em uma menor velocidade de operação.
Por último, há a dificuldade do material exótico usado, o niquelato de samário, que é difícil de sintetizar.
"Você precisará construir novos instrumentos para ser capaz de sintetizar esses novos materiais, mas uma vez que seja capaz de fazer isso, você realmente terá um novo sistema cujas propriedades são praticamente inexploradas," disse o professor Shriram Ramanathan, coordenador do estudo.
"É muito entusiasmante ter esses materiais para trabalhar, onde muito pouco se sabe acerca deles e você tem a oportunidade de construir o conhecimento a partir do zero," concluiu ele.