Redação do Site Inovação Tecnológica - 27/03/2024
Análogo de buraco negro
Há muito tempo os cientistas sonham em criar microburacos negros em laboratório, o que seria um marco na história da ciência, ajudando a responder questões fundamentais sobre a mecânica quântica e a natureza inexplicável da força da gravidade. Havia até esperanças de que o LHC criasse esses microburacos negros, o que até hoje parece não ter acontecido.
Enquanto esses experimentos não se tornam realidade, temos que nos contentar com os chamados "análogos", imitações de buracos negros que, ao preservar uma ou mais das características da coisa real, nos permitem entendê-los um pouco mais.
Foi o que aconteceu agora na Universidade de Nottingham, no Reino Unido, onde uma equipe de várias instituições conseguiu criar pela primeira vez um vórtice quântico com dimensões suficientes para imitar um buraco negro, o que está permitindo ver com mais detalhes como esses análogos de buracos negros se comportam e interagem com o seu entorno.
Tornado quântico
Usando hélio resfriado até próximo do zero absoluto, quando o gás se transforma em um superfluido, Patrik Svancara e seus colegas criaram um tornado de dimensões macroscópicas mas que, por ser tão frio, ainda preserva os efeitos quânticos.
E, ao observar a dinâmica das ondas geradas na superfície do superfluido, a equipe comprovou que esses tornados quânticos imitam as condições gravitacionais próximas a buracos negros em rotação. As ondas de superfície se comportam como campos que se propagam em uma geometria curva do espaço-tempo.
O elemento crucial para criar essa analogia entre gravidade e fluidos está na manipulação da viscosidade. "O uso de hélio superfluido nos permitiu estudar pequenas ondas de superfície com maior detalhe e precisão do que em nossos experimentos anteriores usando água. Como a viscosidade do hélio superfluido é extremamente baixa, fomos capazes de investigar meticulosamente sua interação com o tornado superfluido e comparar os resultados com nossas próprias projeções teóricas," contou Svancara.
Vitamina quântica
Embora de altíssima tecnologia e incorporando um bocado de ajustes feitos por experimentação, o aparato lembra muito um liquidificador, com a diferença de que, em vez de lâminas que entram em contato com o fluido, a rotação é induzida por ímãs - um ímã externo girado por um motor elétrico faz os ímãs internos girarem para formar o vórtice.
Esse "liquidificador quântico" pode conter vários litros de hélio superfluido, em temperaturas inferiores a -271 °C. A essa temperatura o hélio líquido adquire propriedades quânticas incomuns, que normalmente impedem a formação de vórtices gigantes em outros fluidos quânticos, como gases atômicos ultrafrios ou fluidos quânticos de luz. Neste novo aparato, a interface do hélio superfluido funciona como uma força estabilizadora para esses objetos.
"O hélio superfluido contém pequenos objetos chamados vórtices quânticos, que tendem a se espalhar uns dos outros. Em nossa configuração, conseguimos confinar dezenas de milhares desses quanta em um objeto compacto semelhante a um pequeno tornado, alcançando um fluxo de vórtice com força recorde no domínio dos fluidos quânticos," disse Svancara.
Melhoria das simulações
Os primeiros resultados mostraram paralelos interessantes entre o fluxo do vórtice e a influência gravitacional dos buracos negros no espaço-tempo ao seu redor. Isso servirá de embasamento para melhorar as simulações de teorias quânticas de campos em computador, que buscam compreender o complexo reino dos espaços-tempos curvos - pela teoria atual, são essas curvaturas que dão origem à força da gravidade.
"Quando observamos pela primeira vez assinaturas claras da física dos buracos negros na nossa experiência analógica inicial em 2017, foi um momento inovador para a compreensão de alguns dos fenômenos bizarros que são muitas vezes desafiadores, se não impossíveis, de estudar de outra forma," disse a professora Silke Weinfurtner, referindo-se ao experimento anterior da equipe, quando um buraco negro foi simulado em uma banheira.
"Agora, com o nosso experimento mais sofisticado, levamos esta pesquisa para o próximo nível, o que poderá eventualmente nos levar a prever como os campos quânticos se comportam em espaços-tempos curvos em torno de buracos negros astrofísicos," concluiu Weinfurtner, que também estuda o vácuo quântico e os buracos negros usando ondas de som.