Com informações da Agência Fapesp - 11/04/2022
Plástico verde
Uma equipe de químicos do Brasil e de Portugal desenvolveu um processo sustentável que aproveita solventes que não agridem o meio ambiente para fabricar plásticos biodegradáveis.
Esse plástico "verde" poderá, no futuro, ser usado em embalagens com propriedades antioxidantes e antimicrobianas.
Depois de mais de oito anos de estudos, a equipe demonstrou que solventes eutéticos, considerados "verdes" ou ambientalmente amigáveis, são eficazes para extrair os carotenoides astaxantina e betacaroteno, ambos pigmentos antioxidantes, da biomassa da levedura Phaffia rhodozyma. Esses pigmentos naturais são de grande interesse comercial pela aplicação em diversas áreas industriais, como alimentícia, de cosméticos e farmacêutica, entre outras.
Além disso, os solventes podem ser usados, simultaneamente, como agentes extratantes (para extração de compostos) e como plastificantes para a preparação de filmes biodegradáveis à base de amido bioativo, sem a necessidade de purificação adicional.
"Buscamos alternativas aos pigmentos sintéticos e aos processos de extração que utilizam solventes poluentes. Trabalhamos com métodos sustentáveis para obter os pigmentos naturais e, a partir de solventes verdes, aplicá-los posteriormente em plásticos biodegradáveis", disse o pesquisador Cassamo Mussagy, que desenvolveu a tecnologia em conjunto com colegas das universidades de São Paulo (USP) e Estadual Paulista (UNESP), no Brasil e Aveiro e Coimbra, em Portugal.
Líquidos eutéticos e líquidos iônicos
A equipe produziu os carotenoides cultivando a Phaffia rhodozyma em um biorreator, um recipiente com as condições adequadas para a levedura. A seguir, para extrair os pigmentos da levedura, foram usados líquidos iônicos e solventes eutéticos à base de colina, uma das vitaminas do complexo B produzida pelo organismo humano e encontrada na natureza, conjugados a ácidos graxos (butanoicos).
Uma mistura eutética é uma mistura homogênea de substâncias que derrete ou solidifica a uma temperatura que é inferior ao ponto de fusão de qualquer um dos seus constituintes. E os líquidos iônicos são sais formados por dois componentes, um com carga positiva e outro com carga negativa.
Tanto os líquidos iônicos como os eutéticos são apontados como "solventes ideais" para a extração de compostos de matrizes naturais, principalmente por suas propriedades de solvatação, fenômeno que ocorre quando um composto iônico se dissolve em uma substância polar sem formar uma nova.
Para maximizar a recuperação de astaxantina (um dos mais importantes antioxidantes naturais produzidos por leveduras ou microalgas) e de betacaroteno, os pesquisadores testaram cinco concentrações de biomassa-solvente (relação sólido-líquido), um parâmetro crucial em procedimentos de ruptura celular para recuperar moléculas intracelulares de biomassas microbianas.
"Detectamos que o solvente com melhor resultado, além de extrair o corante da biomassa do microrganismo, também atuou como agente plastificante para embalagem," disse a professora Valéria Ebinuma, uma das orientadoras do trabalho.
Os próximos passos agora têm como foco a aplicação dos resultados para demonstrar que as embalagens com esse tipo de plástico "verde" podem ser usadas com várias finalidades, incluindo a indústria alimentícia.
Crescimento dos bioplásticos
Com a crescente busca do consumidor por produtos mais saudáveis e de alto valor nutricional, além das preocupações com os ecossistemas, o mercado tem procurado substituir os pigmentos sintéticos por compostos naturais, que não poluem e podem apresentar atividades biológicas, como ação antioxidante (astaxantina) e antimicrobiana.
Segundo os pesquisadores, a produção e extração desses pigmentos naturais a partir de microrganismos devem contribuir com o aumento da oferta dos bioplásticos no mercado. Hoje, os bioplásticos, ou biopolímeros, representam menos de 1% dos 367 milhões de toneladas de plástico fabricados por ano no mundo.
Contudo, impulsionado pela demanda por alternativas sustentáveis vinda das áreas de embalagens, eletroeletrônicos e até têxteis, o setor de biopolímeros prevê um crescimento nos próximos anos. A estimativa é que a produção aumente de cerca de 2,42 milhões de toneladas em 2021 para 7,59 milhões de toneladas em 2026.
"Os processos atuais de produção industrial ainda são agressivos, mesmo que o produto seja biodegradável. Um exemplo é o do papel que, apesar de ser renovável e reciclável, tem, majoritariamente, métodos de fabricação não sustentáveis, isto é, com alto consumo de energia, de água e de compostos químicos tóxicos. Nesta pesquisa, demonstramos que é possível obter bioplásticos utilizando uma plataforma integrada e mais sustentável," concluiu o professor Jorge Pereira, membro da equipe.