Redação do Site Inovação Tecnológica - 14/08/2024
Redes neurais de luz
Pesquisadores suíços criaram um hardware programável que elimina um gargalo computacional fundamental da computação com luz, incluindo os sistemas de inteligência artificial ópticos.
Em uma série de experimentos de classificação de imagens, a equipe demonstrou que seu equipamento executa cálculos precisos e facilmente expansíveis usando a luz dispersa de um laser de baixa potência, ou seja, usando uma fração da energia consumida pelos computadores eletrônicos necessários para fazer os mesmos cálculos e mesmo dos processadores de luz anteriores.
As demonstrações anteriores, e têm sido inúmeras ultimamente, tipicamente se baseiam em lasers de alta potência, o que diminui os ganhos oferecidos pela utilização da luz em lugar da eletricidade.
À medida que os sistemas de inteligência artificial digital crescem em tamanho e funcionalidade, também cresce a energia necessária para treiná-los e fazê-los funcionar. Redes neurais profundas, inspiradas pela arquitetura do cérebro humano, são especialmente famintas por energia devido aos milhões ou até bilhões de conexões (sinapses artificiais) entre múltiplas camadas de processadores neuromórficos.
Computação óptica
Para neutralizar essa crescente demanda de energia, os pesquisadores dobraram os esforços para implementar sistemas de computação óptica, que existem como curiosidade científica desde a década de 1980. Esses sistemas usam os fótons para processar dados e, embora a luz possa teoricamente ser usada para executar cálculos muito mais rápida e eficientemente do que elétrons, um desafio fundamental tem dificultado a capacidade dos sistemas ópticos de superar o estado da arte eletrônico.
"Para classificar dados em uma rede neural, cada nó, ou 'neurônio', deve tomar uma 'decisão' de disparar ou não com base em dados de entrada ponderados. Essa decisão leva ao que é conhecido como uma transformação não linear dos dados, o que significa que a saída não é diretamente proporcional à entrada," explica o professor Christophe Moser, da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL).
Enquanto redes neurais digitais podem facilmente realizar transformações não lineares usando transistores, os sistemas ópticos exigem lasers muito potentes para fazer a mesma coisa.
Para desenvolver um método energeticamente eficiente para executar essas computações não lineares opticamente a equipe mudou a abordagem de codificação dos dados, com os píxeis de cada imagem sendo inseridos na modulação espacial de um feixe de laser de baixa potência. O feixe reflete de volta sobre si mesmo várias vezes, levando a uma multiplicação não linear dos píxeis.
"Nossos experimentos de classificação de imagens em três conjuntos de dados diferentes mostraram que nosso método é escalonável e até 1.000 vezes mais eficiente em termos de energia do que as redes digitais profundas de última geração, tornando-o uma plataforma promissora para a realização de redes neurais ópticas," contou o professor Demetri Psaltis.
Entenda a computação com fótons
Na natureza, os fótons não interagem diretamente uns com os outros do mesmo modo que acontece com os elétrons. Para conseguir fazer transformações não lineares usando sistemas baseados em luz, os cientistas tiveram então que "forçar" os fótons a interagir indiretamente. A técnica mais usada consiste em disparar uma luz intensa o suficiente para modificar as propriedades ópticas de um vidro ou outro material pelo qual a luz passa.
A equipe suíça contornou essa necessidade de um laser de alta potência com uma solução surpreendentemente simples: Eles codificaram espacialmente os píxeis de uma imagem sobre a superfície de um feixe de laser de baixa potência. Ao repetir a operação, por meio do ajuste da trajetória do laser no codificador, os píxeis são multiplicados por si mesmos, ou seja, elevados ao quadrado. Como a potência de dois é uma transformação não linear, essa modificação estrutural atinge a não linearidade tão essencial para os cálculos das redes neurais, com a vantagem de fazer isto a uma fração do custo de energia.
Essa codificação pode ser realizada duas, três ou até dez vezes, aumentando a não linearidade da transformação e a precisão do cálculo. Tudo usando apenas luz, sem depender mais dos materiais de mudança de fase usados para imitar a interação entre os fótons.
Essa escalabilidade é uma grande vantagem, já que o objetivo final é usar sistemas híbridos eletrônicos-ópticos para mitigar o consumo de energia das redes neurais digitais. No entanto, será necessário antes aprimorar a engenharia do sistema para atingir esse aumento de escala - por exemplo, como os sistemas ópticos usam hardware diferente dos sistemas eletrônicos, um próximo passo, no qual os pesquisadores já estão trabalhando, é desenvolver um compilador para traduzir os dados digitais em código que os sistemas ópticos consigam entender e usar.