Redação do Site Inovação Tecnológica - 06/11/2018
Ondas gravitacionais foram uma ilusão?
As notícias de que finalmente detectamos as ondas gravitacionais - ondulações no espaço-tempo previstas por Einstein - reverberaram em todo o mundo em 2015, o que valeu um extraordinariamente rápido Prêmio Nobel de Física em 2017, tamanha era a expectativa por esse feito.
Agora parece que tudo pode não ter passado de uma ilusão.
Uma investigação da revista britânica New Scientist, que caiu como uma bomba na comunidade científica, apontou dúvidas sérias e erros graves na interpretação dos dados feita pelo grande consórcio de cientistas da Colaboração LIGO, os compridos laboratórios onde foi feita a detecção das ondas gravitacionais - depois da detecção inicial de 2015, pelo menos outros três eventos já foram anunciados.
As alegações de falhas na análise dos dados foram divulgadas pela primeira vez por um grupo de pesquisadores dinamarqueses em 2016. Depois de não receber resposta da colaboração LIGO para suas dúvidas, Hao Liu e Andrew Jackson, do Instituto Niels Bohr, em Copenhague, publicaram suas dúvidas em um periódico revisado por pares, o que significa que outros cientistas, os chamados revisores, acharam que a coisa é séria e precisa ser elucidada.
Foi aí que a equipe da revista New Scientist decidiu investigar. E o resultado foi a revelação de uma série de irregularidades nas conclusões da equipe LIGO e no artigo que descreve a descoberta, incluindo uma série de dados desenhada "a olho", mas que aparece no artigo científico como sendo baseada em dados reais.
"Acreditamos que o LIGO não conseguiu apresentar argumentos convincentes para a detecção de qualquer evento de onda gravitacional," disse Jackson, acrescentando que não houve descoberta: "Tudo foi uma ilusão".
Dados e ruído
Embora os pesquisadores dinamarqueses não trabalhem diretamente com ondas gravitacionais, eles têm experiência em análises de sinais, checando e tirando conclusões a partir de grandes conjuntos de dados, como aqueles envolvendo a radiação cósmica de fundo de micro-ondas.
E análises de sinais são o principal instrumento analítico do LIGO para extrair um sinal de onda gravitacional dos dados brutos dos seus detectores. Quando as ondas gravitacionais atingem a Terra, elas são extremamente fracas, fazendo com que os longos túneis dos detectores sofram uma alteração no comprimento equivalente a cerca de um milésimo do diâmetro de um próton. Isso é muito menor do que os distúrbios causados pelos tremores sísmicos de fundo e até mesmo das vibrações térmicas naturais do hardware do detector. Por isso lidar bem com o ruído de fundo é um problema enorme na detecção de ondas gravitacionais.
Mas quando Jackson e seus colegas analisaram os dados da primeira detecção, sobrepondo os sinais dos dois detectores, emergiu uma correlação entre os gráficos. Eles verificaram e checaram novamente, mas o que descobriram é que o ruído residual nos detectores Hanford e Livingston - dois detectores do LIGO - tinham características em comum. "Chegamos a uma conclusão que foi muito perturbadora: Eles não separaram o sinal do ruído," resume Jackson.
Viatcheslav Mukhanov, da Universidade Ludwig Maximilian, na Alemanha, que é editor da revista científica ao qual a crítica de Jackson e seus colegas foi submetida para publicação, afirmou ter enviado o artigo para os mais qualificados revisores da área: "Ninguém foi capaz de apontar um erro concreto na análise dinamarquesa. Não há erros."
Tempestade na comunidade científica
"Uma tempestade em um copo de água?" pondera Michael Brooks, da New Scientist. Afinal, a relatividade geral é uma das teorias mais bem verificadas, o LIGO deve ser sensível o suficiente para detectar as ondas gravitacionais, e os instrumentos estão encontrando essas ondas exatamente na taxa prevista pela teoria. Então, por que se preocupar com esse "ruído"?
O problema é que físicos já cometeram erros antes, justamente por causa do ruído. E não precisa ir longe. Antes do LIGO, em 2014, a colaboração BICEP2 anunciou ter comprovado as ondas gravitacionais e a inflação cósmica, anúncio esse seguido por um vexatório desmentido no ano seguinte, depois que outros pesquisadores encontraram erros na análise dos dados - justamente no ruído.
E há outras questões que justificam a desconfiança. A New Scientist descobriu, por exemplo, que a colaboração LIGO publicou gráficos de dados que não foram derivados da análise real. O artigo sobre a primeira detecção na Physical Review Letters usou um gráfico de dados que era mais "ilustrativo do que preciso," confirmou Neil Cornish, membro do LIGO e um dos responsáveis pela análise dos dados. Ou seja, alguns dos resultados apresentados naquele artigo para fundamentar a descoberta não foram encontrados usando algoritmos de análise, mas foram feitos "a olho", a título ilustrativo, segundo Cornish, embora isto não esteja indicado na legenda do gráfico ou no texto do artigo.
Há também atalhos questionáveis nos dados liberados pelo LIGO para uso público. A colaboração fez uma aproximação na subtração do sinal do detector Livingston do sinal do detector Hanford, deixando correlações nos dados - as mesmas correlações que Jackson identificou. Agora há uma nota na página da colaboração afirmando que a forma de onda disponível publicamente "não foi ajustada para remover precisamente o sinal".
Espera ansiosa
Depois de um longo silêncio, a colaboração LIGO finalmente afirmou que irá publicar um novo artigo contendo uma "explicação detalhada de como é feita a análise do ruído em seus detectores".
A comunidade física mundial aguarda com ansiedade as explicações. Enquanto isso, Jackson e seus colegas já publicaram um novo artigo propondo uma "busca cega" nos dados que poderá indicar a presença confiável de um sinal de onda gravitacional nos dados do LIGO.
Se a descoberta não for confirmada, restará tentar melhorar o LIGO ou esperar pelo Telescópio Einstein.