Com informações da Agência Fapesp - 22/06/2023
Superexplosões
As erupções associadas às ejeções de massa coronal - comumente chamadas de explosões solares - liberam quantidades descomunais de energia, a ponto de impactar diretamente nosso planeta, causando maior ocorrência de auroras, blecautes nas comunicações por rádio, aumento do efeito de cintilação nos sinais de GPS, redução nas velocidades e altitudes dos satélites artificiais e por aí vai.
É claro que são poucas as explosões que causam danos significativos. Mas há grandes preocupações em relação às erupções mais fortes dentre todas, conhecidas como superexplosões, que liberam de 1.000 a 10.000 vezes mais energia do que as maiores explosões tipicamente vistas no Sol.
Essas superexplosões já foram detectadas em outras estrelas. Assim, tem havido grande interesse em descobrir quais seriam as possibilidades de o Sol apresentar uma explosão dessa proporção. Se as erupções de muito menor intensidade já impactam tão fortemente nossa sociedade tecnológica, o que esperar de fenômenos energéticos de tal magnitude?
Para se ter uma ideia, estima-se que superexplosões seguidas sejam capazes de varrer inteiramente a atmosfera de planetas que orbitem mais próximo da estrela.
Relação entre manchas e explosões estelares
Até agora, havia uma consideração intuitiva entre os astrônomos e astrofísicos de que, quanto mais explosões a estrela apresentar, maior será a probabilidade de ocorrência de superexplosões.
Mas não foi isso o que descobriram Alexandre Araújo (Centro Integrado de Jovens e Adultos de Campo Limpo) e Adriana Valio (Centro de Radioastronomia e Astrofísica Mackenzie), conforme estudavam duas estrelas do tipo solar: a Kepler-411 e a Kepler-210.
Para surpresa dos pesquisadores, mesmo as duas estrelas sendo semelhantes em todos os aspectos, desde as massas até os períodos de rotação e os sistemas planetários, e de ambas apresentarem em torno de 100 manchas, a primeira produziu 65 supererupções, enquanto a segunda não produziu nenhuma - as manchas solares são o principal indicador usado hoje nas pesquisas de clima espacial para rastrear indícios de erupções iminentes.
"Pelo conhecimento que se tinha da literatura, as estrelas com manchas maiores teriam mais chance de produzir superexplosões, mas não foi isso que observamos. As manchas estelares da Kepler-411 são muito menores do que as da Kepler-210. Teoricamente, seria esta que deveria ter superexplosões, mas isso não acontece. Nossa explicação para a inexistência de superexplosões na Kepler-210, mesmo com grandes manchas na sua superfície, está na complexidade magnética, na evolução e no tempo de vida das manchas," disse Alexandre.
Manchas solares não explicam superexplosões
As manchas solares, que aparecem na superfície do Sol, chamada fotosfera, são causadas por campos magnéticos muito fortes, e podem durar de alguns dias a várias semanas.
"Sua formação começa com um campo magnético gerado pelo movimento de partículas eletricamente carregadas na tacoclina, fina camada compreendida entre as regiões radiativa e convectiva do interior solar. Ao emergirem na superfície do Sol, os tubos de fluxo magnético criam regiões de campo intenso, que bloqueiam a transferência de calor do interior para a superfície. As manchas são escuras porque sua temperatura é 1.000 a 1.500 graus menor do que a temperatura do resto da superfície," explicou Adriana.
A hipótese mais plausível seria então que a detecção de supererupções estaria diretamente ligada à cobertura temporal das manchas na superfície das estrelas; e que, quanto maior a área das manchas estelares, maior seria o armazenamento de energia magnética para produzir a explosão, aumentando a probabilidade de uma superexplosão.
"Nossos resultados trouxeram uma perspectiva um pouco diferente. Como já foi dito, na Kepler-411, detectamos 65 supererupções, com energias de até 1.035 ergs [1.035 x 107 quilojoules]. Enquanto a Kepler-210 não apresentou nenhuma supererupção, mesmo com o dobro de cobertura temporal, o que nos deu maior probabilidade de observação. E o que mais nos surpreendeu foi o fato de os raios das manchas estelares da Kepler-411 serem muito menores do que os da Kepler-210," detalhou Alexandre.
Magnetograma
Uma nova hipótese, levantada pela dupla, é que, a despeito de serem maiores em área, as manchas da Kepler-210 apresentariam uma configuração magnética mais simples.
"No Sol, as manchas são classificadas de acordo com o comportamento do campo magnético na área. E classificadas como alfa (α), beta (β), gama (γ) e delta (δ), ou por meio de uma combinação dessas configurações. As manchas deltas são as que apresentam intensa atividade de erupções solares. Acreditamos que as manchas da Kepler-210 apresentem uma configuração magnética mais simples, do tipo alfa ou beta. Infelizmente, a confirmação exata dessa hipótese só seria possível por meio de magnetogramas, que são imagens capazes de detectar a localização e a intensidade dos campos magnéticos. Atualmente, só conseguimos observar isso no Sol. Ainda não temos tecnologia para obter magnetogramas de estrelas distantes," detalhou Adriana.
Assim, focar na contagem e nas medição das manchas solares não parece ser um caminho adequado para prever alguma eventual superexplosão no Sol.
"De qualquer forma, nosso estudo já nos permite dizer que, em vez de fechar o foco na área das manchas estelares, talvez seja mais produtivo considerar a complexidade magnética das regiões ativas [para explicar as superexplosões]," concluiu Adriana.