Carlos Orsi - Inovação Unicamp - 07/01/2013
Sincronização por luz
Como a bola numa roleta de cassino, uma partícula de luz percorre a borda de um disco de silício, com metade do diâmetro de um fio de cabelo.
Diferente da roleta, no entanto, o disco é leve o bastante para que o fóton o faça vibrar, uma vibração que é transmitida pela luz para outro disco idêntico, separado do primeiro, que passa a oscilar em sincronia com o original.
Ao deslizar pela borda da roleta de silício, o fóton faz com que ela se deforme - a massa do disco é da ordem de picogramas, ou trilionésimos de grama. Essa deformação modula o sinal de luz, que dessa forma transporta informação, que pode ser lida ou reproduzida, sobre o modo de vibração do disco.
Este experimento de sincronização em nanoescala pode vir a ter importantes consequências no desenvolvimento da tecnologia de informática.
Seus realizadores, entre eles o físico brasileiro Gustavo Wiederhecker, já requisitaram patente pelo invento.
Microinternet
Os osciladores fotônicos também poderão ser úteis para a tecnologia dos computadores multicore, que usam vários núcleos de processamento. Com o aumento do número de núcleos em cada máquina, há uma tendência de que a comunicação entre eles passe a ser feita por uma rede de fibras ópticas. Numa arquitetura do tipo, ter nanorrelógios de silício que podem ser sincronizados por sinais de luz é uma vantagem.
"A verdade é que as empresas já estão trabalhando nessa área. Se você pegar a Intel, por exemplo, eles têm um protótipo que é um processador de 80 núcleos", diz o pesquisador, que compara as redes ópticas internas desses processadores a uma "microinternet" - já que a rede global de dados é, hoje, interligada por cabos ópticos.
"É aí que entra a física", afirma Wiederhecker. "É tentar fazer esses bloquinhos fundamentais que demonstrem a possibilidade de um dia se construir, de forma barata e viável, a tecnologia dessa microinternet. E um desses bloquinhos talvez seja este trabalho que a gente vem desenvolvendo."
Sincronização
"A base de qualquer sistema que envolva tempo, o GPS, a comunicação óptica, todos os sistemas de comunicação, os computadores em si, depende de sincronização", explica Wiederhecker, que já havia sido pioneiro em outro experimento com nanoestruturas manipuladas pela luz.
"E hoje em dia, em todas as escalas, as bases de medição do tempo dependem de oscilações, sejam elas mecânicas ou transições atômicas, como nos relógios mais precisos do mundo. Mas nem todo mundo pode ter um relógio atômico. Localmente, dentro do seu celular, você tem um cristal de quartzo, que é uma pecinha que fica vibrando mecanicamente," complementa.
A sintonia de equipamentos como telefones celulares também depende de osciladores, que permitem isolar e selecionar as diferentes faixas de comunicação.
"Dentro do celular há um filtro mecânico que garante que se consiga ter a seletividade de frequências. Você coloca várias pessoas conversando simultaneamente e cada celular consegue pegar só a conversa A, só a conversa B, só a conversa C. Para isso acontecer, você precisa de um cristal de quartzo, de um sistema mecânico que oscile por períodos muito longos de tempo," explica Wiederhecker.
Tecnologia CMOS
Do ponto de vista tecnológico, principalmente para aplicações de informática, os novos nano-osciladores criados por Wiederhecker, que atualmente trabalha no Laboratório de Nanofotônica do Instituto de Física da Unicamp, tem as vantagens de usar o mesmo material predominante nos processadores - o silício -, o que pode vir a tornar a fabricação de equipamentos mais simples e barata - além do fato de a sincronização das unidades poder ser feita por meio de raios de luz.
"Toda a tecnologia de computadores hoje é baseada num conceito que se chama CMOS [Complementary metal-oxide-semiconductor], que é um processo de fabricação, o processo usado para fazer chips de computador," explica o brasileiro.
"Se uma tecnologia é barata ou não hoje em dia, ela é avaliada nos seguintes termos: ela é compatível com o CMOS? Ou seja, você consegue ir a uma fábrica de chips e falar, olha, eu tenho aqui uma ideia nova. Se essa ideia é compatível com o CMOS, amanhã ela está pronta. Você consegue fabricar em larga escala, colocar isso em celulares, etc. Se isso não é compatível com o CMOS, será necessário um trabalho muito mais árduo para integrar isso ao CMOS."
Usando-se a luz, dispensa-se a existência de uma ligação mecânica - como uma barra ou uma mola - entre os osciladores que se deseja sincronizar.
"Nesse artigo [para a Physical Review Letters] o que a gente demonstrou foi que se consegue fazer isso sem um vínculo mecânico, diz Wiederhecker. "Aqui, a vantagem de usar luz é que ela leva informação do seu oscilador A para o seu oscilador B. E assim estabelece o sincronismo entre eles. Você pode usar o próprio sinal óptico para estabelecer o sincronismo, e então não está mais limitado a pequenas distâncias."