Com informações do Jornal da USP - 21/01/2022
Ligas metálicas altamente concentradas
Ao avaliar a resistência à radiação de ligas metálicas altamente concentradas - usadas na construção de reatores nucleares - uma equipe internacional liderada por pesquisadores brasileiros identificou materiais com propriedades magnéticas excepcionais.
Denominadas nanoilhas magnéticas, esses materiais contêm ferro e cobalto e, apesar de apresentarem escala nanométrica, ou seja, terem tamanho diminuto, possuem um forte ferromagnetismo.
Na verdade, essas propriedades magnéticas justamente nessas dimensões abrem o caminho para o uso futuro das nanoilhas magnéticas em dispositivos eletrônicos de armazenamento e transferência de dados, aumentando sua velocidade e desempenho.
Diferente das ligas metálicas normais, basicamente um material feito a partir da mistura de diferentes proporções de dois ou mais metais, nas ligas metálicas altamente concentradas as concentrações dos elementos são praticamente iguais. E essa composição torna as ligas altamente concentradas mais estáveis.
"Daí a conexão com a área nuclear: Ligas mais estáveis estariam diretamente relacionadas a uma possível alta resistência à irradiação, o que sugere uma possível aplicação direta na construção reatores nucleares, tanto de fissão, quanto de fusão, como materiais estruturais. Também se demonstrou que algumas dessas ligas possuem excelente resistência mecânica e alta resistência à corrosão, muitas vezes superior a outras já existentes," detalhou o físico Matheus Tunes, da Universidade de São Paulo (USP).
Fabricação das nanoilhas magnéticas
Para produzir a liga, foi usado um método de deposição física em filmes finos, para testes em escala laboratorial.
"Ela foi produzida com cinco elementos - cobalto, cromo, cobre, ferro e níquel - em quantidades similares. Após a síntese da liga, verificou-se que os átomos de cada elemento ocupavam posições aleatórias, formando uma solução sólida desordenada," contou Tunes. "Essa liga não apresentou boa resistência à irradiação, questionando a hipótese de que possui alta estabilidade. Mas, surpreendentemente, sob irradiação e recozimento a temperaturas moderadas, o ferro e o cobalto saíram da solução sólida, para formação de precipitados nanométricos com estrutura cúbica."
Foi assim que nasceram as nanoilhas magnéticas, cujo magnetismo inesperadamente forte foi atestado por uma técnica de microscopia de transmissão chamada de contraste diferencial de fase.
Embora a liga não seja estável, descartando-a para uso em reatores, a pesquisa demonstra que é possível sintetizar nanoilhas magnéticas de ferro e cobalto a partir de uma liga altamente concentrada a temperaturas relativamente baixas, de cerca de 500 ºC.
"Também descobrimos que, uma vez formadas, as nanoilhas magnéticas permanecem estáveis a altas e baixas temperaturas, indicando que o estado de equilíbrio da liga se deve à presença delas," afirmou Tunes.
Uso em áreas emergentes
As nanoilhas são compostos altamente ordenados que apresentam excelentes propriedades magnéticas, tais como alta permeabilidade, alta saturação magnética e alta coercitividade.
"Esta última propriedade é uma das mais interessantes, pois é uma medida da 'dureza magnética' do material, indicando alta habilidade para reter o campo magnético armazenado na nanoilha, após a remoção de forças externas.
"Isso sugere que essas ilhas magnéticas são materiais promissores para aplicação em áreas emergentes como a spintrônica, que estuda o spin do elétron, ou seja, sua rotação, além de seu magnetismo derivado. Através da manipulação do spin em nanoilhas magnéticas, acredita-se ser possível desenvolver no futuro novos materiais semicondutores e dispositivos de armazenamento e transferência de dados, com maior velocidade e eficiência," concluiu o pesquisador.