Redação do Site Inovação Tecnológica - 25/03/2022
Neurônios artificiais tornam-se quânticos
A computação neuromórfica, cujos componentes imitam os neurônios do cérebro, e a computação quântica, que promete deixar nossos computadores atuais comparáveis a ábacos, estão entre as tecnologias emergentes mais promissoras para revolucionar a tecnologia da informação.
Mas talvez não seja preciso escolher entre uma das duas - talvez seja possível mesclá-las.
Um grupo de físicos da Áustria e da Itália acaba de demonstrar uma versão quântica do principal componente da computação neuromórfica, o memoristor.
Em outras palavras, Michele Spagnolo e seus colegas criaram um memoristor quântico, um componente tipicamente neuromórfico construído sobre um processador quântico que funciona com fótons.
Memoristor quântico
Uma das grandes inovações deste século no campo da informática ocorreu em 2008, com a descoberta do memoristor. Esse componente muda sua resistência à passagem da eletricidade dependendo de uma memória das correntes que o percorreram no passado - daí o nome memory-resistor, ou memoristor.
Imediatamente após sua descoberta, os cientistas perceberam que (entre muitas outras aplicações) o comportamento peculiar dos memoristores era surpreendentemente semelhante ao das sinapses neurais. O memoristor tornou-se assim o bloco de construção fundamental das arquiteturas neuromórficas, ou computação cognitiva.
Spagnolo demonstrou agora como construir um componente que tem o mesmo comportamento de um memoristor, mas atua sobre estados quânticos, ou seja, ele é capaz de codificar e transmitir informações guardadas em qubits, como átomos, íons ou fótons. Essa integração é particularmente surpreendente porque a dinâmica de um memoristor eletrônico tradicional tende a contradizer o comportamento típico das partículas quânticas.
A equipe superou o desafio usando fótons individuais, ou seja, partículas quânticas únicas de luz, e explorando sua capacidade de se propagar simultaneamente em uma superposição de dois ou mais caminhos.
Elo perdido entre inteligência artificial e a computação quântica
Os fótons únicos se propagam ao longo de guias de onda traçadas a laser em uma base de vidro, sendo guiados em uma superposição de vários caminhos.
Um desses caminhos é utilizado para medir o fluxo de fótons que passam pelo componente; e a quantidade medida, através de um complexo esquema de realimentação eletrônica, modula a transmissão na outra saída, alcançando assim o comportamento memorresistivo desejado.
Além de demonstrar o memoristor quântico, os pesquisadores criaram simulações mostrando que redes neurais fotônicas montadas com esses componentes podem ser usadas para aprender tarefas clássicas e quânticas, sugerindo o fato de que o memoristor quântico pode ser o elo perdido entre inteligência artificial e a computação quântica - sem esquecer que o próprio memoristor é considerado o elo perdido da eletrônica.
"Desbloquear todo o potencial dos recursos quânticos dentro da inteligência artificial é um dos maiores desafios da pesquisa atual em física quântica e ciência da computação", disse Spagnolo.
Para caminhar nesse sentido, a equipe simulou um aprendizado de máquina por meio de um esquema de computação de reservatório, o que permitiu usar a rede neural de memoristores quânticos para resolver tarefas tanto de aprendizado clássico quanto de aprendizado quântico. "Nossas simulações mostram resultados promissores e podem abrir novos caminhos para o uso de memristores quânticos em arquiteturas neuromórficas quânticas," escreveu a equipe.