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Robótica

Materiais mecânicos guardam memória de uma sequência de eventos

Redação do Site Inovação Tecnológica - 13/02/2025

Materiais mecânicos guardam memória de uma sequência de eventos
Sim, estamos falando de materiais não vivos, mas que têm memória, aprendem e reagem ao ambiente.
[Imagem: Hang Zhang et al. - 10.1038/s41565-022-01241-x]

Neuromórfica mecânica

As rugas em um papel amassado podem ser vistas como uma memória rudimentar, pela qual o papel pode contar o que aconteceu com ele no passado.

Mas já estamos bem além disso, por exemplo com os materiais com memória de forma, que transicionam entre diferentes estados e já vêm sendo usados até mesmo como memórias em sistemas computacionais alternativos. E, mais recentemente, passamos a contar com os materiais não vivos que têm memória, aprendem e reagem ao ambiente.

E esse universo emergente de materiais inteligentes acaba de se ampliar largamente com a descoberta de que, sob condições específicas, alguns materiais violam a matemática subjacente à sua construção para armazenar memórias sobre a sequência de deformações a que eles foram submetidos no passado.

É mais ou menos uma versão mecânica do componente eletrônico memoristor, que consegue se lembrar das correntes elétricas que o atravessaram antes, o que significa que ele pode funcionar como um neurônio artificial, tornando-se o elemento fundamental da computação neuromórfica.

Não por acaso, Chloe Lindeman e seus colegas da Universidade do Estado da Pensilvânia, nos EUA, acreditam que sua descoberta de um tipo de "matéria com memória" tem potencial para inspirar novas maneiras de armazenar informações em sistemas mecânicos, desde fechaduras de combinação até a computação, de processadores mecânicos à inteligência material.

Materiais mecânicos guardam memória de uma sequência de eventos
Uma memória de ponto de retorno depende da alternância de direção da força externa, assim como uma fechadura de combinação depende do mostrador ser girado no sentido horário e anti-horário.
[Imagem: Nathan Keim/Penn State]

Memória do ponto de retorno

Uma maneira pela qual alguns materiais formam memórias é chamada de memória de ponto de retorno, que funciona de modo muito parecido com uma fechadura de combinação de discagem única - girar o mostrador no sentido horário e anti-horário em uma sequência específica produz um resultado, a abertura da trava, que depende de como o mostrador foi movido. Da mesma forma, para materiais com memória de ponto de retorno, alternar entre deformações positivas e negativas pode deixar uma memória daquela sequência, que tanto pode ser lida como apagada.

"O mesmo mecanismo ou matemática subjacente dessa formação de memória pode descrever sistemas desde a magnetização dos discos rígidos de computador até danos em rochas sólidas," detalhou o professor Nathan Keim, coordenador da equipe. "A mesma matemática também descreve memórias armazenadas em sólidos desordenados, nos quais o arranjo de partículas parece aleatório, mas na verdade contém detalhes sobre deformações passadas."

A memória do ponto de retorno depende da alternância de direção da força externa, ou "força motriz", como a alternância de campos magnéticos norte e sul ou puxar um material de um lado e depois do outro. No entanto, os materiais não devem ser capazes de formar memória do ponto de retorno quando a força ocorre apenas em uma direção. Por exemplo, uma ponte pode ceder ligeiramente quando os carros passam por cima dela, mas ela não se curva para cima quando os carros vão embora.

"Os teoremas matemáticos para memória de ponto de retorno dizem que não podemos armazenar uma sequência se tivermos apenas essa direção 'assimétrica' em um sentido," explicou Keim. "Se o mostrador da fechadura de combinação não puder passar de zero ao girar no sentido anti-horário, ele armazena apenas um número na combinação. Mas encontramos um caso especial quando esse tipo de direção assimétrica pode, de fato, codificar uma sequência."

Materiais mecânicos guardam memória de uma sequência de eventos
Exemplo de material que memoriza coisas complexas mecanicamente.
[Imagem: Chaviva Sirote-Katz et al. - 10.1038/s41467-024-47780-w]

Histerons

Os pesquisadores realizaram uma série de simulações de computador para explorar as condições sob as quais uma sequência poderia ser codificada em um material. Eles manipularam uma variedade de fatores, incluindo a magnitude e a orientação da força motriz externa, bem como a forma como ela é gerada, para ver como cada fator impacta a formação da memória e o comprimento da sequência codificada.

Para isso, os pesquisadores resumiram os componentes do sistema - como as partículas em um sólido ou os domínios microscópicos em um ímã - em elementos abstratos chamados histerons, um termo derivado do conceito de histerese, uma propriedade em que a resposta do sistema depende não apenas de sua entrada atual ou das condições externas, mas também de seu histórico ou dos seus estados passados. Na prática, há um retardo na resposta em relação a um estímulo, e os histerons são os componentes individuais explicativos dessa "demora" na reação às mudanças em seu ambiente.

"Histerons são elementos de um sistema que podem não responder imediatamente a condições externas e podem permanecer em um estado passado," detalhou o pesquisador Travis Jalowiec. "Como partes de uma fechadura de combinação refletem as posições anteriores do mostrador, e não onde o mostrador está agora. Em nosso modelo, os histerons têm dois estados possíveis e podem trabalhar com ou contra o outro, e esse modelo generalizado o torna aplicável a tantos sistemas quanto possível."

Materiais mecânicos guardam memória de uma sequência de eventos
Memória mecânica de origami abre caminho para material que computa.
[Imagem: R. Masana et al. - 10.1063/5.0010236]

Memórias mecânicas

Os histerons no modelo interagiram de forma cooperativa, onde uma mudança em um encoraja uma mudança em outro, ou de forma "frustrada", não cooperativa, onde uma mudança em um desencoraja uma mudança no outro. São os histerons frustrados que são a chave para formar e recuperar uma sequência em um sistema com direção assimétrica.

Os pesquisadores descobriram que sistemas com interações cooperativas só podem codificar uma sequência se a força motriz for simétrica - com direções alternadas. No entanto, apenas um único par de histerons frustrados foi o suficiente para produzir uma sequência codificada com força motriz assimétrica, desde que outras condições sejam atendidas.

Os pesquisadores afirmam que esses resultados podem inspirar novas maneiras de armazenar, recuperar e apagar informações em materiais e sistemas mecânicos.

"Uma propriedade fundamental dessa memória é que ela tem a garantia de armazenar tanto a maior deformação quanto a mais recente," disse Keim. "Se você puder fazer um sistema que armazene uma sequência de memórias, poderá usá-lo como uma fechadura de combinação para verificar um histórico específico, ou poderá recuperar informações de diagnóstico ou forenses sobre o passado. Há um interesse crescente em sistemas mecânicos que detectam seus ambientes, realizam cálculos e respondem ou se adaptam sem nunca usar eletricidade. Uma melhor compreensão da memória expande essas possibilidades."

Sempre existe a possibilidade de encontrar materiais naturais que já apresentem essas características, mas não é simples encontrar assinaturas da frustração em materiais reais, de modo que a equipe acredita que o melhor caminho é mesmo partir para a construção de materiais com memória mecânica.

"Mais imediatamente, achamos que esta é uma maneira de projetar sistemas artificiais com esse tipo especial de memória, começando com os sistemas mecânicos mais simples, não muito mais complicados do que um canudo flexível e, quem sabe, evoluindo para algo como uma fechadura de combinação assimétrica," disse Keim.

Bibliografia:

Artigo: Generalizing multiple memories from a single drive: The hysteron latch
Autores: Chloe W. Lindeman, Travis R. Jalowiec, Nathan C. Keim
Revista: Science Advances
Vol.: 11, 5
DOI: 10.1126/sciadv.adr5933
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