Redação do Site Inovação Tecnológica - 28/05/2020
Matéria comum perdida
Há décadas os astrônomos procuram pela "matéria perdida" do Universo - não, não se trata da matéria escura, igualmente nunca encontrada, mas da matéria normal mesmo, que deveria estar por aí mas ninguém consegue detectar.
A matéria comum, de que tudo e todos somos feitos, é conhecida como matéria bariônica, sendo formada de bárions (do grego "pesado"), conjunto de partículas que engloba os prótons e os nêutrons, que compõem a maior parte da massa da matéria - os elétrons pertencem a outro conjunto, os léptons.
"Nós sabemos pelas medições do Big Bang quanta matéria havia no começo do Universo. Mas, quando olhamos para o Universo atual, não conseguimos encontrar metade do que deveria estar lá. É um tanto embaraçoso. O espaço intergaláctico é muito esparso. A matéria que falta é equivalente a apenas um ou dois átomos em uma sala do tamanho de um escritório. Por isso, tem sido muito difícil detectar essa matéria usando técnicas e telescópios tradicionais," explica o professor Jean-Pierre Macquart, da Universidade Curtin, na Austrália.
Tudo começou a mudar com a descoberta das rajadas rápidas de rádio, flashes de energia muito breves - elas têm duração na casa dos milissegundos - que parecem vir de direções aleatórias, mas de fontes ainda desconhecidas.
Matéria perdida - Temporada 1
Há cerca de quatro anos, uma equipe lá mesmo da Austrália disse que essas rajadas permitiam detectar a matéria perdida do Universo, mas o estudo foi contestado e o assunto permaneceu controverso até hoje.
Agora, Macquart e seus colegas voltaram à carga, e afirmam ter elementos para comprovar que as rajadas rápidas de rádio podem mesmo ser usadas como "estações de pesagem" para a matéria perdida do Universo.
"A radiação das explosões rápidas de rádio se espalha pela matéria que falta, da mesma maneira que você vê as cores da luz solar sendo separadas em um prisma. Agora conseguimos medir as distâncias de um número suficiente de rajadas rápidas de rádio para determinar a densidade do Universo. Só precisamos de seis para encontrar essa matéria que faltava," disse ele.
Medindo a diferença ínfima de tempo para que cada "cor" do espectro de rádio chegue ao telescópio, torna-se possível medir a matéria que essa radiação atravessou.
"Nós descobrimos o equivalente da Lei Hubble-Lemaitre para galáxias, apenas que para as explosões rápidas de rádio," disse Macquart. "A Lei Hubble-Lemaitre, que diz que quanto mais distante uma galáxia está de nós, mais rápido ela se afasta de nós, está subjacente a todas as medidas de galáxias a distâncias cosmológicas".
Matéria encontrada?
Como agora conseguiram determinar com bastante precisão a distância da fonte de origem das rajadas rápidas de rádio, os astrônomos acreditam ter dados para confirmar que a matéria perdida está realmente lá, e pode ser medida.
"Mais de três quartos do conteúdo bariônico do Universo reside em um estado altamente difuso, difícil de detectar, com apenas uma pequena fração observada diretamente nas galáxias e aglomerados de galáxias. Os censos do Universo próximo usaram a espectroscopia de linha de absorção para observar os bárions 'invisíveis', mas essas medições dependem de correções grandes e incertas e são insensíveis à maior parte do volume do Universo e provavelmente à maior parte de sua massa.
"Aqui relatamos uma medição do conteúdo de bárions do Universo usando a dispersão de uma amostra de rajadas rápidas de rádio localizadas; essa técnica determina a densidade da coluna de elétrons ao longo de cada linha de visão e detecta todos os bárions ionizados," escreveu a equipe.
Agora é esperar que outros astrônomos verifiquem os dados a partir de outros observatórios, para ver se, desta vez, é seguro dizer que detectamos a matéria perdida do Universo.