Redação do Site Inovação Tecnológica - 17/06/2022
Ondas de matéria
A mecânica quântica nos diz que os átomos devem ser pensados como partículas ou como ondas.
Ora, decorre daí que deve ser possível construir lasers atômicos - sim, um raio laser de matéria - contendo ondas coerentes de matéria, assim como um laser de luz é formado por ondas coerentes formadas por fótons.
De fato, físicos já demonstraram que átomos podem ser focalizados, como se fossem ondas de luz, e pulsos de laser de matéria têm sido gerados a partir de condensados de Bose-Einstein há muito tempo - mas só um pulso, sem sequência.
Chun-Chia Chen e seus colegas da Universidade de Amsterdã, nos Países Baixos, queriam ir além, fazendo com que essas ondas de matéria durassem tempo suficiente para que pudessem ser usadas em aplicações práticas.
O resultado foi melhor do que o esperado.
Laser de matéria
Os lasers de luz estão por toda parte porque os fótons, as partículas de luz, podem ser facilmente colocadas no mesmo estado ao mesmo tempo: Eles "condensam", formando uma onda coerente - uma onda coerente é aquela na qual todos os fótons têm a mesma frequência, a mesma forma de onda e a mesma direção de propagação.
Dá para fazer isso com os átomos também, mas é bem mais difícil. Primeiro é necessário combinar as partículas de matéria, que são férmions (elétrons e quarks, por exemplo), para que elas formem bósons (a família dos fótons) - na verdade, átomos inteiros podem se comportar como partículas de luz.
Quando esse bósons cuidadosamente criados passam por aquele mesmo tipo de condensação dos fótons que formam um laser, ou seja, quando a condensação acontece para partículas de matéria, forma-se algo conhecido como condensado de Bose-Einstein (CBE), uma substância delicada que só se mantém isolada do ambiente e a alguns miligraus acima do zero absoluto.
Aí, é só disparar um pulso desse condensado que você terá um laser de matéria - ou, pelo menos, um pulso dele.
O problema é que a menor variação de temperatura faz o condensado de Bose-Einstein se "descondensar", e tudo vai por água abaixo: Para emitir um segundo pulso de laser atômico você precisa começar tudo de novo, resfriando e estabilizando o condensado, para depois emitir outro pulso.
Os lasers de luz também nasceram assim - eles eram apenas pulsados no início -, mas progrediram rapidamente, o que não tem acontecido com os lasers de matéria.
Condensado de Bose-Einstein contínuo
Agora, Chen finalmente conseguiu criar um condensado de Bose-Einstein contínuo - e contínuo mesmo, tanto que a equipe se refere a ele como algo "que funciona para sempre".
"Nos experimentos anteriores, o resfriamento gradual dos átomos era todo feito em um só lugar. Em nossa configuração, nós decidimos distribuir as etapas de resfriamento não no tempo, mas no espaço: Fazemos os átomos se moverem enquanto eles avançam por etapas consecutivas de resfriamento. No final, átomos ultrafrios chegam ao centro do experimento, onde podem ser usados para formar ondas de matéria coerentes em um CBE. Mas, enquanto esses átomos estão sendo usados, novos átomos já estão a caminho para reabastecer o CBE. Desta forma, podemos manter o processo em andamento - essencialmente para sempre," detalhou o professor Florian Schreck.
Tendo solucionado o problema de longa data de criar um condensado de Bose-Einstein contínuo, os pesquisadores agora se concentrarão no próximo objetivo: Usar um laser comum de luz como gatilho para disparar um feixe de saída estável de matéria.
Tão logo esses lasers atômicos possam não apenas operar para sempre, mas também produzir feixes estáveis, nada mais estará no caminho das aplicações práticas, e os lasers de matéria poderão começar a desempenhar um papel tão importante na tecnologia quanto os lasers comuns atualmente.
Este resultado coroa vários anos de trabalho da equipe, que deu os primeiros passos rumo a um laser de matéria implementando esse resfriamento sequencial etapa por etapa.