Com informações da Agência Fapesp - 27/06/2018
Hemateno
Após o isolamento do grafeno, em 2004, iniciou-se uma corrida para se conseguir sintetizar novos materiais bidimensionais - como são chamados materiais com espessura de um átomo até alguns poucos nanômetros. Esses materiais possuem propriedades únicas ligadas às suas dimensões, prometendo protagonizar o desenvolvimento da nanotecnologia e da nanoengenharia.
Agora, um grupo internacional com participação de pesquisadores da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) conseguiu sintetizar um novo material da família dos "enos": o hemateno.
O hemateno, que tem três átomos de espessura e propriedades fotocatalíticas incomuns, foi exfoliado da hematita, um minério de ferro largamente explorado no Brasil.
"O material que sintetizamos pode atuar como fotocatalisador - para dividir a água em hidrogênio e oxigênio - e permitir a geração de energia elétrica a partir de hidrogênio, por exemplo, além de ter diversas outras aplicações," disse Douglas Soares Galvão, membro da equipe.
Material não van der Waals
Ao contrário do carbono e de sua forma bidimensional (grafeno), a hematita é um "material não van der Waals", como se chamam aqueles mantidos unidos por redes de ligações tridimensionais, em vez de interações atômicas não covalentes - em que não há compartilhamento de um ou mais pares de elétrons entre os átomos participantes na ligação - e, comparativamente, mais fracas do que as dos materiais van der Waals.
Por ser um mineral que ocorre naturalmente, ser um material não van der Waals e ter cristais grandes e altamente orientados, os pesquisadores levantaram a hipótese de que a hematita poderia atuar como um excelente precursor para obtenção de um novo material bidimensional não van der Waals.
"A maioria dos materiais bidimensionais sintetizados até hoje foi derivada de amostras de sólidos de van der Waals. Materiais bidimensionais não van der Waals, com camadas atômicas altamente ordenadas e grãos grandes, ainda são raros," disse Galvão.
Com experimentos e simulações, a equipe demonstrou que as propriedades magnéticas do hemateno diferem daquelas da hematita. Enquanto a hematita é tipicamente antiferromagnética - seus dipolos magnéticos estão dispostos antiparalelamente -, o hemateno é ferromagnético, como um ímã comum.
Fotocatalisador
Os pesquisadores também avaliaram as propriedades fotocatalíticas - de aumentar a velocidade de uma reação induzida por luz pela ação de um catalisador - do hemateno. A fotocatálise do hemateno é mais eficiente do que a da hematita, que já era conhecida por ter propriedades fotocatalíticas, mas não suficientemente elevadas para serem exploradas em aplicações práticas.
Para um material ser um eficiente fotocatalisador, ele deve absorver a parte visível da luz solar, por exemplo, gerar cargas elétricas e transportá-las à superfície do material de modo a realizar a reação desejada.
A hematita absorve a luz do sol da região ultravioleta à amarelo-alaranjada, mas as cargas produzidas são de vida muito curta. Como resultado, elas se extinguem antes de chegar à superfície.
Já a fotocatálise do hemateno é mais eficiente, uma vez que os fótons geram cargas negativas e positivas dentro de poucos átomos da superfície. E, ao emparelhar o novo material com matrizes de nanotubos de dióxido de titânio - que fornecem um caminho fácil para os elétrons deixarem o hemateno -, a equipe constatou que eles permitem que mais luz visível seja absorvida.
"O hemateno pode ser um eficiente fotocatalisador, especialmente para dividir a água em hidrogênio e oxigênio, mas também pode servir como um material magnético ultrafino para dispositivos baseados em spintrônica [ou magnetoeletrônica]," acrescentou Galvão.