Redação do Site Inovação Tecnológica - 26/01/2023
Gravidade artificial
Pesquisadores conseguiram reproduzir efetivamente a força da gravidade gerada por estrelas e planetas - ou perto delas - dentro de uma esfera de vidro superquente.
Isso permitirá a realização de experimentos que não podem ser feitos facilmente na superfície da Terra e que são muito difíceis de simular em computadores - hoje, esses experimentos são enviados para o espaço, um processo caro e demorado.
Além de permitir o estudo experimental de questões astrofísicas, a nova técnica permitirá estudar como o clima espacial afeta as comunicações e o funcionamento dos satélites artificiais, o que é muito difícil de fazer hoje porque os experimentos de laboratório aqui na Terra são afetados pela gravidade de maneiras bem diferentes das condições no espaço.
Imitação da gravidade
A possibilidade de criar esse simulador de gravidade inédito surgiu em 2017, depois que Gilles Courret e colegas da Universidade de Ciências Aplicadas e Artes da Suíça Ocidental descobriram um fenômeno incrível dentro de lâmpadas de alta potência (1 kW). Courret observou que o plasma gerado por essas lâmpadas de enxofre de alta potência forma uma esfera que permanece no centro do bulbo apesar da gravidade, protegendo assim o vidro do derretimento. Uma primeira análise mostrou que esse fenômeno resulta de uma ressonância acústica em modo esférico.
Agora, John Koulakis e colegas da Universidade da Califórnia de Los Angeles foram além na análise do fenômeno, revelando que ele pode ser explicado pela força de radiação acústica, a mesma que vem sendo explorada pelos aparatos de levitação acústica, nos quais ondas sonoras refletidas por um objeto são suficientes para fazê-lo levitar no ar, vencendo a força da gravidade.
Mais interessante ainda, Koulakis e seus colegas mostraram que, nas lâmpadas, essa força acústica atua não na superfície do objeto onde o som se reflete, mas ao longo do gás, criando um gradiente onde as variações de densidade redirecionam as ondas sonoras.
Eles então tiraram proveito dessa força presente nesse "gradiente livre" - sem qualquer interface entre o sólido e o gás - para criar seu simulador de gravidade.
Gravidade acústica
Em vez de uma lâmpada, a equipe criou seu gerador de gravidade artificial - que eles chamam de gravidade acústica - dentro de uma esfera oca de 3 centímetros de diâmetro.
Para isso, eles usaram ondas sonoras para gerar convecção no plasma - um processo no qual o gás esfria quando se aproxima da superfície de um corpo e depois reaquece e sobe novamente quando se aproxima do núcleo - criando uma corrente fluida que, por sua vez, gera uma corrente magnética.
Um feixe de micro-ondas aquece o gás de enxofre dentro da esfera de vidro a 4.000 ºC. As ondas sonoras dentro funcionam como a gravidade, restringindo o movimento do gás quente e fracamente ionizado - o plasma - em padrões que se assemelham às correntes de plasma nas estrelas.
O resultado é um autêntico campo gravitacional esférico que permite estudar em detalhes a convecção que ocorre em estrelas e planetas. "Com o uso de som gerado por micro-ondas em um frasco esférico de plasma quente, conseguimos um campo de gravidade mil vezes mais forte que a gravidade da Terra," contou Koulakis.
"As pessoas estavam tão interessadas em tentar modelar a convecção esférica com experimentos de laboratório que na verdade já colocaram um experimento no ônibus espacial porque não conseguiam obter um campo de força central forte o suficiente no solo," ilustrou o professor Seth Putterman, coordenador da equipe. "O que mostramos é que nosso sistema de som gerado por micro-ondas produziu uma gravidade tão forte que a gravidade da Terra não era um fator. Não precisamos mais ir ao espaço para fazer esses experimentos."
Experimentos astrofísicos
Outro detalhe interessante é que o gás quente e brilhante perto da metade externa da esfera move-se para fora em direção às paredes da esfera. E a forte gravidade sustentada gerou uma turbulência que se assemelha à que é vista perto da superfície do Sol.
Na metade interna da esfera, a gravidade acústica mudou de direção, apontando para fora, o que faz com que o gás quente afunde no centro. No experimento, a gravidade acústica manteve naturalmente o plasma mais quente no centro da esfera, o que também ocorre nas estrelas e em planetas gigantes gasosos.
A capacidade de controlar e manipular o plasma de maneira a espelhar a convecção estelar e planetária ajudará também a entender e prever como o clima solar afeta os sistemas de comunicação por satélite e as espaçonaves.
O objetivo da equipe agora é ampliar a escala do experimento, criando um gerador de gravidade acústica que possa ser usado para os tão esperados experimentos astrofísicos.