Com informações da Agência Fapesp - 30/10/2018
Deslocamento atômico
As folhas de materiais bidimensionais, como o grafeno, não são interessantes apenas isoladamente: Colocar uma sobre a outra e deslocá-las ligeiramente pode fazer maravilhas.
Foi o que demonstrou recentemente uma equipe norte-americana, que ajudou a inaugurar uma nova área de pesquisas "além da eletrônica", a chamada flexotrônica.
Agora, a física brasileira Aline Ramires e o espanhol Jose Lado, do Instituto Federal de Tecnologia de Zurique, na Suíça, descobriram outro fenômeno interessante e com grande potencial tecnológico.
Quando uma de duas folhas de grafeno sobrepostas é girada minimamente, menos de 1 grau, de modo que os alvéolos das duas redes de carbono deixem de coincidir inteiramente, um campo elétrico produz um efeito idêntico ao da aplicação de um campo magnético extremamente intenso em duas folhas de grafeno alinhadas.
"Essa identificação [...] possibilita que as propriedades eletrônicas do grafeno sejam controladas por meio de campos elétricos, gerando campos magnéticos artificiais, porém efetivos, com magnitudes muito maiores do que a dos campos magnéticos reais que podem ser aplicados," disse Aline.
Segundo ela, isso é possível quando as duas folhas de grafeno estão ligeiramente desalinhadas e suficientemente próximas, permitindo que os orbitais eletrônicos de uma interajam com os orbitais eletrônicos da outra.
Campos magnéticos artificiais
Embora o trabalho ainda esteja no nível teórico (analítico e numérico), ele tem um evidente potencial tecnológico, por mostrar que um material versátil como o grafeno pode ser manipulado de modo a apresentar regimes até agora inexplorados.
"Propostas anteriores de campos magnéticos artificiais eram baseadas na aplicação de forças para deformar o material. Nossa proposta permite controlar com muito mais precisão a geração desses campos. E isso poderá, eventualmente, ter aplicações práticas," reforçou Aline.
Esses estados exóticos da matéria, induzidos por campos magnéticos artificiais, estão associados ao aparecimento de "pseudoníveis de Landau" nas folhas de grafeno.
Os níveis de Landau - em homenagem ao físico e matemático soviético Lev Landau (1908-1968), Nobel de Física em 1962 - são um fenômeno quântico que faz com que, na presença de um campo magnético, as partículas eletricamente carregadas só possam ocupar órbitas com valores discretos de energia. O número de elétrons por nível é diretamente proporcional à magnitude do campo magnético aplicado.
"Esses estados são bem localizados no espaço e, quando as partículas interagem nesses níveis, as interações são muito mais intensas do que o comum. A formação de 'pseudoníveis de Landau' explica por que os campos magnéticos artificiais fazem surgir no material propriedades exóticas como supercondutividade ou líquido de spin," disse Aline.
Agora é só esperar que os experimentalistas testem o processo na prática, o que deverá ser facilitado porque já existem equipamentos para mudar o alinhamento rotacional dos materiais monoatômicos.