Com informações da Agência Brasil - 10/08/2017
Inesperado
O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações iniciou por conta própria uma consulta pública que pode gerar alterações no Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), especialmente em relação às atribuições e à composição dessa instância.
Criado em 1995 e fortalecido com a regulamentação do Marco Civil da Internet, em 2016, o CGI é responsável pelo estabelecimento das diretrizes do setor, bem como pela promoção de estudos e padrões técnicos para segurança e serviços de Internet; recomendação de procedimentos e padrões técnicos e promoção de programas de pesquisa e desenvolvimento.
O governo federal afirma que pretende atualizar o Decreto 4.829, de 3 de setembro de 2003, que "estabelece a estrutura para a governança da internet no Brasil, a fim de promover seu fortalecimento para apoio às transformações geradas pela era digital". A consulta pública está organizada em quatro eixos: competências; transparência; composição e eleições e mandatos. No eixo competências, questiona-se se é preciso atualizá-las e quais formas podem ser adotadas para concatenar esforços entre estratégias e atividades operacionais. No da transparência, poderão ser propostas medidas sobre o acompanhamento público e a publicidade conferida às decisões do comitê, a exemplo do estabelecimento de audiências e de outras formas da participação social.
Sem qualquer discussão prévia, a consulta está prevista para durar apenas 30 dias, terminando em 8 de Setembro próximo.
Consulta unilateral
A consulta sobre alteração do Comitê Gestor da Internet foi recebida com críticas por membros do CGI.
"Ninguém está resistindo à revisão, mas ao fato de o governo construir unilateralmente uma proposta, sem que passasse pelo próprio CGI, e a apresente em uma consulta pública que durará apenas 30 dias, sem discussão alguma," disse Flávia Lefèvre, conselheira e integrante da associação de consumidores Proteste no CGI.br.
Segundo ela, apenas no dia do anúncio e início da contagem do prazo da consulta pública é que os conselheiros foram comunicados do interesse do ministério em promover a revisão, que deveria ser objeto de discussão na próxima reunião do órgão, prevista para o dia 18 deste mês.
Na visão da conselheira, esse método fere o Marco Civil da Internet, segundo o qual a governança da internet deve ser multissetorial. "Se você tem uma consulta pública de alteração da estrutura de governança da internet apresentada pela secretaria cujo secretário é coordenador do CGI, por que isso não foi discutido no CGI?", questionou.
A maior preocupação é com a ampliação da participação empresarial no órgão. O comitê tem frequentemente firmado posição em defesa da neutralidade da rede e defendido a necessidade de os usuários darem consentimento para que seus dados sejam utilizados, por exemplo, para fins mercadológicos. Mas isso pode mudar com uma composição mais focada apenas no lado empresarial.
"A gente não pode esquecer que, em 2009, o CGI editou resolução com os princípios de governança da internet e que se manifestou, a partir deles, no processo de regulamentação do Marco Civil. Com a configuração que o CGI tem hoje, certamente esses princípios serão mantidos em outras discussões," afirma Flávia, citando como exemplo o desenvolvimento comercial da chamada internet das coisas.
Ainda segundo Flávia, pressões para alteração da composição do CGI.br e inclusão de provedores e outros agentes já foram citadas nas reuniões do órgão e registradas em atas que estão disponíveis no site do comitê.
Repúdio
Já a Coalizão Direitos na Rede emitiu nota informando que pedirá a revogação da consulta.
Além de repudiar a falta de diálogo, o grupo, formado por pesquisadores, acadêmicos, profissionais ligados ao setor e organizações que defendem a internet como direito, manifestou preocupação com a possibilidade de aumento da participação do segmento empresarial no CGI.
"A pressão para rever a força da sociedade civil no Comitê cresceu, principalmente por parte das operadoras de telecomunicações, apoiadoras do governo," diz o texto, que alerta sobre o processo de enfraquecimento do comitê, que teve suas atividades paralisadas no primeiro semestre deste ano em função de cortes de recursos.
Além da consulta sobre a governança da Internet, o Ministério da Ciência e Tecnologia também está recebendo contribuições, até o fim deste mês, para a elaboração da Estratégia Brasileira para a Transformação Digital, que tem como objetivo a ampliação da digitalização da economia.