Com informações da Agência Brasil - 07/12/2012
Tiro no pé
O aumento da produtividade nos países desenvolvidos não teve impacto positivo sobre os salários dos trabalhadores, segundo o Relatório Mundial sobre Salários da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Os ganhos de produtividade - proporcionados por avanços tecnológicos, por exemplo -, não foram repassados aos trabalhadores dos países desenvolvidos, o que significa que a mão-de-obra não se beneficiou com o desenvolvimento econômico.
Quando os ganhos não são repassados aos trabalhadores - ou às famílias, como os economistas chamam - a capacidade de gasto dessas famílias diminui, criando uma espécie de "atrito" no mercado que diminui o ritmo de crescimento futuro da economia.
Nesse sentido, a ânsia de lucros dos empresários, através do não repasse dos ganhos de produtividade aos trabalhadores, acaba minando a própria geração de lucro futuro para esses empresários porque os trabalhadores consumirão menos, reduzindo o crescimento da economia.
"Essa é uma tendência indesejada que, onde exista, é preciso ser revertida. Em nível social e político, sua interpretação mais clara é que os trabalhadores e suas famílias não estão recebendo o que merecem", disse o diretor-geral da OIT, Guy Ryder.
Produtividade do trabalho
A OIT enfatizou que esses países devem ter cuidado para não promover o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) em detrimento dos salários e do bem-estar do trabalhador.
De acordo com o professor de economia da Universidade de Brasília (UnB) José Luís Oureiro, a produtividade do trabalho à qual a OIT se refere diz respeito à razão entre a produção de uma pessoa e as horas trabalhadas. Quanto maior a quantidade produzida por número de horas maior será a produtividade.
Nas economias desenvolvidas, a produtividade do trabalho aumentou mais do que o dobro dos salários desde 1999. Nos Estados Unidos, por exemplo, enquanto a produtividade aumentou 85% no período, os salários só cresceram cerca de 35%.
Na China, apesar de os salários terem quase triplicado, os ganhos do trabalhador foram proporcionalmente menores devido ao forte crescimento do PIB, em ritmo mais acelerado do que os aumentos salariais.
Assunto antigo
Para José Luís Oureiro, essa situação se encaixa na tese do "exército industrial de reserva" do hoje quase esquecido economista Karl Marx, em que a quantidade de trabalhadores disponíveis é maior do que a demanda do mercado, o que faz com que o preço da mão-de-obra, o salário, seja mais baixo devido ao excesso de oferta.
Isso causa perdas aos trabalhadores, principalmente em relação ao poder de barganha perante o empregador, que pode contratar outro funcionário mais facilmente. Daí o trabalhador, nos países desenvolvidos, não conseguir aumentos de salários no período pós-crise.
Esse capital que não vai para os trabalhadores fica retido nas mãos do empresariado em forma de lucro, que pode ser usado de forma negativa ou positiva. "Se eles estão fazendo novos investimentos, é melhor para a economia. Se estão usando para financiar gastos e consumo, é maléfico e aumenta a desigualdade de renda", explicou o professor da UnB.
Valor do trabalho por país
Apesar da disparidade entre o crescimento dos salários e a produtividade nos países desenvolvidos - e da situação contrária nos países em desenvolvimento -, ainda há significativas diferenças de salários entre grupos de nações.
Segundo comparação feita pela OIT entre os proventos de um trabalhador no setor industrial em 2010, a Dinamarca é o país onde há o salário mais alto por hora trabalhada, cerca de US$ 34,7; seguido da Suíça (US$ 34,2) e da Austrália (US$ 28,5). Em último lugar ficaram as Filipinas (US$ 1,4), a Hungria (US$ 4,7) e a Polônia (US$4,8). Em seguida aparece o Brasil, que paga cerca de US$ 5,4 por hora trabalhada.
De acordo com o economista, esse fenômeno entre produtividade e salários é temporário entre os países desenvolvidos, cuja situação deverá voltar ao normal assim que os efeitos da crise internacional forem totalmente debelados.
Relação entre salários e produtividade
Um dos autores do relatório da OIT, Sangheon Lee, explicou que os países têm de estabelecer uma relação mais estreita entre salários e produtividade, que é uma questão de equidade e crescimento econômico sustentável.
Para superar o desafio da descoordenação entre produtividade e salários, a OIT sugere a adoção de políticas coordenadas para estimular a demanda da população, manter a competitividade por meio da inovação, fortalecer as instituições, regular o mercado financeiro, e intensificar a segurança social.
"Os governos têm de tomar medidas que atuem no sentido de diminuir a taxa de desemprego. Essa austeridade adotada na Europa, hoje, por exemplo, acaba agravando situação de desemprego e, por isso, reforça a tendência dos salários a caírem", informou o professor da UnB.
Salários no Brasil
No caso específico do Brasil, os salários no Brasil cresceram no ano passado mais do que o dobro da média mundial, com um aumento médio real (descontada a inflação) de 2,7% em 2011.
Em termos globais, o crescimento dos salários foi de apenas 1,2%, um número que despenca para 0,2% se a China for retirada do cálculo.
Em 2010, os salários reais no Brasil - que registraram aumento de 3,8% - já haviam crescido bem mais do que a média mundial, de 2,1%.
Segundo a OIT, os salários globais têm aumentado nos últimos quatro anos (no período de 2008 a 2011) a um ritmo bastante inferior ao registrado antes da crise iniciada em 2008.