Redação do Site Inovação Tecnológica - 25/10/2022
Física fantasmagórica
Não é segredo para ninguém que Albert Einstein não gostava da mecânica quântica, para cujos efeitos um tanto bizarros ele usava termos como "fantasmagórico", "sinistro" e etc.
Um desses fenômenos é o entrelaçamento quântico, um estranho efeito pelo qual duas partículas passam a influenciar-se mutuamente qualquer que seja a distância que as separe - era essa comunicação instantânea que Einstein chamava de "ação fantasmagórica à distância".
Outro aspecto um tanto assustador da mecânica quântica é a chamada deslocalização, ou não-localidade, o fato de que uma única partícula pode estar em mais de um lugar ao mesmo tempo.
Quem tinha razão? Bem, o entrelaçamento quântico está no cerne dos computadores, simuladores e sensores quânticos, e até ganhou o Nobel de Física deste ano. E a deslocalização está na base de fenômenos como o teletransporte quântico, cada vez mais promissor para a computação quântica.
Interferômetro de onda-matéria
E tudo agora ficou um pouco mais, digamos, bizarro: Físicos conseguiram pela primeira vez juntar as duas coisas, fazendo o entrelaçamento de átomos deslocalizados.
Em outras palavras, não é possível saber onde nenhum dos dois átomos está, mas, quando você descobrir a posição de um e mexer com ele, isso resultará imediatamente em uma alteração no outro.
Ao fazer isso, os pesquisadores criaram um interferômetro de onda-matéria - a matéria vista como onda, e não como partícula - que consegue detectar acelerações com uma precisão que, pela primeira vez, ultrapassou o limite quântico padrão - o "limite" na precisão de uma medição quântica experimental.
Tirando proveito dessa esquisitice quântica em dobro, os futuros sensores quânticos poderão fornecer uma navegação mais precisa, determinar com mais precisão as constantes fundamentais - como a estrutura fina e a constante gravitacional -, procurar com mais precisão pela matéria escura e até facilitar a busca por recursos naturais.
Entrelaçamento e deslocalização
Para entrelaçar - ou emaranhar - dois objetos, normalmente é preciso colocá-los muito próximos um do outro, para que eles possam interagir. A equipe desenvolveu aparatos muito precisos para entrelaçar de milhares a milhões de átomos, mesmo quando eles estão a vários milímetros de distância. Eles fazem isso usando a luz refletida entre espelhos, uma estrutura chamada cavidade óptica, para permitir que a informação salte entre os átomos e os "una" em um estado entrelaçado.
Enquanto isso, um dos sensores quânticos mais precisos disponíveis hoje é o interferômetro onda-matéria - ou interferômetro de onda de matéria. A ideia consiste em usar pulsos de luz para fazer com que os átomos atinjam um estado de superposição, no qual eles se movem e não se movem simultaneamente, o que é feito fazendo com que eles absorvam e não absorvam a luz do laser ao mesmo tempo. Isso faz com que os átomos ao longo do tempo estejam simultaneamente em dois lugares diferentes ao mesmo tempo.
"Nós disparamos o raio laser nos átomos de modo que, de fato, nós dividimos o pacote de onda quântica de cada átomo em dois; em outras palavras, a partícula realmente existe em dois espaços separados ao mesmo tempo," disse Chengyi Luo, da Universidade do Colorado, nos EUA. A seguir, novos pulsos de luz revertem o processo, trazendo os pacotes de ondas quânticas de volta, para que quaisquer mudanças no ambiente, como acelerações ou rotações, possam ser detectadas por uma quantidade mensurável de interferência acontecendo nas duas partes do pacote de ondas atômicas, assim como é feito com campos de luz nos interferômetros normais - a diferença é que, no interferômetro de onda de matéria, estamos lidando com "átomos-onda", ondas feitas de matéria, ou ondas de'Broglie.
Descobrir novas esquisitices
O que a equipe conseguiu agora foi juntar as duas coisas, gerando a deslocalização dentro de uma cavidade óptica, aquela usada para entrelaçar os átomos.
Ao aprender a operar um interferômetro de onda de matéria dentro de uma cavidade óptica, a equipe conseguiu tirar proveito das interações luz-matéria para criar um entrelaçamento entre os diferentes átomos, e com isso fazer uma medição mais silenciosa - com menos ruído - e mais precisa da aceleração devido à gravidade.
O experimento consistiu em medir até que ponto os átomos caíam ao longo da cavidade devido à gravidade, uma versão quântica do experimento gravitacional de Galileu, que soltou objetos da torre inclinada de Pisa, mas com todos os benefícios de precisão e exatidão que vêm com a mecânica quântica.
"Eu acredito que um dia seremos capazes de introduzir entrelaçamento em interferômetros de onda de matéria para detectar ondas gravitacionais no espaço, ou para pesquisas de matéria escura - coisas que sondam a física fundamental, bem como dispositivos que possam ser usados para aplicações cotidianas, como navegação ou geodésia," disse o professor James Thompson, membro da equipe.
"Ao aprender a aproveitar e controlar todas as coisas fantasmagóricas que já conhecemos, talvez possamos descobrir novas coisas fantasmagóricas sobre o Universo, sobre as quais ainda nem pensamos," concluiu ele.