Redação do Site Inovação Tecnológica - 20/12/2021
Fronteira entre quântico e clássico
Físicos deram um passo enorme para capturar um único quantum de vibração, o menor elemento que forma o som, por exemplo, ou o calor.
O grande interesse é que essas partículas, chamadas fônons, são ondas de grandes comprimentos; e, sendo maiores, elas permitem estudar a tão procurada fronteira entre os mundos clássico e quântico, ou seja, o ponto a partir do qual as coisas deixam de se comportar como em nosso mundo cotidiano, ou clássico, e passam a obedecer às contraintuitivas leis da mecânica quântica.
Hoje, os físicos já conseguem pode gerar e controlar estados quânticos em uma ampla variedade de sistemas físicos, das partículas individuais de luz até moléculas complexas, formadas por milhares de átomos. É este controle que está permitindo o desenvolvimento de tecnologias quânticas poderosas, como a a computação, as comunicações e a criptografia quânticas, mas também novas fontes de luz, microscópios mais poderosos e uma infinidade de outras.
A expectativa é que, ao conseguir lidar com fônons individuais, abram-se novas janelas de pesquisas e de oportunidades para compreender e controlar fenômenos em escalas muito maiores.
Este é o resultado que acaba de ser apresentado por uma equipe das universidades de Oxford (Reino Unido) e Nacional Australiana, e dos institutos Niels Bohr e Max Planck (Alemanha).
Experimento
Georg Enzian e seus colegas implementaram uma técnica que explora as correlações entre fótons e fônons colocados para interagir dentro de um ressonador. Para isso, uma luz laser é injetada em um microrressonador, um dispositivo que permite armazenar a luz fazendo-a ficar dando voltas em torno de um pequeno anel ou prato.
Curiosamente, um microrressonador é baseado no efeito das galerias sussurrantes, que nasceram como um fenômeno acústico, mas que hoje são largamente aplicadas à luz. Conforme a luz circula no prato, ela induz vibrações, ou seja, os fótons da luz induzem fônons, que são unidades fundamentais do som. Ainda não temos como detectar unidades fundamentais do som - o experimento faz parte das tentativas nesse sentido - mas já podemos detectar facilmente um único fóton.
Ocorre que, ao circularem no disco do ressonador, os dois tipos de ondas - de luz e sonoras - se acoplam por meio de uma interação eletromagnética, energizando os fótons, ou seja, fazendo a luz brilhar em uma frequência mais elevada - uma nova cor.
Então, para lidar com um fônon individual, a equipe detecta um único fóton que sofreu essa chamada conversão ascendente, ou seja, que mudou de frequência em relação ao laser original. "A detecção de um único fóton nos dá um sinal definitivo para o evento de que subtraímos um único fônon," disse Enzian.
Subtração leva à multiplicação
Ainda não é a captura de um fônon individual, mas sua subtração já permite alguns estudos sobre a influência desse elusivo quantum de som.
E seus efeitos foram bem mais surpreendentes do que se poderia esperar.
Quando o experimento é realizado em uma temperatura estável, o campo sonoro apresenta flutuações aleatórias de ruído térmico. Assim, em qualquer tempo, o número exato de quanta de som presente é desconhecido, mas, em média, haverá inicialmente n fônons.
O que acontece agora quando você adiciona ou subtrai um único fônon? À primeira vista, você pode esperar que isso simplesmente mudasse a média para n + 1 ou n - 1, respectivamente; no entanto, o resultado real desafia essa intuição: Na verdade, de forma bastante contra-intuitiva, quando você subtrai um único fônon, o número médio de fônons na verdade sobe para 2n.
Este resultado surpreendente, onde o número médio de quanta duplica, já havia sido observado para experimentos de subtração de fótons totalmente ópticos, mas agora ele foi observado pela primeira vez fora do domínio da óptica.
Quantum de som
Em resumo, a equipe chegou o mais perto até agora de isolar um quantum de som, a unidade mais fundamental de vibração.
E, como as vibrações envolvem aparatos em escala humana, o experimento aponta para a possibilidade de criar estados quânticos não apenas macroscópicos, mas na forma de uma série contínua de dimensões, permitindo testar os limites da mecânica quântica - sem falar nas inúmeras possibilidades de aplicações práticas.
"A geração de estados quânticos não-gaussianos é importante para a pesquisa em informações quânticas e sobre os fundamentos da física e, ainda mais entusiasmante, esta pesquisa nos aproxima de gerar esses estados em uma escala macroscópica usando campos sonoros," reforçou Enzian.
RAM quântica
Foi apenas a primeira observação desse estado inusitado, mas a equipe já está pensando longe quando fala de sua exploração prática.
"Trabalhos futuros usando essa abordagem oferecem uma rota prática para armazenar e recuperar informações quânticas de forma coerente. Ou seja, fazer uma RAM quântica para um computador quântico. Além disso, esse tipo de pesquisa pode lançar uma luz muito necessária sobre os diferentes mecanismos que fazem com que os frágeis fenômenos quânticos decaiam e se tornem clássicos," disse o professor Michael Vanner, orientador da equipe.