Redação do Site Inovação Tecnológica - 02/11/2022
Ferrugem extrema
O ferro e demais metais oxidam, ou enferrujam, no contato com a água e o ar na superfície da Terra. Mas o que acontece quando eles se encontram nas condições extremas das profundezas do interior do planeta?
Isso é importante porque se acredita que o núcleo da Terra seja feito basicamente de ferro e níquel, e não dá para imaginar ambos os metais oxidados e se esfacelando como na superfície.
Antes de descobrir o que acontece por lá, é preciso acrescentar um outro ingrediente importante: O núcleo é o maior depósito de carbono na Terra - cerca de 90% do carbono está enterrado lá.
Finalmente, os cientistas acreditam que a crosta oceânica, que fica no topo das placas tectônicas e é rica em minerais hidratados, mergulha rumo ao interior do planeta por subducção, podendo descer até o limite do manto central, levando consigo seus componentes ricos em água.
A temperatura na fronteira núcleo-manto é pelo menos duas vezes mais quente do que a lava, alta o suficiente para que a água possa ser liberada dos minerais hidratados. Portanto, é ao menos teoricamente possível que, nessas profundezas, possa ocorrer alguma reação química semelhante aos metais se enferrujando.
Fábrica de diamantes
Para descobrir como isso se dá, Byeongkwan Ko e colegas do Laboratório Nacional Argônio (ANL) e da Universidade Estadual da Flórida recriaram as temperaturas e pressões extremas do interior da Terra usando a Fonte Avançada de Fótons do ANL, um acelerador de partículas que produz um feixe de elétrons de alta energia, próximos à velocidade da luz (relativísticos).
E, quando acrescentaram os três ingredientes a serem analisados - ferro, carbono e água - o experimento levou a uma descoberta inesperada.
A água e o ferro reagem como na superfície, produzindo óxidos e hidróxidos de ferro. No entanto, quando isso ocorre na fronteira onde o núcleo externo encontra o manto inferior, o carbono sai da liga de ferro, que está em estado líquido, e forma... diamantes.
E, como não é um processo localizado, pode haver uma verdadeira camada de diamante na fronteira núcleo-manto.
"Nas pressões esperadas para a fronteira núcleo-manto da Terra, a liga de hidrogênio com o ferro metálico líquido parece reduzir a solubilidade de outros elementos leves no núcleo," explicou o professor Sang-Heon Shim, coordenador da equipe. "Desta forma, a solubilidade do carbono, que provavelmente existe no núcleo da Terra, diminui localmente, onde o hidrogênio entra no núcleo do manto por desidratação. A forma estável de carbono nas condições de pressão-temperatura da fronteira núcleo-manto da Terra é o diamante. Assim, o carbono que escapa do núcleo externo líquido se torna diamante quando entra no manto."
Ciclo do carbono no interior da Terra
As teorias atuais propõem que, como o carbono é um elemento com grande afeição pelo ferro, deve existir uma quantidade significativa de carbono no núcleo, enquanto o manto provavelmente teria relativamente pouco carbono.
O que a equipe descobriu, no entanto, é que existe muito mais carbono no manto do que se acreditava, graças a esse processo de migração do elemento que eles demonstraram - sem contar que o processo todo reforça a descoberta também recente de que hidrocarbonetos podem se formar no interior da Terra.
"O carbono é um elemento essencial para a vida e desempenha um papel importante em muitos processos geológicos," disse Byeongkwan Ko. "Esta nova descoberta de um mecanismo de transferência de carbono do núcleo para o manto lançará luz sobre a compreensão do ciclo do carbono no interior profundo da Terra. Isso é ainda mais entusiasmante quando se leva em conta que a formação de diamantes na fronteira núcleo-manto pode estar acontecendo há bilhões de anos, desde o início da subducção no planeta."
Esse mecanismo também pode explicar porque as ondas sísmicas se propagam tão rapidamente por essa região: "Porque o diamante é extremamente incompressível e menos denso do que outros materiais na fronteira núcleo-manto," propõe Shim.