Redação do Site Inovação Tecnológica - 31/08/2023
Escrita na água
A ideia de escrever na água é antiga, mas até agora era restrita à superfície, usando geradores de ondas para criar atrações boas para parques de diversões e shoppings.
Uma equipe de pesquisadores alemães e chineses agora finalmente conseguiu desenvolver uma técnica que permite escrever "no meio" da água, funcionando também abaixo da superfície - e usando tintas comuns.
Desde a invenção da escrita, esta é a primeira técnica que se tem notícia que dispensa um substrato para manutenção do texto, seja uma pedra, um pedaço de madeira, um papiro, um papel ou mesmo uma tela. A equipe das universidades Johannes Gutenberg de Mainz, Técnica de Darmstadt e Wuhan conseguiram escrever em um fluido a granel, como a água, sem substratos de fixação.
O conceito não é muito diferente da maneira como os aviões deixam rastros tridimensionais de vapor quando cruzam o céu - em comparação com a escrita bidimensional com uma caneta em um papel seco. Mas se você mergulhar na água a ponta de uma caneta-tinteiro, ou mesmo a agulha de uma seringa com tinta, e tentar escrever algo, terá pouco sucesso. O movimento da ponta relativamente grande através da água cria turbulência, que acabará por erradicar quaisquer vestígios de tinta deixados para trás.
É possível pensar no número de Reynolds; este fator, usado para calcular o fluxo de um fluido, estabelece que, quanto menor for o objeto em movimento, menor será o número de vórtices que ele criará. No entanto, para tirar vantagem disso, seria necessária uma caneta verdadeiramente minúscula, mas com um reservatório de tinta enorme, o que anularia o efeito da caneta minúscula.
Ponta esferográfica para água
A equipe decidiu adotar uma estratégia completamente nova para superar esse problema inerente: "Colocamos a tinta diretamente na água e usamos uma microesfera feita de material de troca iônica, com diâmetro de 20 a 50 micrômetros, como instrumento de escrita," explicou o professor Thomas Palberg.
Esta microesfera é tão pequena que não gera nenhum vórtice. E ela troca cátions residuais na água por prótons, alterando assim o pH local da água. Quando a microesfera desliza pelo meio da água, ela traça uma trilha invisível de pH mais baixo no líquido, e isso atrai as partículas de tinta, que se acumulam no caminho marcado pela ponta esferográfica. A linha é muito fina, com apenas alguns centésimos de micrômetro de largura.
Para realmente escrever uma carta na água, basta inclinar o depósito de água, de forma que a microesfera se mova, para delinear o caractere desejado. "Durante nossas primeiras tentativas, movemos a vasilha de água manualmente, mas agora construímos um balancim programável," detalhou Palberg. "Em uma vasilha não maior que uma moeda de um euro, fomos capazes de produzir um padrão simples, semelhante a uma casa, no tamanho do título de um caractere 'I' em uma fonte de 18 pontos, e depois observá-lo ao microscópio. Mas ainda estamos apenas na fase preliminar."
Qualquer tipo de escrita que possa ser produzida usando linhas contínuas pode ser facilmente reproduzida na água. Além disso, é possível criar intervalos, os espaços entre as letras, uma vez que o processo de troca iônica pode ser ligado e desligado à vontade usando técnicas de exposição à luz. Até mesmo o apagamento e a correção do que foi escrito é possível.
Múltiplas utilizações
Ao desenvolver um modelo teórico para explicar o mecanismo que viabiliza a escrita na água, os pesquisadores demonstraram que este efeito é genérico e não específico, podendo, portanto, ser empregado em uma ampla variedade de formas, ampliando as possibilidades de aplicação.
"Além de esferas feitas de resinas de troca iônica, podem ser empregadas 'canetas' compostas por partículas que podem ser aquecidas por lasers ou até mesmo micronadadores orientáveis individualmente," disse o professor Benno Liebchen, membro da equipe. "Isso pode até permitir uma escrita paralela extensiva de estruturas na água. Consequentemente, o mecanismo também poderá ser usado para gerar padrões de densidade altamente complexos em fluidos."
A equipe já pensou em muitas variações que podem ser realizadas usando diferentes componentes na forma do instrumento de escrita, tipo de trilha desenhada, tinta ou forma de direção empregada. Uma opção seria usar tinta fluorescente e várias microesferas de escrita muito leves que possam ser movidas através do fluido em três dimensões, com a ajuda de uma pinça óptica. Isso resultaria não apenas em formas luminescentes, mas também poderia ser usado para a estruturação 3D de fluidos.
"Nossa nova abordagem é muito robusta e tem potencial para extrema modularidade," disse Palberg. "E pode ser desenvolvida de uma variedade excepcionalmente ampla de maneiras diferentes."