Redação do Site Inovação Tecnológica - 17/11/2020
Cosmologia neural ou neurologia cosmológica?
Um astrofísico e um neurocirurgião pode parecer uma dupla que tenha pouco a estudar em conjunto, mas Franco Vazza (Universidade de Bologna) e Alberto Feletti (Universidade de Verona) mostraram que é possível estabelecer paralelos entre campos do saber que aparentam ser totalmente desconexos.
Os dois compararam a rede de neurônios do cérebro humano com a rede cósmica das galáxias - e encontraram similaridades surpreendentes.
É fato que a diferença de dimensões é descomunal, mas a dupla não partiu do nada: Eles começaram o estudo porque viram que existem alguns paralelos interessantes.
A teia cósmica estudada tem cerca de 100 bilhões de galáxias, enquanto o cérebro humano tem calculados 69 bilhões de neurônios. Nos dois sistemas, apenas 30% são constituídos pela massa das galáxias e dos neurônios. As galáxias e os neurônios se organizam em longos filamentos, com nós entre os filamentos. E, finalmente, nos dois sistemas, 70% da distribuição de massa ou energia é composta de componentes desempenhando um papel aparentemente passivo - a água, no caso do cérebro, e a energia escura, no caso do Universo observável.
Assim, não é tão surpreendente que a análise quantitativa feita pelos dois cientistas italianos revele que processos físicos muito diferentes podem dar origem a estruturas com níveis similares de complexidade e auto-organização.
Semelhanças entre o cérebro e o Universo
Começando pelas características similares do cérebro e do Universo, os dois pesquisadores compararam uma simulação da rede de galáxias com uma simulação de seções do córtex cerebral e do cerebelo - o objetivo era observar como as flutuações da matéria se espalham pelas duas redes de tamanhos tão diferentes, mas com um número comparável de nós.
"Nós calculamos a densidade espectral dos dois sistemas. Essa é uma técnica muito usada em cosmologia para estudar a distribuição espacial das galáxias," explicou Vazza. "Nossa análise mostrou que a distribuição da flutuação dentro da rede neuronal do cerebelo, em uma escala de 1 micrômetro a 0,1 milímetro, segue a mesma progressão da distribuição da matéria na teia cósmica, mas, é claro, em uma escala maior, que vai de 5 milhões a 500 milhões de anos-luz."
Eles também calcularam alguns parâmetros que caracterizam tanto a rede neuronal quanto a teia cósmica: O número médio de conexões em cada nó e a tendência de agrupamento de várias conexões em nós centrais relevantes dentro da rede.
"Mais uma vez, parâmetros estruturais identificaram níveis de concordância inesperados. Provavelmente, a conectividade no interior das duas redes evolui segundo princípios físicos similares, apesar da diferença marcante e óbvia entre as potências físicas que regulam galáxias e neurônios," acrescentou Feletti. "Essas duas redes complexas apresentam mais similaridades do que aquelas compartilhadas entre a teia cósmica e uma galáxia ou entre uma rede neuronal e o interior de um corpo neuronal."
Os dois pesquisadores gostaram tanto dos resultados que já estão pensando em desenvolver técnicas de análise que possam ser usadas em ambos os campos - cosmologia e neurocirurgia - para obter uma melhor compreensão da dinâmica dos dois sistemas conforme eles evoluem ao longo do tempo.