Fábio Reynol - Agência Fapesp - 03/11/2010
Um pó que ao ser derramado sobre água é capaz de decompor um líquido sob a ação da luz e liberar energia. O exemplo de geração de energia é um dos objetivos da química supramolecular, área que investiga as interações entre as moléculas.
"Queremos usar energia química a partir do Sol, e a química supramolecular pode ajudar nesse sentido", disse Henrique Toma, professor do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP),
Toma apresentou seus estudos em uma palestra durante o evento Simpósio sobre Mecanismos Moleculares e Fotossíntese, realizado na semana passada em São Paulo.
Química supramolecular
Segundo Toma, a química supramolecular permite a síntese de átomos e moléculas que formam estruturas maiores. Essas, por sua vez, ao serem combinadas dão origem a peças, mas tudo ainda na escala nanométrica - 1 nanômetro equivale a 1 bilionésimo do metro.
Nanotubos, nanoporos e nanofilmes são algumas das possibilidades. Um exemplo de aplicação são as células fotovoltaicas de terceira geração, chamadas celulas solares orgânicas, ou DSC ("Dye-sensitized Solar Cells" - células solares sensibilizadas por corante).
Essas células solares são finas, flexíveis e transparentes, aumentando a versatilidade de aplicações desse tipo de receptor de energia.
A química supramolecular ainda pode ajudar a aperfeiçoar os sistemas existentes. "Podemos criar estruturas que aumentem a condutividade e reduzam a corrosão, por exemplo", disse Toma.
Outro ponto a ser desenvolvido é a ampliação do espectro de luz solar absorvido para a produção de energia, "A maior parte dos comprimentos de onda está em uma faixa que ainda não é utilizada", disse.
Torres para captura de amostras de ar
O modo como as alterações climáticas mundiais afetam as plantações voltadas à produção de bioenergia esteve entre os tópicos da conferência de Marcos Buckeridge, professor do Instituto de Biociências da USP, que apresentou trabalhos desenvolvidos por grupos de pesquisa ligados ao BIOEN-FAPESP, programa do qual é um dos coordenadores.
"Experimentos indicaram que o aumento na temperatura e na concentração de dióxido de carbono na atmosfera terrestre elevam muito o processo de fotossíntese na cana-de-açúcar e aumentam a biomassa da planta em cerca de 60%", disse.
Os pesquisadores descobriram por meio da técnica de DNA microarray que essas mudanças ambientais alteram genes associados à captura de luz. Outra descoberta foi que cerca de 70 proteínas da cana-de-açúcar, de um total de 160, são alteradas em ambientes com maior concentração de dióxido de carbono - veja Cientistas querem melhorar artificialmente fotossíntese da cana-de-açúcar.
Buckeridge também apresentou um trabalho sobre o miscanto, gramínea que tem sido utilizada na produção de energia em regiões de clima temperado no Canadá, nos Estados Unidos e na Europa.
"O miscanto tem menos sacarose do que a cana-de-açúcar, porém é mais resistente ao frio, o que o torna interessante para a produção de bioenergia no sul do Brasil, no Uruguai e na Argentina, por exemplo", disse Buckeridge. A planta resiste a temperaturas inferiores a 14º C.
Buckeridge e colegas vão trocar informações com cientistas da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, sobre a concentração de carbono nos dois países. Torres para captura de amostras de ar serão construídas nos campi do Instituto Agronômico em Ribeirão Preto e em Campinas.
Os dados coletados farão parte do experimento SoyFACE, de enriquecimento de concentração ao ar livre aplicado à soja, feito pela universidade norte-americana com o objetivo de analisar os efeitos das mudanças climáticas sobre as plantações.
"As torres permitirão comparar esses efeitos sobre as espécies de miscanto nos dois hemisférios", disse Buckeridge.
O movimento das moléculas
Munir Skaf, professor do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas, apresentou uma técnica de simulação dinâmica biomolecular que tem-se mostrado importante para novas descobertas em química e em biologia.
"As simulações dinâmicas moleculares são uma poderosa ferramenta para estudar os movimentos atômicos. Entender a interação atômica das moléculas é a chave para desvendar a dinâmica das proteínas e, com isso, compreender como a estrutura proteica se relaciona com as funções biológicas", disse.
Skaf explicou o funcionamento das simulações e de que modo elas têm sido úteis para entender, por exemplo, como os hormônios se ligam aos receptores nucleares e como se desligam deles. Esses receptores são proteínas no interior da célula que reconhecem os hormônios.
"São estruturas importantes e relacionadas a diversos processos, do tipo diferenciação celular, metabolismo e desenvolvimento de diabetes e de alguns tipos de cânceres", apontou.
Na área de bioenergia, as simulações dinâmicas moleculares podem auxiliar na produção de etanol celulósico ao permitir o desenvolvimento de coquetéis enzimáticos capazes de executar uma hidrólise economicamente viável, disse.
Para Skaf, a técnica também será capaz de trazer descobertas imprevisíveis. "Além de desvendar a estrutura das proteínas, as simulações dinâmicas moleculares podem revelar funções desempenhadas por elas das quais ainda nem suspeitamos", afirmou.