Redação do Site Inovação Tecnológica - 18/03/2021
Atualização - 16/11/2021 12:25
As conclusões do estudo que embasa esta reportagem foram refutadas por outra equipe de cientistas. Veja a análise no artigo Asteroide interstelar 'Oumuamua ainda pode ser sonda alienígena.
O artigo abaixo foi deixado como publicado originalmente.
Pedaço de um plutão
Dois astrofísicos da Universidade Estadual do Arizona, nos EUA, acreditam ter encontrado a origem do 'Oumuamua, o primeiro corpo celeste interestelar observado pelo homem.
A primeira novidade do estudo é que Steven Desch e Alan Jackson aderiram a uma visão alternativa sobre o formato do cometa/asteroide.
Em vez do formato de charuto proposto inicialmente, eles acreditam que o conjunto de observações justifica uma interpretação dos dados que dá ao corpo celeste de fora do Sistema Solar o formato de uma panqueca girando sobre o próprio eixo.
Outra hipótese levantada pela dupla é que o 'Oumuamua deve ter-se originado de corpos celestes similares a Plutão - não o nosso planeta anão Plutão, mas os "plutões" do sistema planetário onde o 'Oumuamua se originou.
"Esta pesquisa é empolgante porque provavelmente resolvemos o mistério do que o 'Oumuamua é e podemos identificá-lo razoavelmente como um pedaço de um 'exo-Plutão', um planeta semelhante a Plutão em outro sistema solar," entusiasma-se Desch. "Até agora, não tínhamos como saber se outros sistemas solares tinham planetas semelhantes a Plutão, mas agora vimos um pedaço de um passar pela Terra."
Primeiro objeto interestelar
Descoberto em 2017 pelo observatório Pan-STARRS, no Havaí, o 'Oumuamua (seu nome de catálogo é 1I/2017 U1, onde 1I indica primeiro objeto interestelar), cruzou o plano do Sistema Solar a 87,3 quilômetros por segundo. O objeto é estranhamente plano, pareceu inicialmente ser um cometa, mas depois suas características se mostraram estranhas o suficiente para inviabilizar todas as tentativas de classificação.
Os dois pesquisadores levantam a hipótese que o 'Oumuamua teria uma composição rica em nitrogênio sólido, como a superfície de Plutão, tendo sido provavelmente arrancado do seu exo-plutão há pelo menos 500 milhões de anos, por um impacto forte o suficiente para arremessá-lo rumo às estrelas - no caso, rumo à nossa estrela.
"O 'Oumuamua provavelmente não era plano quando entrou em nosso Sistema Solar, mas derreteu-se em uma lasca, perdendo mais de 95% de sua massa, durante sua aproximação do Sol," teoriza Jackson. "Ser feito de nitrogênio congelado também explica a forma incomum do 'Oumuamua. À medida que as camadas externas de gelo de nitrogênio evaporavam, a forma do corpo teria se tornado progressivamente mais achatada, assim como uma barra de sabão faz quando as camadas externas são removidas através do uso."
É uma ideia plausível, mas se o raciocínio está correto falta explicar porque as bordas não derreteram, já que as barras de sabão ficam achatadas porque só passamos as mãos em suas superfícies maiores, e o 'Oumuamua gira, o que significa que ele inteiro sofreu a ação "das mãos do Sol".
Sonda alienígena
É uma boa história, mas é necessário entender os passos que os dois cientistas deram para chegar até ela.
O objeto entrou no Sistema Solar a uma velocidade um pouco menor do que seria de se esperar, indicando que ele não viajou no espaço interestelar por mais do que um bilhão de anos.
A seguir, ele se acelerou ligeiramente para longe do Sol. Os cometas têm o chamado "efeito de foguete", quando a luz do Sol vaporiza os gelos em seu interior. Mas o impulso do 'Oumuamua foi mais forte do que o que o efeito foguete poderia explicar, o que levou às teorias de que o 'Oumuamua poderia ser uma sonda alienígena.
Além disso, o objeto não apresentou nenhum um gás escapando detectável, que tipicamente aparece na forma da cauda dos cometas.
Desch e Jackson levantaram então a hipótese de que o objeto seria feito de gelos diferentes, e usaram essa ideia para calcular a rapidez com que esses gelos se sublimariam (passando de um sólido para um gás) conforme o 'Oumuamua passava pelo Sol. A partir daí, eles calcularam o efeito de foguete, a massa e a forma do objeto e a refletividade do gelo.
"Foi um momento emocionante para nós," disse Desch. "Percebemos que um pedaço de gelo seria muito mais reflexivo do que as pessoas [os cientistas] estavam presumindo, o que significava que ele [o pedaço de gelo] pode ser menor. O mesmo efeito de foguete daria ao 'Oumuamua um empurrão maior, maior do que os cometas geralmente experimentam."
Hipóteses prováveis
Os dois então partiram em busca de um gelo que pudesse justificar suas interpretações, encontrando um bom candidato no nitrogênio sólido. Foi daí que nasceu a ideia de que o 'Oumuamua teria se originado de um planeta parecido com Plutão em outro sistema planetário, já que o nosso Plutão tem nitrogênio sólido.
E também nasceu a ideia do decréscimo em tamanho do pedregulho interestelar, já que o gelo de nitrogênio teria que se evaporar rapidamente com a proximidade do Sol.
"Soubemos que tínhamos acertado na ideia quando concluímos o cálculo de qual albedo (o quão reflexivo é um corpo) faria o movimento do 'Oumuamua corresponder às observações," contou Jackson. "Esse valor acabou sendo o mesmo que observamos na superfície de Plutão ou Tritão, corpos cobertos por gelo de nitrogênio."
Como agora o 'Oumuamua já está longe demais, e ainda não temos naves espaciais capazes de persegui-lo em uma campanha de observações, teremos que nos contentar com interpretações como estas, cheias de "se, e se..." - mas a interpretação dos dois astrofísicos talvez seja a mais completa feita até agora, e faz sentido. Pelo menos até que outros cientistas encontrem falhas no raciocínio ou explicações melhores.