Lauren Gold - Cornell University - 26/09/2006
Fronteira entre clássico e quântico
No mundo submicroscópico - o domínio das partículas elementares e dos átomos individuais - as coisas se comportam à moda estranha e anti-intuitiva dos princípios da mecânica quântica.
Nada (pelo menos assim parece) como o nosso mundo macroscópico - ou mesmo o mundo microscópico das células e bactérias e das partículas de poeira - onde as muito mais razoáveis Leis de Newton mantêm as coisas logicamente ordenadas.
Imagem feita por um microscópio de rastreamento eletrônico de um ressonador de nitreto de silício e alumínio, acoplado a um transístor supercondutor de elétron único (SSET). Os pesquisadores observaram o ressonador movendo-se por meio de um fenômeno conhecido como ação reversa quântica (quantum back-action). |
O problema começa com a tentativa de se descobrir a linha divisória entre os dois mundos - ou mesmo em estabelecer se tal linha existe. Com esse objetivo, a equipe do Dr. Keith Schwab, professor da Física da Universidade Cornell, Estados Unidos, criou um dispositivo que aborda esse limite da mecânica quântica na maior escala já feita até hoje.
E, surpreendentemente, a pesquisa também mostrou como os pesquisadores podem baixar a temperatura de um objeto - simplesmente observando-o.
Os resultados, que poderão ter aplicações na computação quântica e na engenharia da refrigeração, entre outros, foram publicados no último exemplar da revista Nature.
Princípio da incerteza
O dispositivo consiste em uma minúscula barra de alumínio sobre um substrato de nitreto de silício (8,7 micrômetros - milionésimos de metro - de comprimento por 200 nanômetros - bilionésimos de metro - de largura), presa nas duas extremidades e livre para vibrar no centro.
Nas proximidades, Schwab posicionou um transístor supercondutor de elétron único (SSET), buscando detectar minúsculas alterações na posição da barra de alumínio.
De acordo com o princípio da incerteza de Heisenberg, a precisão de medições simultâneas de posição e velocidade de uma partícula é limitada por um montante quantificável.
Com suas medições, Schwab e seus colegas foram capazes de chegar mais próximo do que nunca desse limite teórico, demonstrando também um fenômeno chamado ação reversa, pelo qual o ato de observar alguma coisa na verdade aplica-lhe uma força.
"Nós fizemos medições de posição que são tão sensíveis - tão fortemente acopladas - que apenas olhando o dispositivo nós podíamos fazê-lo se mover," disse Schwab. "A mecânica quântica estabelece que você não pode fazer uma medição de algo e não perturbá-lo. Nós estamos fazendo medições que estão muito perto do princípio da incerteza; e nós podemos acoplá-las de forma tão forte que, ao medir a posição, nós podemos ver a coisa se movendo."
O dispositivo, embora inegavelmente minúsculo, é - com cerca de 10.000 bilhões de átomos - imensamente maior do que o mundo quântico típico das partículas elementares.
Olhar congelante
Embora o resultado não tenha precedentes, ele já havia sido previsto pela teoria. Mas a segunda observação foi uma surpresa: aplicando determinadas tensões ao transístor, os pesquisadores viram a temperatura do componente cair.
"Olhando para ele você pode não apenas fazê-lo se mover; você pode retirar energia dele," disse Schwab. "E, os números sugerem, se continuarmos com este trabalho, nós seremos capazes de deixar essa coisa muito fria. Muito mais fria do que poderíamos se simplesmente a colocássemos em um imenso refrigerador."
O mecanismo por trás do resfriamento é semelhante ao processo chamado resfriamento Doppler ou óptico, que permite aos físicos resfriar vapores atômicos com um laser vermelho. Esta é a primeira vez que o fenômeno foi observado em um contexto de matéria condensada.
Quântica macroscópica
Schwab ainda não decidiu se vai prosseguir no projeto de resfriamento. Mais interessante, diz ele, é a tarefa de compreender o maior problema da mecânica quântica: se ela permanece verdadeira no mundo macroscópico; e, se não, onde está a fronteira do sistema.
Para isso ele está focando um outro princípio da mecânica quântica - o princípio da superposição - que estabelece que uma partícula pode estar simultaneamente em dois lugares.
"Nós estamos tentando fazer um dispositivo mecânico ficar em dois lugares ao mesmo tempo. O que é verdadeiramente espetacular é que parece que nós seremos capazes de fazer isto," diz ele. "A esperança, o sonho, a fantasia é que nós consigamos a superposição e comecemos a fazer componentes grandes e descubramos a fronteira."