Agostinho Rosa - 08/05/2002
O "acaso" novamente desempenha seu papel na ciência. Há poucos dias pudemos verificar a descoberta do fenômeno da supercondutividade em um composto comum encontrável em qualquer laboratório (ver Detonado o recorde da supercondutividade). Agora foi a vez dos nanomateriais, diminutas estruturas feitas a partir de átomos ou moléculas, montados a partir do zero.
Um dos materiais mais estudados nessa área são os nanotubos de carbono. São estruturas de poucos átomos de diâmetro, em forma de canudo. Esses nanotubos podem ter a parede da espessura de um único átomo ou de vários átomos.
Mas vamos ao acaso. Um estudante estava no laboratório fazendo fotografias de um nanotubo de carbono. Seu intuito era fazer imagens, para análise e para divulgação dos trabalhos feitos no laboratório. Nada mais natural do que o estudante utilizar-se de um "flash", do tipo comum existente em todas as máquinas fotográficas. Esta foi a chave da descoberta. O estudante teve que chamar seu professor, porque ele não sabia o que acontecia com seus nanotubos: ele tirava uma foto e eles simplesmente desapareciam.
Será que é mesmo acaso um estudante do primeiro ano de graduação fotografar um nanotubo? Como já pudemos comentar, essa é uma seara onde argumentos quase religiosos vêem á tona. Mas é um dos principais motivadores a que mantenhamos estudantes em laboratórios bem equipados e motivados o suficiente para estarem, no mínimo, "ligados" no que fazem.
O estudante chama-se Andres de la Guardia, e estuda no Instituto Politécnico de Renssealer e estava trabalhando sob orientação do professor Pulickel Ajayan. Ao perceber a importância do fenômeno, o professor Ajayan divulgou a descoberta, que já foi repetida em outros laboratórios na França e na Inglaterra, confirmando a descoberta. A experiência foi refeita em várias outros condições de ambiente.
A utilização do inocente "flash" desencadeou no nanotubo uma reação de combustão, como resultado de uma subida de temperatura inesperada, que pode ter atingido 1.800º K. Os nanotubos se oxidam a 900º K.
Assim que recebem o pulso de luz, aparecem pontos extremamente quentes nos nanotubos, que se espalham rapidamente até destruir todo o nanotubo. O fenômeno somente acontece com nanotubos que têm paredes de apenas um átomo de espessura. Um nanotubo mais grosso não entra em combustão. Quando a experiência é feita em condições ambientais normais, o carbono se queima e escapa como monóxido e dióxido de carbono, deixando resíduos de óxidos de níquel e ferro, utilizados na fabricação dos nanotubos. Quando a experiência é feita em uma atmosfera de hélio, que, ao contrário do oxigênio do ar, não permite combustão, o carbono do nanotubo se rearranja em uma estrutura cônica. Os cientistas já batizaram essas estruturas de nanochifres.
Falta agora aos cientistas entenderem corretamente o fenômeno. A questão principal a ser discutida é a relação existente entre a luz e a combustão. Com esse entendimento, poderá ser possível, por exemplo, criar dispositivos de detonação à distância. Bastará que uma pequena quantidade de nanotubos seja misturada ao combustível e que este receba um pulso de luz para que a combustão se inicie.
O rearranjo do nanotubo em um nanochifre também é algo promissor. Embora nada possa ainda ser dito com segurança, existe a possibilidade de que o nanomaterial possa assumir formas determinadas, reagindo a pulsos de luz.
Caso seja difícil, ou leve muito tempo para que os cientistas avancem em algum desses caminhos, restará sempre uma alternativa: quando Andres já tiver se formado doutor, ele poderá chamar um estudante de graduação e pedir a ele que fique o dia todo fotografando o laboratório.