New Scientist - 29/04/2005
Fusão piroelétrica
Cientistas fizeram uma demonstração incrivelmente simples de fusão nuclear, utilizando um dispositivo de mesa, por meio do aquecimento de um cristal comum envolvido numa atmosfera de gás deutério.
Embora a técnica não seja adequada para a geração de energia, um equipamento desse tipo pode funcionar como uma fonte de nêutrons para análise de materiais e imageamento médico e, talvez, até mesmo como propulsão para naves espaciais.
A chave para o sistema é um cristal feito de tantalato de lítio. O cristal é assimétrico e, como resultado, seu aquecimento faz com que as cargas negativas e positivas migrem para lados opostos do cristal, criando um campo elétrico. O fenômeno é conhecido como efeito piroelétrico.
Em 1992, James Brownridge, da Universidade de Nova Iorque, Estados Unidos, utilizou cristais de tantalato de lítio envoltos em gás para gerar raios-X por meio de seu aquecimento a cerca de 100º C. O campo elétrico resultante retira elétrons das moléculas do gás e os acelera para energias gigantescas. Os elétrons então colidem com núcleos estacionários no cristal e geram raios-X.
Candidato muito forte
Quando Seth Putterman, da Universidade da Califórnia, também nos Estados Unidos, ouviu falar do fenômeno, há alguns anos atrás, ele imediatamente percebeu que os campos elétricos eram fortes o suficiente para gerar a fusão nuclear, especificamente para fundir núcleos de um isótopo de hidrogênio chamado deutério. A capacitância exibida pelos cristais deveria exigir o equivalente a estonteantes 107 eletronvolts, afirma ele.
Para testar se esses campos poderiam realmente gerar a fusão nuclear, Putterman e seus colegas Brian Naranjo e James Gimzewski primeiro mergulharam um cristal de tantalato de lítio em gás deutério. O conjunto foi então resfriado a -33º C e, a seguir, aquecido para cerca de 7º C num período de três minutos e meio.
O campo elétrico resultante acelerou o núcleo de deutério a uma distância de 1 centímetro para energias acima de 100 kiloeletronvolts. O núcleo acelerado então colidiu e fundiu-se com o núcleo de deutério que havia permeado a superfície da estrutura do cristal. A fusão produziu 400 vezes mais nêutrons do que existe em medições de referência.
A ciência da fusão nuclear é cheia de sensacionalismos e afirmações super-otimistas, mas Putterman convenceu os seus pares de que algo interessante está realmente acontecendo. "Eles apresentaram um experimento que é um candidato muito forte para que se possa mesmo observar a fusão," afirmou Nigel Hawkes, do Laboratório Nacional de Física da Inglaterra.
Mas ele é cauteloso acerca do potencial das máquinas de nêutrons que caibam sobre uma mesa: "É muito cedo para afirmar aonde isso pode levar."
Microfoguetes
Um problema é a pequena quantidade de nêutrons que o experimento produz - algumas poucas centenas por segundo. Um gerador de nêutrons comercial necessitará produzir ao menos dezenas de milhões de nêutrons por segundo.
Hoje, nêutrons são criados em reatores nucleares ou em aceleradores de partículas, os quais custam milhões de dólares para serem construídos e mantidos. A possibilidade de uma alternativa de mesa é um incentivo poderoso para que a pesquisa prossiga e a equipe do Dr. Putterman espera melhorar o rendimento operando a temperaturas mais baixas e utilizando um conjunto de cristais.
Putterman também sugere que os cristais poderão ser utilizados como microfoguetes para pequenas espaçonaves. Acelerando-se o deutério em uma direção, a espaçonave seria movida na direção oposta.