Redação do Site Inovação Tecnológica - 31/01/2022
Interfaces eletroquímicas
Nas baterias, nas células a combustível e em inúmeros processos na indústria, você sempre encontrará um eletrodo metálico em contato com um eletrólito, o que torna essa uma das interfaces mais importantes da química.
Em todos esses casos, um pedaço de metal está em contato com uma solução salina, que contém partículas carregadas positiva e negativamente, chamadas íons - os íons de lítio das baterias, por exemplo.
Se você ampliasse a interface entre o eletrodo e a solução salina, perceberia todos os tipos de interações.
Por exemplo, a superfície do eletrodo existe uma escassez ou uma abundância de elétrons. Essa carga atrai os íons da solução salina para que eles se acumulem no líquido próximo ao eletrodo. Essa estrutura de cargas é chamada de "dupla camada elétrica" - se você alterar a tensão no dispositivo, a camada dupla também será alterada.
Teoria de Gouy-Chapman
A distribuição de cargas nessas reações eletroquímicas é explicada em detalhes pela chamada teoria de Gouy-Chapman (Louis Georges Gouy [1854-1926] e David Leonard Chapman [1869-1958]).
Ou, pelo menos, é assim que todos os químicos consideravam até agora.
Kasinath Ojha e seus colegas da Universidade Leiden, nos Países Baixos, acabam de descobrir que a descrição oferecida pela teoria de Gouy-Chapman não bate com a realidade.
"É uma teoria clássica com mais de cem anos, verificada nas décadas de 40 e 50 do século XX por David Grahame com mercúrio como eletrodo, porque as medições com metais sólidos eram mais difíceis. As pessoas assumiram que a teoria também seria aplicável a metais sólidos, como a platina, mas acontece que este não é o caso," resumiu o pesquisador Marc Koper, membro da equipe.
A boa notícia é que a equipe já deu um "upgrade" na teoria, criando uma descrição que bate com a realidade.
Teoria versus realidade
Usando a teoria de Gouy-Chapman descrita nos livros-texto, é possível prever em qual tensão elétrica as interações na camada dupla desaparecerão, ou seja, quando exatamente o eletrodo apresentará zero de carga e, como resultado, os íons na solução salina não serão mais atraídos. Este é o chamado potencial de carga zero.
"Quando você reduz a concentração [na solução salina] o suficiente, pode esperar encontrar o potencial de carga zero em algum ponto. Mas, em nossas medições com eletrodos de platina, nunca conseguimos chegar a esse ponto," conta Ojha.
Mas Ojha não desistiu e continuou baixando a concentração da solução salina, até reduzir os sais por um fator de 10, quando então o potencial de carga zero apareceu.
"O fato de termos que ir para concentrações extremamente baixas nos diz que há muito mais íons na dupla camada do que a teoria prevê," disse Koper. "Há algo acontecendo que causa essa quantidade de íons, mas que a teoria não leva em conta."
Upgrade da teoria
O que está acontecendo exatamente, os pesquisadores ainda não sabem, embora tenham algumas hipóteses: "A natureza do íon não importa para o número de íons na camada dupla. No entanto, a diferença de tamanho entre o íon carregado positivamente e o íon carregado negativamente é importante. Isso ocorre porque o íon menor pode se aproximar mais do eletrodo do que o íon maior, o que causa assimetria nas medições," arrisca Koper.
Contudo, Ohja observou que a interação é sensível a mudanças de temperatura. Assim, levando em consideração os dois fatores - temperatura e dimensão - a explicação para o fenômeno pode não ser de natureza inteiramente química.
Embora mais pesquisas sejam necessárias para explicar completamente essa interface metal-solução salina, a equipe já atualizou a teoria Gouy-Chapman de forma que ela descreva e preveja os fenômenos reais de forma um pouco mais precisa.
"Esperamos que nossas descobertas cheguem à próxima geração de livros didáticos de eletroquímica. As pessoas fazem todos os tipos de medições eletroquímicas em metais e, com a teoria atualizada, podem melhorar sua compreensão dos mecanismos e reações nesses tipos de metais," disse Ojha.